ARTIGO ORIGINAL
SEGURANÇA DO PACIENTE: PERSPECTIVA DOS ACADÊMICOS DE ENFERMAGEM
PATIENT SAFETY: PERSPECTIVE OF NURSING STUDENTS
SEGURIDAD DEL PACIENTE: PERSPECTIVA DE LOS ESTUDIANTES DE ENFERMERÍA
1Monalizza de Souza Carvalho Calazans
2Júlia Valéria de Oliveira Vargas Bitencourt
3Eliane de Fátima Almeida Lima
4Flávia Batista Portugal
1Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) Programa de Pós-Graduação em saúde Coletiva. Vitória, ES - Brasil. Orcid: https:orcid/org/0000-0003-1897-2716.
2Universidade Federal da Fronteira Sul. Programa de Pós-graduação em Enfermagem. Chapecó, SC - Brasil. Orcid: https:orcid/org/0000-0002-3806-2288.
3Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) Programa de Pós-Graduação em saúde Coletiva. Departamento de Enfermagem. Vitória, ES - Brasil. Orcid: https:orcid/org/0000-0001-5128-3715.
4Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) Programa de Pós-Graduação em saúde Coletiva. Departamento de Enfermagem. Vitória, ES - Brasil. Orcid: https:orcid/org/0000-0002-4425-2627.
Autor correspondente
Monalizza de Souza Carvalho Calazans
Contato: Rua das Garças, nº 27. Eurico Salles, Serra/ES - Brasil. CEP: 29.160-177.
Fone: +55(27) 99609-3831
E-mail: monalizzasouza@yahoo.com.br
Submissão: 01-12-2022
Aprovado: 24-02-2023
RESUMO
Objetivo: Analisar a compreensão dos graduandos em Enfermagem de uma Universidade Pública, sobre o tema ‘Erro humano e Segurança do Paciente’. Método: Estudo transversal com abordagem quantitativa. Desenvolvido em uma Universidade no Espírito Santo, ES. A coleta dos dados foi realizada por meio do Google Formulário. Os participantes do estudo foram discentes do 5º ao 9º período. A população alvo foi composta de 201 estudantes, no entanto, participaram do estudo 138 discentes. Resultados: Observou-se que 63% dos estudantes discordaram que cometer erros na área da saúde é inevitável. Discordaram que profissionais competentes (64,5%) e estudantes comprometidos (71,0%) não cometem erros que causam danos aos pacientes. A maioria concordou que na vigência de um erro, todos os envolvidos devem discutir sua ocorrência (89,9%) e que a partir do erro deve ser instituída uma efetiva estratégia de prevenção (94,9%). Conclusão: O estudo demonstrou que os estudantes possuem entendimentos sobre erro humano e Segurança do Paciente. Reconhecem e valorizam a discussão do erro após a sua ocorrência por todos os envolvidos e acreditando que bons profissionais e estudantes cometem erros, demonstrando conhecimento adquirido no aprendizado sobre erro humano.
Palavras-chave: Segurança do Paciente; Educação em Enfermagem; Estudantes de Enfermagem.
ABSTRACT
Objective: To analyze the understanding of undergraduate Nursing students at a Public University on the topic 'Human Error and Patient Safety'. Method: Cross-sectional study with a quantitative approach. Developed at a University in Espírito Santo, ES. Data collection was performed using Google Form. Study participants were students from the 5th to the 9th period. The target population consisted of 201 students, however, 138 students participated in the study. Results: It was observed that 63% of the students disagreed that making mistakes in the health area is inevitable. They disagreed that competent professionals (64.5%) and committed students (71.0%) do not make mistakes that cause harm to patients. The majority agreed that when an error occurs, all those involved should discuss its occurrence (89.9%) and that an effective prevention strategy should be instituted from the error (94.9%), as well as they agreed a must institute systemic analysis of the facts (94.9%) to implement human error prevention measures. Conclusion: The study demonstrated that students have understandings about human error and Patient Safety. They recognize and value the discussion of the error after its occurrence by all involved and believing that good professionals and students make mistakes, demonstrating knowledge acquired in learning about human error.
Keywords: Patient Safety; Nursing Education; Nursing Students.
