EVENTOS IATROGÊNICOS ENVOLVIDOS NO TRATAMENTO DE FERIDAS: UMA REVISÃO DA LITERATURA
IATROGENIC EVENTS INVOLVED IN WOUND CARE: A LITERATURE REVIEW
EVENTOS IATROGÉNICOS INVOLUCRADOS EM EL CUIDADO DE HERIDAS: UMA REVISIÓN DE LA LITERATURA
https://doi.org/10.31011/reaid-2023-v.97-n.1-art.1587
1Ana Paula do Monte Serrato Fernandes
2Ângela da Silva Rodrigues
3Luciana da Silva Barros
4Hélio Galdino Junior
1Universidade Federal de Goiás - Brasil. ORCID: https://orcid.org/0000-0003-3167-8175
2Universidade Federal de Goiás - Brasil. ORCID: https://orcid.org/0000-0003-3658-5891
3Universidade Federal de Goiás – Brasil. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-4827-0435
4Universidade Federal de Goiás - Brasil. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-5570-8183
Autor correspondente
Luciana da Silva Barros
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Contatos: +58(62)99666-2210. +55(62)3211-5161.
E-mail: lucianabarros@discente.ufg.br
Submissão: 24-11-2022
Aprovado: 13-02-2023
RESUMO
Objetivo: identificar as iatrogenias envolvidas no tratamento de feridas. Metodologia: estudo de revisão integrativa da literatura, cuja busca se deu nas bases da Biblioteca Virtual em Saúde, da Scientific Electronic Library Online e da Literatura Latino-americana e do Caribe em Ciências da Saúde através do uso dos descritores controlados “feridas” OR “ferimentos e lesões” AND “curativos”, “feridas” OR “ferimentos e lesões” AND “tratamento”,” feridas” OR “ferimentos e lesões” AND “infecção”, “iatrogenias” AND “ferimentos e lesões”. Resultados: foram analisados 17 artigos. As principais iatrogenias encontradas foram Complicações na ferida: infecção, deiscência e atraso na cicatrização, avaliação e seleção de produtos para o tratamento, falha na indicação de terapias complementares, uso de terapia sem comprovação científica, falta de autonomia para a atuação da enfermagem no tratamento de feridas. Conclusão: Não foram encontrados estudos com destaque para as iatrogenias. As iatrogenias identificadas neste estudo nos levam a refletir que falhas no tratamento proposto pelo profissional da saúde pode corroborar para a cronicidade das feridas. O levantamento dessas iatrogenias pode trazer contribuições para melhorar a formação de enfermeiros e sua capacitação em serviço, a fim de reduzir a incidência desses problemas e aumentar a segurança e qualidade do cuidado.
Palavras-chave: Doença Iatrogênica; Ferimentos e Lesões; Enfermagem.
ABSTRACT
Objective: To identify the iatrogens involved in wound care. Methodology: an integrative literature review study, whose search was based on the Virtual Health Library, the Scientific Electronic Library Online and the Latin American and Caribbean Literature on Health Sciences through the use of the controlled descriptors “wounds” OR “ wounds and injuries” AND “dressings”, “wounds” OR “wounds and injuries” AND “treatment”, ”wounds” OR “wounds and injuries” AND “infection”, “iatrogenics” AND “wounds and injuries”. Results: 17 articles were analyzed. The main iatrogens found were Complications in the wound: infection, dehiscence and delay in healing, evaluation and selection of products for the treatment, failure to indicate complementary therapies, use of therapy without scientific evidence, lack of autonomy for the nursing performance in the treatment of wounds. Conclusion: No studies were found with emphasis on iatrogenics. The iatrogenic events identified in this study lead us to reflect that failures in the treatment proposed by the health professional can corroborate the chronicity of wounds. The survey of these iatrogenies can bring contributions to improve the training of nurses and their training in service, in order to reduce the incidence of these problems and increase the safety and quality of care.
Keywords: Iatrogenic Disease; Wounds and Injuries; Nursing.
