PERFIL DOS USUÁRIOS DE UMA UNIDADE ESPECIALIZADA DO PARANÁ SOBRE PROFILAXIA PRÉ-EXPOSIÇÃO AO HIV/AIDS*
PROFILE OF USERS OF A SPECIALIZED UNIT IN PARANÁ ON HIV/AIDS PRE-EXPOSURE PROPHYLAXIS
PERFIL DE LOS USUARIOS DE UNA UNIDAD ESPECIALIZADA EN PARANÁ EN PROFILAXIS PREEXPOSICIÓN AL VIH/SIDA
1Kelly Elaine de Sousa
2Rosimara Oliveira Queiroz
3Marcelo da Silva
4Herbert Leopoldo de Freitas Goes
1 Universidade Estadual de Maringá, Programa de Pós-Graduação em Enfermagem. Maringá, Paraná, Brasil. Orcid: https://orcid.org/0000-0001-7936-9561
2 Universidade Estadual de Maringá, Programa de Pós-Graduação em Enfermagem. Maringá, Paraná, Brasil. Orcid: https://orcid.org/0000-0001-7976-2259
3 Universidade Estadual de Maringá, Programa de Pós-Graduação em Enfermagem. Maringá, Paraná, Brasil. Orcid: https://orcid.org/0000-0002-0376-0430
4 Universidade Estadual de Maringá, Programa de Pós-Graduação em Enfermagem. Maringá, Paraná, Brasil. Orcid: https://orcid.org/0000-0002-6071-692X
Autor correspondente
Kelly Elaine de Sousa
Rua alto curti 428 Jardim América - Maringá - Paraná, Brasil.
CEP: 87045-350
Contribuição de autoria
Concepção do estudo: Sousa KE, Goes HLF; Coleta de dados: Sousa KE; Análise e interpretação dos dados: Sousa KE, Goes HLF; Discussão dos resultados: Sousa KE, Goes HLF; Redação e/ou revisão crítica do conteúdo: Sousa KE, Queiroz RO, Silva M, Goes HLF; Revisão e aprovação final da versão final: Sousa KE, Queiroz RO, Silva M,; Goes HLF
RESUMO
Objetivo: conhecer o perfil dos usuários do Centro de Testagem e Aconselhamento cadastrados para utilizar a profilaxia pré exposição ao HIV/Aids no município de Maringá. Métodos: estudo exploratório e descritivo, de abordagem qualitativa, realizado em prontuários do Centro de Testagem e Aconselhamento de Maringá. Cinquenta e dois usuários aderiram a nova estratégia de prevenção a profilaxia pré-exposição ao HIV no município. Os dados foram coletados em abril de 2020. Para a análise das entrevistas, foi utilizada a análise estatística descritiva. Resultados: A grande maioria dos participantes da pesquisa foram do sexo masculino, de cor branca, solteiros, com nível superior e possuíam faixa etária entre 21 e 40 anos. Quanto ao perfil da população-chave, apenas um é transexual, dois são profissionais do sexo. 34,62% se caracterizam como casais sorodiferentes e 84,62% são homens que fazem sexo com homens. Conclusão: Foi possível identificar o perfil dos usuários que utilizam a profilaxia pré exposição ao HIV/Aids, o qual tem se mostrado como uma ferramenta de prevenção combinada, principalmente entre homens que fazem sexo com homens. Mais estudos epidemiológicos com outras populações-chave, como mulheres, transexuais e profissionais do sexo, são necessários.
Palavras-chave: Profilaxia Pré-Exposição; HIV; Política Pública; Enfermagem; Pesquisa Qualitativa
ABSTRACT
Objective: to know the profile of users of the Testing and Counseling Center registered to use HIV/AIDS pre-exposure prophylaxis in the city of Maringá. Methods: exploratory and descriptive study, with a qualitative approach, carried out in medical records from the Testing and Counseling Center in Maringá. Fifty-two users adhered to the new HIV pre-exposure prophylaxis prevention strategy in the municipality. Data were collected in April 2020. Descriptive statistical analysis was used to analyze the interviews. Results: The vast majority of research participants are male, white, single, with higher education and aged between 21 and 40 years. As for the profile of the key population, only one is transsexual, two are sex workers. 34.62% are characterized as serodifferent couples and 84.62% are men who have sex with men. Conclusion: It was possible to identify the profile of users who use pre-exposure prophylaxis to HIV/AIDS, which has been shown to be a combined prevention tool, especially among men who have sex with men. More epidemiological studies with other key populations, such as women, transsexuals and sex workers, are needed.