RESUMEN
Objetivo: Analizar la comprensión de los estudiantes de graduación en Enfermería de una Universidad Pública sobre el tema 'Error Humano y Seguridad del Paciente'. Método: Estudio transversal con enfoque cuantitativo. Desarrollado en una Universidad en Espírito Santo, ES. La recogida de datos se realizó mediante Google Form. Los participantes del estudio fueron estudiantes del 5º al 9º período. La población objetivo estuvo constituida por 201 estudiantes, sin embargo, 138 estudiantes participaron del estudio. Resultados: Se observó que el 63% de los estudiantes no estuvo de acuerdo en que cometer errores en el área de la salud es inevitable. Discreparon en que profesionales competentes (64,5%) y estudiantes comprometidos (71,0%) no cometen errores que causen daño a los pacientes. La mayoría coincidió en que cuando ocurre un error, todos los involucrados deben discutir su ocurrencia (89,9%) y que se debe instituir una estrategia efectiva de prevención del error (94,9%), así como coincidieron en que se debe instituir el análisis sistémico de los hechos (94,9%) para implementar medidas de prevención de errores humanos. Conclusión: El estudio demostró que los estudiantes tienen conocimientos sobre el error humano y la seguridad del paciente. Reconocen y valoran la discusión del error después de su ocurrencia por parte de todos los involucrados y creen que los buenos profesionales y estudiantes cometen errores, demostrando los conocimientos adquiridos en el aprendizaje del error humano.
Palabras clave: Seguridad del Paciente; Educación en Enfermería; Estudiantes de Enfermería.
INTRODUÇÃO
A Segurança do Paciente é um dos principais fundamentos da assistência à saúde e um elemento indispensável para a gestão da qualidade em todo o mundo(1). Esse tem sido um tema de destaque desde 1999, após a publicação do documento To Err Human, pelo Instituto de Medicina dos Estados Unidos, o qual apontou a gravidade dos problemas de qualidade e segurança envolvidos na assistência ao paciente(2). Ainda, demonstrou que para 100 pacientes internados, as taxas de eventos adversos representaram de 8 a 51%(3), cujas consequências incluíram aumento na morbidade, mortalidade, no tempo de tratamento dos pacientes e nos custos assistenciais(4).
O erro ou incidente pode ser definido como um evento ou circunstância que poderia ter resultado, ou resultou, em dano desnecessário ao paciente(8-9). Esses episódios de erro podem causar sérios danos aos envolvidos, pois além de afetar quanti-qualitativamente as instituições, os profissionais relacionam a sentimentos de vergonha, culpa e medo de punições, dada a cultura punitiva existente, o que contribui para as omissões, perdendo-se a chance de conhecer e tratar adequadamente o erro (26).
Por ser uma problemática cuja magnitude tem caráter global, a Organização Mundial de Saúde (OMS), em 2002(5), reconheceu a necessidade de promoção da Segurança do Paciente como um princípio fundamental de todos os sistemas de saúde, exortou os Estados-membros que observassem com maior atenção aos problemas da Segurança do Paciente. A resolução requisita um programa de qualidade com normas, padrões e diretrizes globais para assegurar uma condição favorável ao atendimento do cliente, com promoção de políticas públicas dentro de padrões globais e, encoraja pesquisas sobre o tema.
Face ao exposto, representantes da OMS ponderaram que uma ação prioritária para a melhoria da Segurança dos Pacientes nos serviços de saúde deva ocorrer no âmbito da formação, sendo assim, a estruturação de uma política de ensino sobre o tema em cursos de graduação da área da saúde, incluindo o assunto em seus projetos pedagógicos. Nessa lógica, a OMS estabeleceu o documento Patient safety curriculum guide: multiprofissional edition(5), trata-se de um guia que é composto por duas partes, a primeira elaborada para orientar os professores para a capacitação na temática e a segunda parte apresentando onze tópicos com conteúdo que proporcionam aprendizagem e ensino do tema(5). O guia não determina que haja uma disciplina separada para a discussão do tema, mas enfatiza a importância da integração entre as diversas áreas do conhecimento e planos de cuidado à saúde(6).
Logo, a formação é uma estratégia vital que visa à capacitação de estudantes e profissionais, contudo é sabido que a inclusão e as tentativas de integração dos conteúdos sobre a Segurança do Paciente são propostas recentes na formação dos profissionais da saúde no Brasil(7). Essa discussão iniciou-se a partir da publicação da Portaria nº 529, de 1º de abril de 2013(8), que apresenta como uma das estratégias do Programa Nacional de Segurança do Paciente, fomentar a inclusão do tema no ensino técnico e de graduação e pós-graduação na área da saúde. Com o objetivo de instituir ações para a promoção e a melhoria da qualidade nos serviços de saúde, posteriormente, foi publicada a Resolução da Diretoria Colegiada nº 36(9), que determina a aplicação das legislações para os serviços de saúde, sejam eles públicos, privados, filantrópicos, civis ou militares, incluindo aqueles que exercem ações de ensino e pesquisa.