RESUMEN
Objetivo: Identificar los iatrógenos involucrados en el cuidado de heridas. Metodología: estudio integrador de revisión bibliográfica, cuya búsqueda se basó en la Biblioteca Virtual en Salud, la Biblioteca Científica Electrónica en Línea y la Literatura Latinoamericana y del Caribe en Ciencias de la Salud mediante el uso de los descriptores controlados “heridas” O “heridas y lesiones” Y “vendajes”, “heridas” O “heridas y lesiones” Y “tratamiento”, “heridas” O “heridas y lesiones” Y “infección”, “iatrogenia” Y “heridas y lesiones”. Resultados: se analizaron 17 artículos. Los principales iatrógenos encontrados fueron Complicaciones en la herida: infección, dehiscencia y retraso en la cicatrización, evaluación y selección de productos para el tratamiento, falta de indicación de terapias complementarias, uso de terapia sin evidencia científica, falta de autonomía para la actuación de enfermería en el tratamiento de heridas Conclusión: No se encontraron estudios con énfasis en iatrogenia. Los eventos iatrogénicos identificados en este estudio nos llevan a reflexionar que las fallas en el tratamiento propuesto por el profesional de la salud pueden corroborar la cronicidad de las heridas. El levantamiento de estas iatrogenias puede traer contribuciones para mejorar la formación de los enfermeros y su formación en el servicio, con el fin de reducir la incidencia de estos problemas y aumentar la seguridad y calidad de la atención.
Palabras clave: Enfermedad Iatrogénica; Heridas y Lesiones; Enfermeria.
INTRODUÇÃO
Ferida é um termo que representa uma variedade de lesões, desde uma incisão laparoscópica até uma grande cicatriz cirúrgica, passando por úlceras venosas, lesões por pressão e queimaduras e outras etiologias resultantes da perda da integridade da pele(1).
As feridas podem ser classificadas como agudas ou crônicas. Feridas agudas são aquelas que cicatrizam em um curto período, enquanto feridas crônicas são lesões que apresentam retardo na cicatrização devido a processos infecciosos ou em decorrência de outras doenças crônicas pré-existentes. Uma ferida aguda pode se tornar crônica caso haja interferência no processo fisiológico de cicatrização(²).
Quando há retardo na cicatrização, os portadores de feridas crônicas enfrentam intensas mudanças na vida, podendo experimentar isolamento social, dor, sofrimento e necessidade de adaptação às sessões diárias de tratamento, às alterações na atividade física e deambulação, às restrições alimentares, ao uso de medicamentos contínuos e aos distúrbios de autoimagem(3).
O tratamento adequado de uma pessoa com ferida deveria ser multi e interdisciplinar, envolvendo uma abordagem centrada na pessoa ferida(4). Enfermeiros com conhecimento no cuidado a pessoas com feridas são essenciais na gestão do tratamento e frequentemente são responsáveis pela criação de protocolos de tratamento e sua implementação, pois acompanham diretamente a evolução da ferida, o que garante um melhor resultado(3).
O Conselho Federal de Enfermagem (COFEN), por meio da resolução nº 567/2018, respalda, aprova e regulamenta a atuação do enfermeiro no cuidado ao paciente com feridas, possibilitando autonomia para avaliar, elaborar protocolos e selecionar e indicar novas tecnologias para prevenção e tratamento de pessoas com feridas(5).
Cuidar de pessoas com feridas é um processo dinâmico, complexo, que requer conhecimento específico, sendo imprescindível que os profissionais atuantes reconheçam os produtos disponíveis no mercado e desenvolvam técnicas de curativos que proporcionem e auxiliem na cicatrização das lesões, uma vez que um erro na prescrição da terapia ou a realização errônea das técnicas terapêuticas podem levar a um comprometimento do processo cicatricial e refletir na piora do quadro de saúde do paciente(6).
Portanto, caso o profissional da saúde, ao prestar um atendimento, provoque efeito danoso involuntário, tem-se o que denominamos de iatrogenia, palavra etimologicamente derivada do grego e relacionada à alteração patológica provocada no paciente devido à ação de profissionais da saúde(7).
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), boa parte da população sofre algum tipo de iatrogenia nos serviços de saúde e cerca de quatro em cada dez pacientes sofrem danos na atenção primária e nos serviços ambulatoriais, fato que acarreta danos pessoais, sociais e econômicos aos sistemas de saúde em todo o mundo(8).