Keywords: Pre-Exposure Prophylaxis; HIV; Public Policy; Nursing; Qualitative Research
RESUMEN
Objetivo: conocer el perfil de los usuarios del Centro de Pruebas y Consejería registrados para utilizar la profilaxis preexposición al VIH/SIDA en la ciudad de Maringá. Métodos: estudio exploratorio y descriptivo, con abordaje cualitativo, realizado en prontuarios del Centro de Pruebas y Consejería de Maringá. Cincuenta y dos usuarios adhirieron a la nueva estrategia de prevención de profilaxis preexposición al VIH en el municipio. Los datos fueron recolectados en abril de 2020. Se utilizó análisis estadístico descriptivo para analizar las entrevistas. Resultados: La gran mayoría de los participantes de la investigación son hombres, blancos, solteros, con educación superior y con edades entre 21 y 40 años. En cuanto al perfil de la población clave, solo uno es transexual, dos son trabajadoras sexuales. El 34,62% se caracterizan por ser parejas serodiferentes y el 84,62% son hombres que tienen sexo con hombres. Conclusión: Se logró identificar el perfil de los usuarios que utilizan la profilaxis preexposición al VIH/SIDA, la cual ha demostrado ser una herramienta de prevención combinada, especialmente entre hombres que tienen sexo con hombres. Se necesitan más estudios epidemiológicos con otras poblaciones clave como mujeres, transexuales y trabajadoras sexuales.
Palabras clave: Profilaxis Previa a la Exposición; VIH; Política Pública; Enfermería; Investigación Cualitativa
INTRODUÇÃO
Os avanços nas estratégias de prevenção, como a Profilaxia Pré-Exposição ao HIV (PrEP), representam uma nova oportunidade para reduzir a incidência do HIV, haja vista a lenta diminuição do número de adultos contraindo o HIV e o aumento de alguns grupos susceptíveis a exposição ao vírus.1
O descobrimento de novos métodos de prevenção com eficácia comprovada traz uma série de novas possibilidades para o campo da prevenção. Tais métodos se somam ao uso do preservativo, o qual, já não pode seguir considerado como a única forma para se prevenir da infecção pelo HIV, durante as relações sexuais.2
Embora não existe a cura para a infecção por HIV até o momento, medicamentos antirretrovirais têm sido eficazes e podem controlar o vírus e ajudar a prevenir a transmissão para que as pessoas com HIV, e também aqueles em risco substancial, possam aproveitar uma vida saudável e produtiva. Exemplos disso são as estratégias de profilaxia de pré-exposição (PrEP), disponíveis para evitar a infecção por HIV. Por outro lado, o acesso das pessoas ao tratamento antirretroviral e a carga viral indetectável de quem está em tratamento diminuem substancialmente a possibilidade da transmissão.3
O uso de antirretrovirais para Profilaxia Pré-Exposicão (PrEP) foi recentemente recomendado pela Organização Mundial de Saúde como uma intervenção eficaz para prevenir a transmissão do HIV. No Brasil, considerado país pioneiro na América Latina, passou a ser ofertado em 2017, quando a tecnologia foi implantada no Sistema Único de Saúde (SUS).4 Atualmente 866 mil pessoas vivem com o vírus HIV no Brasil, o que reafirma a importância da PrEP para a diminuir a ascensão desses números no país.5
O processo de implementação dessa nova tecnologia de prevenção ao HIV foi realizado em duas etapas. A primeira etapa teve início em dezembro de 2017 em 11 Unidades Federadas (UF), sendo ofertada em 36 serviços, e a segunda etapa, iniciada em junho de 2018, concluiu a oferta nacional da PrEP nos outros estados, exceto no Acre. Atualmente, as UF estão sendo incentivadas a expandir a oferta de PrEP nas redes de atenção, indicando novos serviços em municípios estratégicos, com foco nas populações sob risco substancial de infecção pelo HIV.4
Em dezembro de 2018, 98 serviços, localizados em 71 municípios, ofertavam PrEP.5 Os resultados mostraram que dos 4.907 usuários em PrEP em dezembro de 2018, 78% (3.831) eram gays e outros HSH cis, 11% (536) eram mulheres cis, 8% (384) homens heterossexuais cis, 2% (121) mulheres trans, 0,5% (23) travestis e 0,2% (12) eram homens trans. Dos usuários em PrEP, 34% (1.661) declararam ter relação com pessoa sorodiferente; 41% dos usuários de PrEP tinham entre 30 e 39 anos, 24% tinham de 25 a 29 anos e 14% eram jovens de 18 a 24 anos; 60% se declarou branca ou amarela.