Dessa forma, a inserção do conteúdo na educação dos profissionais de saúde é fundamental para se construir, sistematicamente, uma cultura de segurança que refletirá nas práticas assistenciais. Nesse contexto, o enfermeiro configura-se um ator importante para este constructo, visto que envolve-se de forma constante na execução dos cuidados, implementação, inclusão do paciente nos cuidados de saúde, aperfeiçoamento da equipe de Enfermagem e avaliação de estratégias de gestão(10-11).
Assim, é imprescindível que a formação do profissional de Enfermagem seja voltada para o desenvolvimento do conhecimento, habilidade e comportamento para a prestação de cuidados seguros(6).
O tema evoca a necessidade de alterações das grades curriculares nacionais dos cursos de Enfermagem(13), bem como a discussão de novas estratégias, mais dinâmicas e participativas nas quais os estudantes sejam inseridos como atores ativos na construção do seu conhecimento, apoiados por ferramentas educacionais inovadoras, como simulações, filmes, vídeos, encenações e dramatizações(14).
Estudos recentes(1,6) demonstraram que há uma lacuna no processo de aprendizado frente à análise sistêmica dos erros, focando no método tradicional de ensino e fortalecendo a cultura punitiva em detrimento da cultura justa.. Em outros estudos(6,17), estudantes de Enfermagem demonstraram-se mais confiantes em relação a aspectos clínicos voltados à Segurança do Paciente, (como por exemplo: prevenção de infecções, higienização das mãos, prevenção de quedas, dentre outros) que foram aprendidos em sala de aula e no período de estágio em ambiente hospitalar, em comparação aos aspectos socioculturais para garantir a Segurança do Paciente.
Portanto, compreender como os profissionais estão entendendo a cultura da Segurança do Paciente ainda durante o período de formação, é importante para fortalecer e priorizar estratégias de ensino que promovam a reflexão do estudante e o instrumentalize para o constante processo de análise das situações que vivenciará durante a construção do aprendizado, transpondo esse conhecimento para suas atitudes futuramente na carreira profissional(18). Entende-se cultura da segurança do paciente como um conjunto de valores, atitudes, competências e comportamentos que determinam o comprometimento com a gestão da saúde e da segurança, substituindo a culpabilização e as punições pelo aprendizado contínuo com as falhas, tendo como princípio a melhoria do cuidado assistencial (9). Logo, este estudo teve como objetivo analisar a compreensão dos graduandos em Enfermagem de uma Universidade Pública, sobre o tema erro humano e Segurança do Paciente.
MÉTODOS
Tipo do estudo
Foi realizado um estudo com abordagem quantitativa, do tipo transversal.
Local da coleta de dados
O estudo foi desenvolvido nos departamentos de Enfermagem de Vitória e São Mateus, de uma Universidade Pública no Espírito Santo, ES, Brasil.
Período do Estudo
A coleta dos dados foi realizada por meio do Google Formulários, no período de 19 de maio de 2020 a 06 de junho de 2020.
População
Os participantes do estudo foram discentes do 5º ao 9º período, do curso de Graduação em Enfermagem de uma Universidade Pública no Espírito Santo. A população alvo foi composta de 201 estudantes, considerando a amostra necessária para 95% de confiança, 5% de erro e 50% de prevalência, a amostra mínima considerada foi de 161 estudantes. Entretanto, considerando o momento de pandemia vivenciado durante a aplicação do questionário e o modelo de aplicação on line considera-se uma taxa de 68,5% dentro do aceitável.
Critérios de seleção
Foram adotados como critérios de inclusão, discentes com idade igual ou superior a 18 anos, regularmente matriculados no curso de Graduação em Enfermagem e que de antemão tivessem cursado as disciplinas até o 4º período.
Definição da amostra
Essa escolha deve-se ao fato de que esses estudantes anteriormente entraram em contato com o ambiente profissional, durante os estágios curriculares e pesquisas de campo, bem como tiveram conhecimento prévio das bases teóricas que fundamentam a assistência de Enfermagem, ou seja, disciplinas como Semiologia e Semiotécnica em enfermagem, Farmacologia Geral, Processo de Cuidar em Saúde, entre outras. Tendo estes tanto base teórica quanto vivência para aplicação e discussão dos assuntos relacionados à Segurança do Paciente.