Nesse contexto, é importante que o profissional da saúde reconheça os riscos existentes na oferta de um tratamento inadequado para feridas agudas ou crônicas e empenhe-se em oferecer um tratamento apropriado, garantindo, assim, a cicatrização das feridas e proporcionando ao indivíduo o retorno às atividades diárias.
Tendo em consideração o exposto anteriormente e visando refletir sobre as iatrogenias envolvidas no tratamento de feridas, elaborou-se a seguinte questão de pesquisa: quais são as iatrogenias cometidas no tratamento de feridas? Com o intuito de responder essa questão, o presente estudo tem por objetivo identificar, na literatura, as iatrogenias cometidas no tratamento de pessoas com feridas.
MÉTODO
Tipo de estudo
Trata-se de um estudo de revisão integrativa da literatura, método de pesquisa que utiliza informações e ideias que possibilitem o fortalecimento da prática baseada em evidências. A revisão integrativa sintetiza os resultados de pesquisas anteriores e mostra, sobretudo, as conclusões do corpus da literatura sobre um fenômeno específico(9).
Coleta de dados
Para a realização deste estudo, foram utilizadas as seis etapas previstas na revisão integrativa: 1) escolha e identificação do tema; 2) busca na literatura; 3) categorização dos estudos; 4) avaliação dos estudos incluídos na revisão; 5) interpretação dos resultados; 6) síntese do conhecimento(10).
Para o desenvolvimento do estudo, foi elencada a seguinte questão de pesquisa: quais são as iatrogenias cometidas no tratamento de feridas? A partir desta, deu-se sequência às etapas da revisão integrativa e à seleção dos materiais que possibilitaram a argumentação aqui exposta acerca da temática.
Nesse sentido, foram utilizadas as bases de dados da Biblioteca Virtual em Saúde (BVS) e da Literatura Latino-americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS), e Google Acadêmico, delimitando as buscas por meio dos descritores controlados (DECS) “feridas” OR “ferimentos e lesões” AND “curativos”, “feridas” OR “ferimentos e lesões” AND “tratamento”, “feridas” OR “ferimentos e lesões” AND “infecção”, “iatrogenias” AND “ferimentos e lesões”.
A coleta de dados aconteceu entre os meses de agosto e dezembro de 2021, considerando como critério de inclusão artigos de livre acesso publicados nos últimos dez anos (entre 2011 e 2021), com texto na íntegra e no idioma português. Foram excluídos estudos provenientes de monografias, dissertações, teses e estudos que não apresentassem relação com a temática em discussão.
Após a seleção dos artigos nas bases, foi realizada uma primeira avaliação por meio da breve leitura sistemática do título e do resumo, sendo excluídos da amostra aqueles que não apresentaram coerência com a temática a ser discutida e com o objetivo desta pesquisa. Para a coleta de dados, utilizou-se um instrumento próprio, no qual foram categorizados os artigos resultantes da busca, contendo os seguintes itens: título do artigo e ano de publicação, objetivo e método, iatrogenia encontrada e possível causa da iatrogenia.
Os problemas classificados como iatrogenias foram avaliados por três pesquisadores e as divergências foram definidas pelo quarto pesquisador. As possíveis causas da iatrogenia foram levantadas nos estudos e, posteriormente, apresentadas e discutidas à luz da literatura, da ética profissional e dos direitos do paciente. Por fim, elaborou-se este relatório da revisão a partir das recomendações do Prisma Statment(11).
Figura 1 - Fluxograma do processo de inclusão dos estudos
RESULTADOS
A busca inicial encontrou 300 artigos, que
após aplicação dos critérios de inclusão e exclusão, resultou em 17 artigos
incluídos no estudo.
Após a seleção dos artigos, foram elencadas as iatrogenias encontradas seguidas das causas para a sua ocorrência.
O Quadro 1 apresenta o título dos artigos encontrados, o ano de publicação do estudo, o objetivo e método de cada artigo e a iatrogenia encontrada.
Quadro 1 - Caracterização dos estudos segundo título e ano de publicação, objetivo e método, conclusão e iatrogenia encontrada.