Estudos controlados demonstraram a efetividade da PrEP na redução da transmissão do HIV entre diferentes populações, entre elas casais sorodiscordantes (onde um parceiro está infectado e o outro não), gays e homens que fazem sexo com outros homens, pessoas trans, além de pessoas que usam drogas.6-8
O boletim epidemiológico britânico de HIV revelou em 2018 que o número de novos casos de infecção pelo HIV por ano diminuiu 71% entre a populações-chave. Em Londres, onde existe grande cobertura da PrEP, as novas ocorrências caíram mais do que a metade na última década.9 No Brasil, a incidência do HIV na cidade de São Paulo foi reduzida em 20% em apenas um ano, após a implementação da PrEP.5
A Profilaxia Pré-Exposição (PrEP) consiste no uso diário de uma combinação medicamentosa dos antirretrovirais Tenofovir Difosfato Disoproxil Fumarato e Emtricitabina por pessoas HIV soronegativas e deve ser utilizada quando existe um risco substancial de contrair o patógeno; caso destinada à indivíduos que não possuem maior probabilidade de infecção, do ponto de vista da saúde pública, não há benefícios comprovados. Nesse caso, a PrEP pode trazer efeitos colaterais aos usuários e se tornar um gasto desnecessário de recurso público.10
A implantação da PrEP geralmente tem sido lenta e enfatiza a escolha de estratégias combinadas que previnam o vírus. A estigmatização do comportamento sexual e a estagnação e o aumento nas aumento nas taxas de infecção por ISTs e HIV, especialmente entre as populações mais vulneráveis corrobora o desenvolvimento desse estudo.11
Com a finalidade de divulgar informações sobre as medidas de prevenção e políticas públicas direcionadas a populações-chave, este estudo tem como objetivo conhecer o perfil da população cadastrada para o recebimento da profilaxia.
MÉTODOS
Trata-se de uma pesquisa documental de abordagem quantitativa, realizada no Serviço de Assistência Especializada e Centro de Testagem e Aconselhamento (CTA) de Maringá/PR. Localizada na região noroeste do Paraná, terceiro maior município do estado e o sétimo mais populoso da Região Sul do Brasil, com população estimada de 423.666 habitantes, em uma área territorial de 486 km2 com densidade populacional de 828 habitantes por km2.12
O serviço conta com uma equipe formada por profissionais 14 profissionais: um médico(a), que faz as consultas e prescreve a medicação; quatro enfermeiros(as), que abrem os cadastros e transmitem as orientações gerais do programa da PrEP e realizam os testes rápidos a fim de avaliar o risco e a vulnerabilidade e verificar se o paciente atende aos critérios para iniciar a profilaxia; dois farmacêuticos(as), responsáveis pela dispensação dos medicamentos (TRUVADA®); cinco técnicos(as) e auxiliares de enfermagem, encarregados de coletar os exames e colaborar; e dois auxiliares administrativos, cuja tarefa é fazer os agendamentos dos usuários.