Instrumento para coleta dos dados
O instrumento de pesquisa foi um questionário sobre a compreensão de alunos de cursos de Graduação em Enfermagem e Medicina sobre Segurança do Paciente, construído e validado por pesquisadoras brasileiras, em 2013(19). O instrumento é estruturado com perguntas objetivas, composto por duas partes, a primeira refere-se às questões sociodemográficas (sexo, idade, procedência) e acadêmicas. A segunda, contendo 20 questões que se inter-relacionam, sendo sete de aspectos conceituais e 13 de aspectos atitudinais sobre erro humano e Segurança do Paciente.
Coleta de dados
A coleta dos dados foi realizada do Google Formulários, no período de 19 de maio de 2020 a 06 de junho de 2020. O instrumento foi enviado aos discentes por e-mail pelo Colegiado do Curso. E motivados para o preenchimento, por meio dos grupos de WhatsApp das turmas, além de postagem em rede social.
Tratamento e Análise dos dados
Posteriormente, os dados foram tabulados em planilhas do programa Microsoft Excel para Office 365 MSO. A análise estatística descritiva dos resultados foi realizada por meio de frequências absolutas e relativas, sendo apresentadas em tabelas agrupados por categorias, sendo analisados de acordo com a literatura pertinente sobre a temática. Os dados coletados foram submetidos à análise estatística descritiva, realizada pelo pacote estatístico Social Package Statistical Science Versão 22.0 (SPSS).
Aspectos éticos
O estudo recebeu parecer positivo do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade ao qual estava vinculado, sob o número 4.170.989 e CAAE número: 30537020.3.0000.5060. Foram respeitadas todas as exigências éticas e legais que regem as pesquisas com seres humanos(20).
RESULTADOS
Participaram da pesquisa 138 estudantes, houve predomínio do sexo feminino (n=127; 92,0%) e com idade entre 20 e 46 anos, com maior frequência entre 20 a 27 anos (n=125; 90,6%) e média de 24 anos (Tabela 1).
Tabela 1- Distribuição quanto à frequência absoluta e relativa das variáveis sociodemográficas - Vitória, ES, Brasil, 2021 |
||
Variáveis sociodemográficas |
Frequências |
|
n |
% |
|
Idade |
|
|
20 a 24 anos |
70 |
79,5 |
25 a 29 anos |
13 |
14,8 |
30 a 34 anos |
02 |
2,3 |
35 a 39 anos |
00 |
0,0 |
40 a 44 anos |
02 |
2,3 |
45 a 49 anos |
01 |
1,1 |
Localização do curso |
|
|
Vitória |
93 |
67,4 |
São Mateus |
45 |
32,6 |
Legenda: n - número amostrado; %: porcentagem
O período que apresentou maior participação no estudo foi o 5º período (n=41; 29,7%), seguido do 6º período (n=30; 21,7%), 7º período (n=30; 21,7%), 8º período (n=21; 15,2%), 9º período (n= 14, 10,1%) e dois graduandos desperiorizados (1,4%) cursando disciplinas do 5º ao 9º período (Tabela 2).
Ao serem questionados sobre terem um aprendizado formal sobre Segurança do Paciente, 73,2% (n=101) responderam que sim e 26,8% (n=37) responderam negativamente. Em relação ao questionamento de anteriormente ter ou não exercido atividade assistencial de nível médio, destaca-se que 84,1% (n=116) dos estudantes não tinham o curso de nível médio e 15,9% (n=22) tinham conhecimento assistencial de nível médio.
Tabela 2 - Frequências relacionando sexo dos estudantes e período do curso. Vitória, ES, Brasil, 2021 |
||||||
|
Sexo |
n |
% |
|||
Período |
Feminino |
Masculino |
||||
|
n |
% |
n |
% |
||
5º período |
38 |
29,9 |
3 |
27,3 |
41 |
29,7 |
6º período |
25 |
19,7 |
5 |
45,5 |
30 |
21,7 |
7º período |
29 |
22,8 |
1 |
9,1 |
30 |
21,7 |
8º período |
20 |
15,7 |
1 |
9,1 |
21 |
15,2 |
9º período |
13 |
10,2 |
1 |
9,1 |
14 |
10,1 |
Desperiodizado |
2 |
1,6 |
0 |
0,0 |
2 |
1,4 |
Total |
127 |
100 |
11 |
100 |
138 |
100 |
Legenda: n - número amostrado; %: percentagem
Em relação aos aspectos conceituais, pode-se observar que 63% (n=87) dos estudantes discordaram fortemente ou discordaram que cometer erros na área da saúde é inevitável. Também discordaram fortemente ou discordaram que profissionais competentes (64,5% - n=89) e estudantes comprometidos (71,0% - n=98) não cometem erros que causam danos aos pacientes. A maioria concordou fortemente ou concordou (89,9% - n=124) que na vigência de um erro, todos os envolvidos devem discutir sua ocorrência e que a partir do erro deve ser instituída uma efetiva estratégia de prevenção (94,9% - n=131) (Tabela 3).