Título e ano |
Objetivo e método |
Iatrogenia encontrada |
Possível causa da iatrogenia |
Análise crítica do protocolo de tratamento da ferida operatória complicada após esternotomia para cirurgia cardíaca (2017)(12) |
Objetivo: realizar levantamento dos pacientes vítimas de complicação após esternotomia que tenham sido tratados segundo o protocolo desenvolvido e aprimorado no InCor-HCFMUSP e que tenham sido operados por um mesmo cirurgião plástico, a fim de analisar o perfil epidemiológico e eventual indicador de pior prognóstico dentre os exames colhidos habitualmente desses pacientes. Método: estudo descritivo de caráter epidemiológico. |
complicações de ferida operatória, como deiscência e infecção. das feridas.
|
Ausência de protocolo institucional para avaliação e acompanhamento |
Avaliação clínica de pacientes com úlceras de perna acompanhadas em ambulatório (2021)(13) |
Objetivo: realizar avaliação clínica e sociodemográfica de pacientes com úlceras de perna. Método: estudo transversal quantitativo realizado com 105 pacientes com úlceras de perna em ambulatórios da rede pública de Niterói/RJ. |
escolha inadequada do tratamento tópico. |
falta de conhecimento |
Oxigenoterapia hiperbárica para tratamento de feridas (2016)(14) |
Objetivo: descrever os tipos mais frequentes de feridas com indicação para terapia por oxigênio hiperbárico e os resultados obtidos. Método: estudo transversal realizado em um centro hiperbárico localizado na cidade de Salvador/BA. |
falhas na indicação de terapias complementares, como a oxigenoterapia hiperbárica. |
falta de conhecimento sobre terapias complementares, como a oxigenoterapia hiperbárica. |
Plantas medicinais: indicação de raizeiros para o tratamento de feridas (2016)(15) |
Objetivo: analisar as indicações e o conhecimento de raizeiros quanto ao uso de plantas medicinais para o tratamento de feridas. Método: estudo quantitativo de caráter descritivo, realizado com 32 raizeiros do município de Campina Grande/PB. |
Intervenções sem comprovação cientifica |
falta de conhecimento sobre o uso de plantas medicinais no tratamento de feridas. |
Protocolo de assistência a pessoas com úlceras venosas: estudo metodológico (2015)(16) |
Objetivo: averiguar a validade de conteúdo do protocolo para assistir pessoas com úlcera venosa na atenção primaria. Método: estudo metodológico realizado de setembro a novembro de 2012. Produziu-se um conjunto de itens a serem considerados no protocolo de assistência multiprofissional. |
abordagem da pessoa com ferida e avaliação da ferida inadequada ou incompleta. |
ausência do uso de protocolos validados, falta de conhecimento. |
Qualidade de vida de pessoas com feridas crônicas (2019)(17) |
Objetivo: avaliar a qualidade de vida de pessoas com feridas crônicas. Método: estudo transversal realizado com 176 pessoas com feridas crônicas em acompanhamento ambulatorial e domiciliar em um serviço público de saúde. |
Indicação inadequada do tratamento. |
falta de conhecimento para a tomada de decisão clínica na indicação do produto. |
Caracterização do comportamento de cuidadores informais de pacientes com feridas no âmbito hospitalar (2017)(18) |
Objetivo: caracterizar o comportamento do cuidador informal durante o tratamento de feridas de pacientes hospitalizados. Método: estudo prospectivo realizado com 39 cuidadores de pacientes com feridas em um hospital universitário do Centro-Oeste brasileiro. |
Ausência da incorporação do cuidador do paciente no plano de cuidados. |
O não envolvimento do cuidador no plano de cuidados pode interferir na eficácia da terapia e retardar a cicatrização. |
Análise do atendimento clínico de portadores de úlceras crônicas em membros inferiores (2015)(19) |
Objetivo: analisar o atendimento prestado aos portadores de úlceras crônicas em membros inferiores no Ambulatório de Feridas Crônicas da Divisão de Cirurgia Plástica do HCFMUSP entre 2011 e 2013. Método: estudo observacional, longitudinal, retrospectivo, de amostra randomizada. |
