FATORES ASSOCIADOS ÀS PRÁTICAS DE LAZER DE IDOSOS NA PANDEMIA DA COVID-19
FACTORS ASSOCIATED WITH LEISURE PRACTICES OF OLDER ADULTS DURING THE COVID-19 PANDEMIC
FACTORES ASOCIADOS A LAS PRÁCTICAS DE OCIO DE LOS ADULTOS MAYORES DURANTE LA PANDEMIA DE COVID-19
1Adriana Drummond de Aguiar
2Caroline Rodrigues Thomes
3Jéssica Giovani da Silva
4Maria Helena Monteiro de Barros Miotto
1Doutoranda em Saúde Coletiva pela Universidade Federal do Espírito Santo. Vitória, Espírito Santo, Brasil. ORCID: 0000-0002-2305-4218.
2Mestranda em Saúde Coletiva pela Universidade Federal do Espírito Santo. Vitória, Espírito Santo, Brasil. ORCID: 0000-0003-3522-5368.
3Mestre em Ciências Odontológicas pelo Programa de Pós-Graduação em Ciências Odontológicas da Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, ES, Brasil. ORCID: 0000-0002-3579-1514.
4Professora Titular da Universidade Federal do Espírito Santo no Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva. Vitória, Espírito Santo, Brasil. ORCID: 0000-0002-3227-7608.
Autor correspondente
Adriana Drummond de Aguiar
Universidade Federal do Espírito Santo - Avenida Marechal Campos, 1468, Bonfim, Vitória, ES, Brasil. CEP: 29047-105. E-mail: adrianadrumond73@gmail.com
Fomento e Agradecimento: A pesquisa não recebeu financiamento.
Declaração de conflito de interesses: Nada a declarar.
Submissão: 25-09-2023
Aprovado: 16-10-2023
RESUMO
Objetivo:
O objetivo do presente estudo foi analisar a associação entre práticas de
lazer, variáveis sociodemográficas, ansiedade e qualidade de vida na população
idosa em tempos de pandemia da COVID-19. Método: Participaram 345
indivíduos acima de 60 anos. Foram aplicados roteiros estruturados, dentre
eles, a Escala de Práticas de Lazer. Utilizou-se modelo de regressão logística
para controle de potenciais fatores de confusão. Resultados:
Evidenciou-se associação das práticas de lazer com as variáveis: raça
(p=0,023), escolaridade (p=<0,001), condição socioeconômica (p=0,001),
ansiedade (p=<0,001), qualidade de vida física (p=<0,001) e qualidade de
vida mental (p=<0,001). Conclusão: Conclui-se que homens idosos, com
até 10 anos de estudo, com características de Transtorno de Ansiedade
Generalizada e baixa qualidade de vida física estão associados a menores
práticas de lazer. Os achados evidenciam que as iniquidades sociais podem
interferir nas atividades de lazer e consequentemente no bem-estar desta
população.
Palavras-chave: Atividades de
Lazer; COVID-19; Idoso; Envelhecimento.
ABSTRACT
Objective: The aim of the
present study was to analyze the association between leisure practices,
sociodemographic variables, anxiety, and quality of life in the elderly
population during the COVID-19 pandemic. Method: 345 individuals aged 60
and above participated. Structured questionnaires were administered, including
the Leisure Practices Scale. A logistic regression model was used to control
for potential confounding factors. Results: An association of leisure
practices with the variables was evidenced: race (p=0.023), education
(p=<0.001), socioeconomic status (p=0.001), anxiety (p=<0.001), physical
quality of life (p=<0.001), and mental quality of life (p=<0.001). Conclusion:
It is concluded that elderly men, with up to 10 years of education, exhibiting
characteristics of Generalized Anxiety Disorder and poor physical quality of
life, are associated with lower engagement in leisure practices. The findings
highlight that social inequalities can interfere with leisure activities and,
consequently, the well-being of this population.
Keywords: Leisure Activities; COVID-19; Elderly; Aging.
RESUMEN
Objetivo: El objetivo del presente estudio fue analizar la asociación entre prácticas de ocio, variables sociodemográficas, ansiedad y calidad de vida en la población anciana durante la pandemia de COVID-19. Método: Participaron 345 individuos de 60 años o más. Se administraron cuestionarios estructurados, incluida la Escala de Prácticas de Ocio. Se utilizó un modelo de regresión logística para controlar posibles factores de confusión. Resultados: Se evidenció una asociación de las prácticas de ocio con las variables: raza (p=0,023), educación (p=<0,001), nivel socioeconómico (p=0,001), ansiedad (p=<0,001), calidad de vida física (p=<0,001) y calidad de vida mental (p=<0,001). Conclusión: Se concluye que los hombres ancianos, con hasta 10 años de educación, que presentan características de Trastorno de Ansiedad Generalizada y una baja calidad de vida física, están asociadas con una menor participación en actividades de ocio. Estos hallazgos destacan que las desigualdades sociales pueden interferir en las prácticas de ocio y, en consecuencia, en el bienestar de esta población.