Tabela 3 - Aspectos conceituais referentes ao erro humano e a Segurança do Paciente, segundo a compreensão dos discentes de Graduação em Enfermagem. Vitória, ES, Brasil, 2021 |
||||||
Aspectos conceituais |
CF + C |
NTO |
DF + D |
|||
n |
% |
n |
% |
n |
% |
|
1- Cometer erros na área da saúde é inevitável. |
47 |
34,1 |
4 |
2,9 |
87 |
63,0 |
2- Existe uma grande diferença entre o que os profissionais sabem, o que é certo e o que é visto no dia a dia da assistência à saúde. |
129 |
93,5 |
1 |
0,7 |
8 |
5,8 |
3- Profissionais competentes não cometem erros que causam danos aos pacientes. |
47 |
34,1 |
2 |
1,4 |
89 |
64,5 |
4- Alunos comprometidos não cometem erros que causam danos aos pacientes. |
37 |
26,8 |
3 |
2,2 |
98 |
71,0 |
5- Na vigência de um erro, todos os envolvidos (profissionais, alunos, gestores, paciente e família) devem discutir sua ocorrência. |
124 |
89,9 |
4 |
2,9 |
10 |
7,2 |
6- Para análise do erro humano, é importante saber quais as características individuais do profissional que cometeu o erro. |
102 |
73,9 |
14 |
10,1 |
22 |
15,9 |
7- Depois que um erro ocorre, uma efetiva estratégia de prevenção é trabalhar com maior cuidado. |
131 |
94,9 |
3 |
2,2 |
4 |
2,9 |
Legenda: CF – Concordo fortemente; C – Concordo; NTO – Não tenho opinião; DF – Discordo fortemente; D – Discordo |
Quanto aos aspectos atitudinais, a maioria dos graduandos concordou fortemente ou concordou (94,9% - n=131) que, para implementar medidas de prevenção de erros humanos, sempre se deve instituir uma análise sistêmica dos fatos. E, a maioria discordou fortemente ou discordou (86,2% - n=119) que sistemas para relatar a ocorrência dos erros fazem pouca diferença na redução de futuros erros. Ressalta-se que os estudantes de Enfermagem discordaram fortemente ou discordaram (99,3% - n=137) quando questionados sobre apenas os médicos poderem determinar a causa da ocorrência do erro (Tabela 4).
Tabela 4 - Aspectos atitudinais referentes ao erro humano e a Segurança do Paciente, segundo compreensão de alunos do curso de Graduação em Enfermagem. Vitória, ES, Brasil, 2021 |
|
|||||||
Aspectos atitudinais |
CF + C |
NTO |
DF + D |
|||||
n |
% |
n |
% |
n |
% |
|
||
8- Profissionais não devem tolerar trabalhar em locais que não oferecem condições adequadas para o cuidado prestado ao paciente. |
117 |
84,8 |
8 |
5,8 |
13 |
9,4 |
|
|
9- Para implementar medidas de prevenção de erros humanos, sempre se deve instituir uma análise sistêmica dos fatos. |
131 |
94,9 |
6 |
4,3 |
1 |
0,7 |
|
|
10- É necessário implementar análise sistêmica de erros na área da saúde, mas medidas preventivas precisam ser adotadas sempre que alguém for lesado. |
122 |
88,4 |
4 |
2,9 |
12 |
8,7 |
|
|
11- Sempre comunico a meu professor sobre a presença de condições no campo de estágio que favorecem a ocorrência de um erro. |
130 |
94,2 |
4 |
2,9 |
4 |
2,9 |
|
|
12- Sempre comunico ao professor/ gestor/ responsável pelo local de estágio sobre a ocorrência de um erro. |
127 |
92,0 |
6 |
4,3 |
5 |
3,6 |
|
|
13- Sempre comunico ao meu colega sobre a ocorrência do erro. |
122 |
88,4 |
5 |
3,6 |
11 |
8,0 |
|
|
14- Sempre comunico ao paciente e à sua família sobre a ocorrência do erro. |
69 |
50,0 |
22 |
15,9 |
47 |
34,1 |
|
|
15- Se não ocorre dano ao paciente, deve-se analisar se há necessidade de relatar a ocorrência do erro ao paciente e à família. |
78 |
56,5 |
22 |
15,9 |
38 |
27,5 |
|
|
16- Os professores sempre realizam medidas corretivas com o aluno para que ele não cometa novos erros. |