seleção inadequada do tratamento tópico. |
Falta de conhecimento para a escolha do tratamento tópico. |
O conhecimento dos enfermeiros assistenciais no tratamento de feridas (2019)(20) |
Objetivo: caracterizar o perfil da formação e atualização dos enfermeiros assistenciais e avaliar o conhecimento acerca do tratamento de feridas em um hospital público de ensino da Zona da Mata mineira. Método: estudo observacional, descritivo e quantitativo realizado com 32 enfermeiros de unidades de internação. |
Seleção inadequada de produtos para o tratamento de feridas. |
desconhecimento de protocolos, produtos e tecnologias e a busca informal por atualização |
Adesão às precauções padrão durante a realização de curativos pela equipe de enfermagem (2018)(21) |
Objetivo: avaliar a adesão da equipe de enfermagem às precauções-padrão durante a realização de curativos em feridas abertas. Método: estudo transversal descritivo realizado em uma clínica cirúrgica de um hospital universitário do estado de Goiás no período de dezembro de 2015 a março de 2016. |
Baixa adesão a higiene de mãos antes do curativo; Uso incorreto de EPI; reuso do capote de um atendimento para o outro. |
Baixa adesão as medidas de prevenção e controle de infecções, desconhecimento do uso adequado dos EPI. |
Conhecimento e prática de enfermeiro no controle de feridas neoplásicas (2017)(22) |
Objetivo: verificar o conhecimento e a prática de enfermeiros no controle de sintomas de pacientes com ferida neoplásica. Método: estudo descritivo de desenho quantitativo realizado com 22 enfermeiros de um hospital filantrópico de Campina Grande/PB. |
Avaliação e tratamento inadequado de feridas oncológicas. Causa: falta de conhecimento teórico e prático na avaliação e no tratamento de feridas oncológicas.
|
Falta de conhecimento teórico e prático na avaliação e no tratamento de feridas oncológicas. |
Conhecimento e prática dos enfermeiros sobre o cuidado com feridas (2016)(23)
|
Objetivo: avaliar o conhecimento dos enfermeiros sobre a avaliação e o tratamento de feridas e descrever a prática clínica no cuidado com feridas. Método: estudo seccional realizado com 55 enfermeiros entrevistados. |
Manejo inadequado de pacientes com feridas |
baixo conhecimento em relação à avaliação e ao tratamento de feridas. |
Avaliação das prescrições de enfermagem e médicas para curativos em um hospital universitário: implicações éticas (2020)(24) |
Objetivo: analisar as prescrições de curativo realizadas por enfermeiros e médicos quanto à clareza e à adequabilidade do produto prescrito, avaliando as características da ferida e analisando as implicações éticas desse contexto. Método: estudo descritivo quantitativo realizado em um hospital universitário do Centro-Oeste brasileiro. Compôs a amostra 180 prescrições de curativos obtidas em prontuários de pacientes com feridas, e as características das feridas foram observadas por meio de instrumento do tipo checklist. |
Prescrições incompletas e incorretas em relação às características das feridas
|
falta de conhecimento no tratamento de feridas. |
Conhecimento dos enfermeiros sobre classificação e prevenção de lesão por pressão (2019)(25) |
Objetivo: avaliar o conhecimento dos enfermeiros sobre lesões por pressão. Método: estudo descritivo e exploratório, com abordagem quantitativa, realizado com 26 enfermeiros que compõem o quadro funcional de todos os setores de um hospital privado em Teresina/PI. |
Avaliação incorreta de lesões por pressão. |
Déficits de conhecimento para prevenção, estadiamento e tratamento de lesões por pressão. |
Desbridamento de feridas em idosos na atenção primária à saúde (2020)(26) |
Objetivo: identificar o conhecimento dos enfermeiros acerca do desbridamento de feridas. Método: estudo exploratório e descritivo realizado com 22 enfermeiros da Estratégia Saúde da Família de um município do Sul do Brasil. |
Ausência da remoção de tecido necrótico do leito de feridas pelo Debridamento durante o tratamento.