Os CTAs permitem iniciativas de prevenção ao HIV, interferir no ciclo de transmissão, promovendo acesso oportuno ao diagnóstico, monitorando o estado sorológico, perfil sociodemográfico e comportamentos sexuais dos indivíduos, bem como contribuindo na avaliação das fragilidades com vistas a programar as atividades com resolutividade.
A amostra foi composta por 52 prontuários abertos em 2020, com base na seleção do grupo chamado de população-chave, como HSH, profissionais do sexo, casais sorodiferentes, transexuais, usuários de drogas, que passaram pelo acolhimento, avaliação de ilegibilidade e orientações pelos enfermeiros do CTA, seguindo o protocolo de Ministério da Saúde sobre o programa.
A coleta dos dados foi realizada por um único examinador, no período compreendido entre janeiro e abril de 2020, no cadastro de usuários do programa de PrEP que iniciaram a profilaxia durante a implantação da PrEP no município. Para coleta foram utilizadas as variáveis, referentes à: sexo, idade, raça/cor, escolaridade, estado civil, características da população-chave e quanto a prevenção dos usuários.
A partir do armazenamento dos dados em planilhas do tipo Excel®, sua análise foi realizada através da estatística descritiva. Esta pesquisa seguiu as diretrizes e normas regulamentadoras contidas na Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde e Comitê Permanente de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Estadual de Maringá, conforme CAAE de número: 24150819.7.0000.0101 e Parecer nº 3.776.770.
RESULTADOS
Em Maringá, a PrEP foi disponibilizada em agosto de 2019, totalizando 52 usuários, selecionados a partir de sua pretensão de usar a profilaxia e da observação dos atendimentos anteriores no CTA, realizando a gestão dos riscos desses pacientes. Muitos destes faziam o uso da profilaxia pós-exposição (PEP), frequentemente após os relacionamentos sem preservativo.
Conforme apresentado na Tabela 1, quase que na sua totalidade foram participantes do sexo masculino (96,1%), de cor branca (80,7%) com idade entre 21 e 30 anos (46,1%) e dois terços são solteiros (65,4%).
Tabela 1 - Distribuição das características sociodemográficas dos usuários do grupo-piloto de implantação da PrEP – Maringá, Paraná, 2021.
Variável |
Frequência absoluta |
% |
SEXO |
|
|
Feminino |
2 |
3,85 |
Masculino |
50 |
96,15 |
IDADE |
|
|
De 21 a 30 anos |
24 |
46,15 |
De 31 a 40 anos |
23 |
44,23 |
Mais de 40 anos |
5 |
9,62 |
RAÇA/COR |
|
|
Amarela |
1 |
1,92 |
Branca |
42 |
80,77 |
Parda |
8 |
15,38 |
Preta |
1 |
1,92 |
ESCOLARIDADE |
|
|
Ensino médio |
23 |
44,23 |
Ensino superior |
29 |
55,77 |
ESTADO CIVIL |
|
|
Casado |
18 |
34,62 |
Solteiro |
34 |
65,38 |
TOTAL |
52 |
100 |
Fonte: Os autores
Quanto ao perfil da população-chave, a Tabela 2 mostra que apenas um dos participantes é transexual (1,92%), dois são profissionais do sexo (3,85%), 34,62% se caracterizam-se como casais sorodiferentes e 84,62% são homens que fazem sexo com homens, representada como mais frequente da população-chave.
Tabela 2 - Distribuição das características da população-chave, usuários do grupo-piloto de implantação da PrEP – Maringá, Paraná, 2021.
População-chave |
Frequência absoluta |
% |
TRANSEXUAIS |
1 |
1,92 |
CASAIS SORODIFERENTES |
18 |
34,62 |
HOMENS QUE FAZEM SEXO COM HOMENS (HSH) |
44 |
84,62 |
PROFISSIONAIS DO SEXO |
2 |
3,85 |
TOTAL |
52* |
100 |
*um mesmo respondente pode se encaixar em mais de uma característica
Fonte: Os autores
Quanto à prevenção as infecções sexualmente transmissíveis, os resultados da Tabela 3 apontaram apenas duas pessoas com a infecção, 55,76% referiram usar preservativo todas as vezes. Em relação à adesão à profilaxia, nota-se que metade (50%) dos respondentes informou boa adesão medicamentosa. Os dados também indicaram que 46,16% desistiram ou abandonaram a PrEP e que 3,84% apresentaram contraindicação à medicação e descontinuaram a profilaxia. Com abandono da PrEP, mais infecções por HIV ocorreriam, o que exigiria terapia ao longo da vida.