110 |
79,7 |
6 |
4,3 |
22 |
15,9 |
|
|
17- Sistemas para relatar a ocorrência dos erros fazem pouca diferença na redução de futuros erros. |
13 |
9,4 |
6 |
4,3 |
119 |
86,2 |
|
|
18- Apenas os médicos podem determinar a causa da ocorrência do erro. |
0 |
0,0 |
1 |
0,7 |
137 |
99,3 |
|
|
19- Sempre realizo atividades de estágio em locais que promovem boas práticas para a promoção da Segurança do Paciente. |
56 |
40,6 |
22 |
15,9 |
60 |
43,5 |
|
|
20- Sempre que identifico situações que necessitam de melhorias, recebo apoio da instituição para implementação de medidas que promovam práticas seguras. |
34 |
24,6 |
33 |
23,9 |
71 |
51,4 |
|
|
Legenda: CF – Concordo fortemente; C – Concordo; NTO – Não tenho opinião; DF – Discordo fortemente; D – Discordo |
|
|||||||
DISCUSSÃO
A percepção de que errar é humano na área da saúde surgiu a partir da publicação do relatório To err is human: building a safer health system, em 1999, por meio do Instituto de Medicina dos EUA(2). Nesse documento, foi possível mensurar que os eventos adversos matavam mais que os acidentes automobilísticos, câncer de mama e Síndrome da Imunodeficiência Adquirida. Ao analisar as respostas dos acadêmicos para o questionamento de que cometer erros na área da saúde é inevitável, a maioria discordou ou discordou fortemente. Um estudo realizado, em 2018(21), apontou que 73,8% dos graduandos em Enfermagem também discordaram.
Esses dados apontam para a possibilidade dos acadêmicos compreenderem que as estratégias de prevenção dos erros na área da saúde são suficientes para não ocorrência dos incidentes. Isso porque a maior parte dos estudantes discordou das afirmativas que profissionais competentes e alunos comprometidos não cometem erros que causam danos aos pacientes e acreditam que depois que um erro ocorre, uma efetiva estratégia de prevenção é trabalhar com maior cuidado. Os autores sugerem que ainda há um desconhecimento sobre as estratégias sistematizadas utilizadas nas instituições de saúde acerca da prevenção de novos eventos. Contudo, sabe-se que trabalhar com zelo, cuidado e atenção não são suficientes para evitar o erro(21). Há de se destacar que a conscientização de que os erros são acompanhantes inevitáveis da condição humana, mesmo em profissionais capacitados, talvez seja o primeiro e mais importante passo para o início das mudanças necessárias(19).
Quando questionados sobre a diferença entre o que os profissionais sabem, o que é certo e o que é visto no dia a dia da assistência à saúde, os estudantes, em sua maioria, concordaram ou concordaram fortemente que existe diferença, esse achado também foi identificado no estudo de Yoshikawa et al.(19) no qual 91,6% dos estudantes concordaram com essa afirmativa. Um estudo(22), realizado em 2020, evidenciou que os profissionais reconhecem a importância da Segurança do Paciente, no entanto, presenciou o descompasso entre a teoria e a prática. As regras básicas nem sempre são seguidas pelos profissionais, incorrendo em riscos para a segurança da assistência quando importantes barreiras de segurança não são lembradas ou são ignoradas(23). Cabe ressaltar que os alunos seguem modelos vivenciados a partir da observação das atitudes dos profissionais de saúde que são atuantes, durante o processo de aprendizado assistencial, bem como dos docentes nos laboratórios e cenários de prática, as atitudes desses profissionais influenciam na formação acadêmica(24).