|
Baixo nível de conhecimento acerca do desbridamento de feridas. |
Orientações do enfermeiro aos idosos com diabetes mellitus: prevenindo lesões (2019)(27) |
Objetivo: analisar as orientações dos enfermeiros da Unidade de Saúde da Família aos idosos com diabetes mellitus na prevenção de lesões na pele. Método: estudo qualitativo, descritivo e exploratório. |
Déficit na avaliação e orientação aos cuidados de lesão na pele durante as consultas de enfermagem. |
Falta de conhecimento dos enfermeiros para orientação na prevenção de lesão em pacientes idosos com diabetes mellitus. |
Representações sociais de autonomia profissional do enfermeiro na prevenção e tratamento de feridas (2017)(28)
|
Objetivo: analisar as representações sociais elaboradas por enfermeiros acerca de sua autonomia profissional na prevenção e tratamento de feridas. Método: pesquisa qualitativa, descritiva e exploratória. |
Dificuldade em estabelecer as prioridades de enfermagem e em realizar as condutas cabíveis devido à interferência médica. |
Falta de autonomia para o enfermeiro exercer cuidado a pessoas com feridas no âmbito hospitalar. |
Após a análise dos resultados apresentados no quadro 1, é possível destacar cinco categorias de iatrogenias relacionadas ao tratamento de pessoas com feridas: Complicações na ferida: infecção, deiscência e atraso na cicatrização, avaliação incompleta e seleção inadequada de produtos para o tratamento, falha na indicação de terapias complementares, uso de terapia sem comprovação científica e falta de autonomia para a atuação da enfermagem no tratamento de feridas.
DISCUSSÃO
A dificuldade em encontrar artigos que discorram sobre iatrogenia demonstra a escassa produção científica relacionada ao tema, fato evidenciado pela ausência de publicações, quando a busca se deu pela associação dos descritores controlados “iatrogenia” AND “ferimentos e lesões”. Os resultados dos grupos de iatrogenias apresentados no Quadro 1 apontam que, quando é prestado um atendimento, podem ocorrer falhas no processo, as quais devem ser entendidas como iatrogenias.
Os estudos relacionados ao grupo de iatrogenia “complicações na ferida: infecção, deiscência e atraso na cicatrização” evidenciam que padronizar métodos e protocolos ajudam a evitar complicações em feridas operatórias e trazem impactos na redução da mortalidade global dos pacientes, reduzindo também recidivas e reinternações(12,21).
Portanto, padronizar métodos em instituições de saúde envolve a criação de protocolos e a sensibilização da equipe para a adesão ao que está sendo proposto, o que só é possível quando existe um serviço de educação continuada atuante.
Outro fator relacionado ao atraso da cicatrização e que constitui iatrogenia está relacionado à falta de adesão às precauções-padrão pelos profissionais da saúde na realização de curativos. Essa atitude compromete a qualidade da assistência prestada aos pacientes e coloca o profissional em risco de contato com o material biológico ao negligenciar as medidas de biossegurança, favorecendo o risco de contaminação/infecção da ferida. Educação continuada, investimentos na formação dos profissionais e melhoria do sistema de saúde ainda são necessários para minimizar os riscos e garantir uma assistência livre de danos aos pacientes portadores de feridas e com mais segurança para os profissionais(21).
Em relação à “avaliação incompleta e seleção inadequada de produtos para o tratamento”, os estudos mostram ser necessário conhecimento do perfil da população com ferida acompanhada e de seus dados clínicos, pois esses dados possibilitam uma atuação mais direcionada e individualizada da equipe de enfermagem durante a assistência, auxiliando a determinação de cuidados específicos de acordo com as características predominantes da população e das lesões, visando otimizar o atendimento com atuações adequadas às necessidades do paciente(13,16-20,22,24-27).
Para evitar iatrogenias, é necessário que os enfermeiros assistenciais procurem atualizar seu conhecimento sobre feridas. Existem falhas na prática que dizem respeito à ausência de protocolos para o tratamento de lesões, ao desconhecimento de novas tecnologias para a cobertura de lesões e à busca informal por atualização(20).
O método TIME de avaliação de feridas é amplamente adotado por muitos profissionais, pois orienta quanto aos elementos-chave a serem tratados em pessoas com feridas difíceis de curar(4).