Por fim, a pesquisa mostrou que a prevenção combinada mais frequente foi PrEP mais preservativo (38,47%); por sua vez, 30,75% abandonaram o preservativo e utilizam somente a profilaxia, ao passo que 17,30% utilizam a PrEP e companheiro indetectável. Apenas 13,48% dos entrevistados disseram usar todas as formas de prevenção disponíveis.
Tabela 3 - Distribuição das questões referentes à prevenção utilizada pelos usuários do grupo-piloto de implantação da PrEP – Maringá, Paraná, 2021
Tipo de prevenção |
Frequência absoluta |
% |
Infecção sexualmente transmissível |
|
|
Não |
50 |
96,15 |
Sim |
2 |
3,85 |
Uso de Preservativo |
|
|
Usa menos da metade |
6 |
11,53 |
Usa mais da metade das vezes |
17 |
32,69 |
Usa todas as vezes |
29 |
55,76 |
Adesão à profilaxia |
|
|
Boa adesão |
26 |
50,00 |
Descontinuação por alteração nos exames laboratoriais |
2 |
3,84 |
Desistência/abandono/sem informação |
24 |
46,16 |
Prevenção combinada |
|
|
Utiliza apenas a PrEP |
16 |
30,75 |
Utiliza a PrEP + preservativo |
20 |
38,47 |
Utiliza companheiro indetectável + PrEP |
9 |
17,30 |
Utiliza companheiro indetectável + PrEP + preservativo |
7 |
13,48 |
Total |
52 |
100 |
Fonte: Os autores
DISCUSSÃO
Os avanços nas estratégias de prevenção, como a Profilaxia Pré-Exposição ao HIV (PrEP), representam uma nova oportunidade para reduzir a incidência do HIV. No presente estudo, os dados sócios demográficos demonstram que a população analisada é constituída em sua maioria por adultos e jovens que se somam 90,3% com idade entre 21 e 40 anos, solteiros e declarados predominantemente brancos, corroborando os estudos dos autores.13,14,15
Em relação à escolaridade, percebeu-se um bom grau de instrução educacional da população pesquisada, uma vez que a grande maioria da amostra analisada apresentou ensino médio a superior completo. Tais dados corroboram com estudo.17 realizado com 1187 participantes brasileiros acerca da adesão de PrEP, na qual 63,4% da amostra possuía ensino superior ou pós graduação.17
No que se refere a orientação sexual, houve maior percentual de homens que fazem sexo com homens, corroborando achados de outros estudos.18-19 Trata-se de uma profilaxia direcionada para grupos que possuem maiores chances de adquirir contato com o HIV, como é o caso do segmento de HSH, no qual tem se observado um aumento da prevalência do HIV.20
Nos Estados Unidos da América (EUA), apesar de todas as intervenções de prevenção comportamental, houve pouca diminuição nos casos de HIV, anualmente ocorre cerca de 50.000 novas infecções por HIV, sendo que a maioria ocorre entre HSH.21
Quanto aos métodos preventivos convencionais, nota-se que o uso do preservativo teve boa adesão na amostra. Entretanto, segundo pesquisa realizada pelo Ministério da Saúde, 45% da população Brasileira não usam preservativo, mesmo sabendo que é eficaz como meio de prevenção ao HIV e outras IST. Isso reforça o entendimento de que os meios adotados até então não têm sido suficientes e precisam ser complementados.2
A respeito de IST e do uso de preservativo, destaca-se que apenas dois participantes apontaram resposta positiva para IST (3,85%), ao passo que o estudo PROUD apresentou 50% dos usuários com infecções sexualmente transmissíveis durante o acompanhamento.13 Vê-se também que 55,76% relataram usar preservativo todas as vezes.