Quanto à discussão do erro por todos os envolvidos (profissionais, alunos, gestores, paciente e família), a grande maioria dos estudantes concordou fortemente ou concordou, assim como em outros estudos(25-26) que ressaltam a importância de que envolver os alunos nas análises de causa-raiz dos problemas de segurança pode melhorar sua percepção e capacidade de prever problemas e riscos de segurança. Isso pode ser feito por meio de análises abrangentes de estudos de caso dentro do cenário teórico ou em situações da vida real na prática assistencial. Idealmente, esses exercícios apoiariam os alunos em sua capacidade de não apenas reconhecer problemas de segurança, mas também de identificar estratégias para gerenciar os riscos ou problemas de segurança.
Nessa perspectiva, é relevante considerar que a notificação dos eventos relacionadas à assistência à saúde e demais ocorrências é uma das estratégias utilizadas para que os profissionais relatem os incidentes, essas informações fornecem subsídios para a avaliação dos serviços, formulação de estratégias preventivas e o fortalecimento da cultura de segurança, bem como a prevenção de danos para a saúde do paciente(27). Sobre a prática de notificação, identificou-se que 86,2% dos estudantes discordaram que os sistemas para relatar a ocorrência dos erros fazem pouca diferença na redução de futuros erros. Este resultado remete a importância da sensibilização e educação sobre a prática das notificações.
Além disso, o desenvolvimento de uma cultura de segurança exige o envolvimento e a participação de todos os profissionais, que devem reconhecer os benefícios de evitar que o erro notificado ocorra com outros pacientes, garantindo melhor qualidade e segurança assistencial(28).
Outro aspecto observado neste estudo foi que a maioria dos estudantes concorda ou concorda fortemente que profissionais não devem tolerar trabalhar em locais que não oferecem condições adequadas para o cuidado prestado ao paciente, assim como prevê a legislação em seu artigo nº 36 da Resolução 63/2011(29), o serviço de saúde deve manter as instalações físicas dos ambientes externos e internos em boas condições de conservação, segurança, organização, conforto e limpeza. Em conformidade com essa orientação a Carta dos Direitos e Deveres da Pessoa Usuária da Saúde(30) orienta que toda pessoa tem o direito ao atendimento inclusivo, humanizado e acolhedor, realizado por profissionais qualificados, em ambiente limpo, confortável e acessível. Além disso, o Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem(31) assegura aos profissionais de Enfermagem a possibilidade de suspender as atividades, individuais ou coletivas, quando o local de trabalho não oferecer condições seguras para o exercício profissional e/ou desrespeitar a legislação vigente, ressalvadas as situações de urgência e emergência, devendo formalizar, imediatamente, sua decisão por escrito e/ou por meio de correio eletrônico à instituição e ao Conselho Regional de Enfermagem.
A equipe de Enfermagem sofre com condições laborais inadequadas que são evidentes em diversos serviços da saúde, repercutindo em sobrecarga de trabalho, esforço físico em excesso que levam a maior exposição aos riscos ocupacionais presentes no ambiente de trabalho(32). Além disso, a estrutura física, as instalações impróprias, a falta de recursos materiais, a ausência de qualidade dos materiais utilizados e os recursos humanos insuficientes se caracterizam como desafios a serem superados para se alcançar uma prática segura nos cuidados em saúde(33). Moraes e Aguiar apontam que os recursos físicos e humanos deficitários são elementos que podem interferir na qualidade da assistência e contribuir para a ocorrência de falhas no processo de trabalho(34).
Assim como na pesquisa dos autores(34) em que quase a totalidade dos envolvidos concorda ou concorda fortemente que para implementar medidas de prevenção de erros humanos, sempre se deve instituir uma análise sistêmica dos fatos, os autores(35) mostrou que o erro dos outros ou situações em que o paciente foi exposto a riscos faziam os estudantes de Enfermagem pensarem na Segurança do Paciente, evidenciando em seus relatos que o erro não pode ser analisado de forma individual, mas de maneira sistêmica. Enfatizam que a prevenção da ocorrência de erros no cuidado à saúde não está associada apenas à mudança de conduta de profissionais, pois o mesmo é desenvolvido em ambientes dinâmicos e especializados nos quais ocorrem interações complexas.
Logo, é necessário implementar análise sistêmica de erros na área da saúde, mas medidas preventivas precisam ser adotadas sempre que alguém for lesado, fato este reafirmado pela Resolução nº 63 de 2011(29) que traz no artigo 18 o seguinte: O serviço de saúde deve estabelecer estratégias e ações voltadas para a Segurança do Paciente, tais como: “III. Ações de prevenção e controle de eventos adversos relacionadas à assistência à saúde”.