A necessidade de alinhar os princípios do TIME com a prática e tecnologias atuais de tratamento de feridas fez com que o acrônimo fosse expandido para TIMERS, em que: T para tecido (inviável ou deficiente); E para infecção e inflamação; M para desequilíbrio da umidade; E para borda da ferida; R para regeneração e reparo do tecido; e S para fatores sociais que afetam a trajetória da cicatrização da ferida. O tempo é fundamental no tratamento de feridas de difícil cicatrização, visto que o risco de complicações aumenta quando uma ferida fica aberta por mais de 30 dias(2).
A técnica de desbridamento de feridas é de extrema importância no tratamento, pois consiste na remoção de tecidos inviáveis, desvitalizados ou colonizados. Enfermeiros demonstram fragilidade quanto ao tema, o que nos faz refletir sobre como estão sendo desenvolvidas as competências técnico-científicas práticas na graduação. Ações de educação permanente são fundamentais para instrumentalizar esses profissionais quanto aos cuidados e às atualizações sobre novas tecnologias e técnicas para o tratamento de feridas(26).
Outro fator que pode levar a iatrogenias está relacionado ao fato de que enfermeiros apresentam déficits no conhecimento sobre lesões por pressão, havendo a necessidade de educação continuada e permanente acerca das medidas para a sua prevenção, bem como em relação ao estadiamento das mesmas(25).
O tratamento realizado de forma inadequada propicia o desenvolvimento de infecções e, consequentemente, o retardo do processo cicatricial, o que eleva o tempo de internação e o uso de múltiplas terapias antimicrobianas, comprometendo a segurança do paciente, reduzindo a sua qualidade de vida e aumentando o exílio social e os custos da assistência(24).
É importante, no tratamento de feridas, a existência de estratégias diferenciadas para reduzir ou atenuar o impacto causado por fatores clínicos (tipo de ferida, exsudato, dor e odor), pois estes são atenuados quando há uma correta avaliação da lesão seguida da escolha de um tratamento adequado.
Para evitar danos ao paciente domiciliar com feridas, o enfermeiro deve capacitar o cuidador informal para que o mesmo realize o curativo e reconheça os sinais clínicos de infecção e retardo na cicatrização. É preciso, também, que os enfermeiros orientem também sobre as coberturas e produtos a serem utilizados(18).
Ainda, os profissionais enfermeiros da atenção primária devem promover educação em saúde para os pacientes que possuem risco de desenvolver lesões de pele ou neuropatias diabéticas. É notório que os enfermeiros ainda apresentam déficit quanto aos conhecimentos específicos com o cuidado da pele de pessoas idosas, portanto é necessária uma capacitação sobre os cuidados prestados ao diabético em geral e, principalmente, em relação à pele.
Dessa forma, o enfermeiro que está inserido na equipe de saúde da família tem um papel muito importante no cuidar de idosos com diabetes mellitus, mas precisa ter um bom conhecimento teórico e prático para que, junto com a família e a equipe multiprofissional, venha a promover o cuidado que é devido a esses pacientes, intervindo positivamente e diminuindo o risco de desenvolvimento de lesões e problemas na pele(27).
Em relação às “falhas na prescrição de terapias complementares”, existem poucas evidências sobre o uso de terapias como a oxigenoterapia hiperbárica na cicatrização de feridas e há escassez de estudos controlados sobre o tema. No entanto, quando há prescrição, é importante que o enfermeiro observe se os indivíduos preenchem os critérios necessários para o tratamento. Além disso, deve-se considerar, juntamente com os médicos e o paciente, a disponibilidade e acessibilidade do serviço de oxigenoterapia, levando em conta, também, a capacidade funcional do indivíduo e a existência de acompanhantes. Os enfermeiros devem prestar cuidados aos pacientes submetidos à terapia hiperbárica focando na educação continuada e no acompanhamento e avaliação da lesão(14).