A redução de quase 50% na adesão à profilaxia pelos usuários cadastrados na PrEP pode estar relacionada a alguns fatores como o estigma relacionado ao HIV e a PrEP, constrangimento pela utilização de medicação também utilizado para o tratamento do HIV, além de dificuldade ao local de acesso, monitorização e continuidade ao tratamento e a falta de conhecimento acerca do assunto.22
A pesquisa mostrou que a prevenção combinada mais frequente foi PrEP mais preservativo (38,47%); por sua vez, 30,75% abandonaram o preservativo e utilizam somente a profilaxia, ao passo que 17,30% utilizam a PrEP e companheiro indetectável. Apenas 13,48% dos entrevistados disseram usar todas as formas de prevenção disponíveis. Resultados da implementação em San Francisco encontraram uma incidência relativamente alta de ISTs e uma redução de 41% no uso de preservativo relatado pelos usuários da PrEP.23
Segundo um estudo realizado24, observou-se que os medicamentos empregados na PrEP foram descritos por média adesão por 82% dos integrantes do estudo, sendo que 15% destes suspenderam o uso dos medicamentos. Dos participantes que desistiram do tratamento 29% foram devidos os efeitos colaterais, 18% estavam relacionados apreensão com os efeitos colaterais ao longo prazo e 24% devido a autopercepção do baixo risco ao HIV.
Na ótica dos usuários a profilaxia do HIV/AIDS vem a auxiliar na prevenção de possíveis acidentes como o rompimento de preservativos ou não uso dele. Além disso, a segurança não é apenas de quem está fazendo o uso da PrEP, mas sim do casal. Atualmente, a prevenção combinada é a abordagem dominante nos discursos e ações de enfrentamento à epidemia de HIV no Brasil e no mundo. Sugere o uso combinado de métodos de prevenção, de acordo com as possibilidades e escolha de cada pessoa, sem excluir um ou substituí-lo por outro.4
A estratégia da inclusão da PrEP, buscando a adaptação às necessidades de prevenção, incluindo concomitantemente medidas para apoiar o uso dos preservativos visando a prevenir ISTs entre os usuários, bem como um meio para a promoção da saúde sexual eficaz entre todos os HSH, conforme estipulado pelas diretrizes existentes. O programa ideal de prevenção combinada precisa ser definido, mas isso dependerá da epidemiologia local e da prestação de serviços.25-26
Um grande desafio para implantação da PrEP como direito à prevenção é pensar como criar a oportunidade, garantindo autonomia e dignidade, que sustente a liberdade de todos os princípios fundamentais. A Profilaxia Pré-Exposição ao HIV enfatiza um direito necessário à construção da dignidade humana, uma emergência do direito à liberdade sexual, como um fator relevante e decisivo a ser considerado pelo SUS, buscando a quebra dessa cadeia epidemiológica de transmissão do HIV.27
Discutir a prevenção combinada reforça uma preocupação em aumentar os princípios protetores, sendo percebida como uma proteção adicional. De fato, trata-se da melhor opção, tanto para prevenir o HIV quanto outras ISTs.28
CONCLUSÃO
O HIV é um problema de saúde pública global e nos últimos anos trouxe consequências a muitas famílias, comunidades e países. As pesquisas relacionadas à Profilaxia Pré-Exposição ao HIV (PrEP) possibilita a escolha de cada pessoa, associando um método ao outro, entendendo que as tecnologias de prevenção devem ser combinadas.
Pesquisas como essa tem contribuído para a construção do conhecimento da enfermagem relacionado ao perfil dos usuários. Considerando-se que o HIV tem impacto não somente para o paciente, mas para seus parceiros e sociedade em geral, conhecer e analisar o perfil e as medidas disponíveis de prevenção é fundamental para identificação de comportamentos de risco, realizando aconselhamento direcionado, buscando reduzir os casos de HIV e diminuindo o impacto na saúde e na sociedade.
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Submissão: 2022-02-19
Aprovado: 2022-05-20