Ainda há grande divergência no que se refere a comunicar ao paciente e à sua família sobre a ocorrência do erro, seja ele danoso ou não, questão também observada por autores, em 2018(1-2), mas sabe-se que é dever do profissional comunicar o erro ao paciente e assumir sua parcela de responsabilidade em sua ocorrência, a fim de repará-lo do ponto de vista físico e moral. Além disso, permite a análise do risco e propostas de melhorias são realizadas a partir da participação da equipe multidisciplinar envolvida(36). Evidencia-se que é fundamental que questões que envolvam a comunicação, bem como a comunicação de notícias difíceis passem a ser melhor exploradas na formação acadêmica, uma vez que a frágil formação desencadeia dúvidas e receios nos profissionais que por consequência comunicam-se com fragilidade ou com ineficácia(37).
Quanto à questão de que apenas os médicos podem determinar a causa da ocorrência do erro, a maioria dos alunos discordou ou discordou fortemente. Os autores(6), apontaram que o projeto pedagógico de ensino sobre Segurança do Paciente desenvolvido nas diversas categorias de saúde deve passar de um modelo individualizado para um modelo unificado com abordagem interdisciplinar, a fim de capacitar os futuros profissionais para o reconhecimento e a habilidade de prevenção de erros e eventos, bem como para alertar outros profissionais quanto a situações de risco para o paciente, servindo como estratégia para a ação multidisciplinar na elucidação das causas do erro e resolução das mesmas.
Acredita-se que para resultados mais precisos sejam realizadas novas pesquisas com avaliação multicêntrica, a fim de integrar diferentes percepções levando em conta as diferentes realidades entre profissões, regiões do país e a dicotomia entre sistema público e privado. Além de ser relevante realizar estudos qualitativos para melhor aprofundamento da temática.
Limitações do Estudo
Este estudo apresentou como uma possível limitação à realização da coleta de dados por via online, uma vez que foi desenvolvido durante a pandemia da COVID-19, o que impossibilitou a coleta presencial. Todavia, o fato de ser enviado aos discentes por e-mail e motivados para o preenchimento, por meio dos grupos de WhatsApp das turmas, além de divulgação através de postagem em rede social, pode ter sido um facilitador, visto que alcançou o percentual de respondentes de 68,7% do total de 201 acadêmicos.
Contribuições para a Prática
Os resultados desta pesquisa serão utilizados para complementar a discussão sobre a temática no meio acadêmico. O entendimento sobre a compreensão dos graduandos de Enfermagem sobre erro humano e Segurança do Paciente, auxiliará para orientar melhorias educacionais e oferecer sugestões para direcionar o ensino aos educadores do referido curso.
CONCLUSÕES
O estudo demonstrou que os estudantes possuem entendimentos sobre erro humano e Segurança do Paciente. Reconhecem e valorizam a discussão do erro após a sua ocorrência por todos os envolvidos e acreditando que bons profissionais e estudantes cometem erros, demonstrando conhecimento adquirido no aprendizado sobre erro humano.
Revela-se que os participantes carecem da conscientização de que errar é humano. Desse modo, é factível e necessário reconhecer que os erros existem na assistência e que precisam ser evidenciados e dialogados. Sendo assim, torna-se indispensável fomentar sobre o tema e desenvolver no percurso da graduação a cultura da Segurança do Paciente, com o entendimento de que o erro pode gerar ações de melhoria desde que estes recebam tratativas adequadas.
Por fim, aponta-se a importância da inclusão do tema Segurança do Paciente na formação dos profissionais, propiciando um ambiente de discussão do assunto, de forma a modificar a percepção dos futuros profissionais, não apenas sobre o erro, bem como sobre as medidas de cuidado e segurança que um evento possa gerar.
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Contribuição dos autores
Monalizza de Souza Carvalho Calazans: concepção e/ou no desenho do estudo, coleta, análise e interpretação dos dados assim como na redação e/ou revisão crítica do manuscrito.
Júlia Valéria de Oliveira Vargas Bitencourt: concepção e/ou no desenho do estudo, coleta, análise e interpretação dos dados assim como na redação e/ou revisão crítica do manuscrito.
Eliane de Fátima Almeida Lima: aprovação final da versão a ser publicada.
Flávia Batista Portugal: concepção e/ou no desenho do estudo, coleta, análise e interpretação dos dados assim como na redação e/ou revisão crítica do manuscrito
Editor Científico: Francisco Mayron Morais Soares. Orcid: https://orcid.org/0000-0001-7316-2519
Editor Associado: Edirlei Machado dos-Santos. Orcid: https://orcid.org/0000-0002-1221-0377