No tocante ao uso de “terapias sem comprovação científica”, existem várias plantas e raízes usadas empiricamente no tratamento de feridas. Entretanto, as plantas, do mesmo jeito que apresentam propriedades benéficas, podem apresentar toxicidade (fator iatrogênico). É necessário que os profissionais, principalmente aqueles inseridos na atenção primária, apresentem mais conhecimento acerca do tema, visto que as práticas alternativas são importantes e menos dispendiosas para o restabelecimento e promoção da saúde de populações carentes. Logo, o uso de plantas medicinais pode se tornar uma estratégia integrada à atenção primária em saúde, mas requer conhecimento especializado sobre o tema(15).
Quanto à “falta de autonomia para a enfermagem no tratamento de feridas”, observa-se que um dos grandes obstáculos para a autonomia do enfermeiro é a interferência de outros profissionais no cuidado prestado pela enfermagem em ambiente hospitalar, com destaque para a interferência médica. Um estudo ilustrou bem esse fenômeno, no qual, na análise das prescrições de curativos, observou-se que no mesmo dia havia prescrição de um produto pelo enfermeiro e na mesma prescrição o profissional médico prescreveu outro diferente, evidenciando divergência entre as condutas para o mesmo paciente(24).
A equipe médica não se encontra aberta a um diálogo franco sobre as necessidades de saúde identificadas pelos enfermeiros, criando um confronto entre profissionais que se mostra infrutífero do ponto de vista técnico e científico. Não há uma plena autonomia no cuidado de feridas pela tensão que persiste entre o saber médico e o do enfermeiro(28).
É notório que o conhecimento do enfermeiro em relação à cicatrização de feridas deve e precisa ser valorizado, sobretudo quando visa diminuir o número de iatrogenias cometidas no tratamento de feridas. Então, faz-se necessário que a enfermagem assuma o seu papel como protagonista do serviço, respeitando o que está regulamentado na resolução nº 567/2018, do COFEN, que normatiza a atuação da equipe de enfermagem no cuidado aos pacientes com feridas e amplia a atuação do profissional na área. No entanto, é preciso que se procure atualizar o conhecimento científico em relação ao cuidado com feridas, a fim de possibilitar a escolha e prescrição de melhores coberturas, reduzindo, assim, a possibilidade de iatrogenias durante a intervenção junto ao paciente com feridas agudas ou crônicas(5).
A maioria das iatrogenias no tratamento de feridas tem suas bases na carência de conhecimentos advindas da formação. Isso remete a necessidade do enfermeiro especialista em atendimento a pessoa com feridas para oferecer um suporte adicional aos serviços, sendo uma referência para o encaminhamento quando o generalista se sentir limitado para atender ao paciente. Uma intervenção adequada pode aumentar as chances de cicatrização e redução das iatrogenias, bem como aumentar a qualidade de vida e o conforto dos pacientes com feridas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este estudo foi pioneiro nas evidências das iatrogenias que ocorrem na assistência à pessoas com feridas, e retratou a carência de estudos nessa área. As iatrogenias aqui identificadas nos levam a refletir que, inúmeras vezes, o retardo na cicatrização pode ser causado por falhas na avaliação clínica do paciente, na indicação do tratamento, na continuidade do tratamento no domicílio, por falta de orientação do paciente e do cuidador, sendo a carência de conhecimento a causa de desfechos desfavoráveis à progressão da cicatrização.
O levantamento dessas iatrogenias pode trazer contribuições para melhorar a formação de enfermeiros e sua capacitação em serviço, de modo a reduzir a incidência desses problemas e aumentar a segurança e qualidade do cuidado.
O tema estudado ressalta a importância do enfermeiro especialista na atenção integral de enfermagem a pessoas com feridas, pois a inserção desse profissional no serviço pode aumentar a resolutividade (potencializando a cicatrização das feridas) e possibilitar a capacitação de equipes e cuidadores, difundindo conhecimento e práticas baseadas em evidências.
REFERÊNCIAS
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Fomento e Agradecimento: Artigo sem fomento.
Contribuição dos autores
Todos os autores contribuiram na consecução das etapas do artigo.
Editor Científico: Francisco Mayron Morais Soares. Orcid: https://orcid.org/0000-0001-7316-2519
Editor Associado: Edirlei Machado dos-Santos. Orcid: https://orcid.org/0000-0002-1221-0377