Palabras clave: Actividades Recreativas; COVID-19; Anciano; Envejecimiento.
INTRODUÇÃO
Compreende-se o envelhecimento como um fenômeno biopsicossocial que atinge o homem e sua existência na sociedade, manifestando-se em todos os domínios da vida, logo tem sido instrumento de análise em diversos estudos, em virtude de sua complexidade, que envolvem alterações nas dimensões biológica, sociológica e psicológica.1
A pandemia da COVID-19 impactou diversas esferas de cuidado em meio a diferentes populações, inúmeras atividades do dia a dia foram privadas, e com isso grandes impactos estão sendo passíveis de constatação. Nesta premissa, atividades cotidianas de lazer foram interrompidas, na tentativa de se evitar a desenfreada propagação viral.2 Com o envelhecimento, consequentemente os idosos se enquadraram no grupo de maior risco para contrair a doença de forma grave e letal, logo, por recomendação governamental houve privação de atividades sociais principalmente para indivíduos que compõem essa população.2,3
Embora preventivo e para se evitar aumento da taxa de mortalidade nessa população, ocorreram ainda consequências resultantes da limitação de se manter uma vida ativa, com práticas de atividade física e lazer, levando a uma série de danos à qualidade de vida, nas esferas física e psíquica, pelo aumento do comportamento sedentário e momentos de solidão de familiares e amigos.4
Nessa esfera de promover bem-estar, é sabido que o exercício físico pode ser usado no sentido de retardar e, até mesmo, atenuar o processo de declínio das funções biológicas e neurológicas que são observadas com o envelhecimento, pois promovem melhoras na capacidade respiratória, cardíaca, força muscular, na memória, na cognição e nas habilidades sociais, promovendo melhorias na qualidade de vida e aumento na longevidade.4 Vale ressaltar que, o conjunto de práticas consideradas de lazer não se restringe apenas a atividades ativas e de movimentação corporal, mas sim tudo aquilo que foge à obrigatoriedade de tarefas cotidianas e promovem bem-estar geral e mental. Dentro dessa esfera, temos os momentos de lazer por contemplação, as rodas de conversas, as atividades turísticas, os momentos de leitura assim como, o acesso a ambientes virtuais que incentivam jogos, vídeos e conteúdos musicais.3
Sendo assim, este estudo se propôs analisar a associação entre práticas de lazer, variáveis sociodemográficas, ansiedade e qualidade de vida na população idosa em tempos de pandemia da COVID-19.
MÉTODOS
Trata-se de um estudo observacional analítico com delineamento transversal, realizado em uma capital da região sudeste do Brasil, nos quatro Centros de Convivência da Terceira Idade (CCTI’s). Os CCTI’s são equipamentos do Serviço de Convivência e Fortalecimentos de Vínculos, que integram a rede de serviços previstos na Política Nacional de Assistência Social, com o objetivo, por meio de suas atividades, de oferecer espaços de convivências favorecendo o envelhecimento saudável, qualidade de vida e fortalecimento de vínculos sociais.
A amostra foi constituída por 345 idosos, frequentadores dos CCTI´s. Foi realizado cálculo amostral com base no número total de idosos dos CCTI’s, tendo margem de erro 0.05, estimativa de proporção de 0.5 para maximizar a amostra e acréscimo de 10% para possíveis perdas, dando uma amostra mínima de 326 idosos. Os participantes da pesquisa receberam convite para as entrevistas durante as atividades ofertadas, com explanação dos objetivos do estudo e esclarecimento de dúvidas. Os critérios de inclusão foram idosos de ambos os sexos, cadastrados nos CCTI’s. Foram excluídos aqueles que, por motivos de saúde ou cognição, não conseguiram responder às perguntas da entrevista. Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre Esclarecido-TCLE, de acordo com a Resolução n° 466/12, do Conselho Nacional de Saúde (CNS), após aprovação pela Comissão de Pesquisa da Secretaria Municipal de Assistência Social bem como do Comitê de Ética em Pesquisa do Centro de Ciências da Saúde, da Universidade Federal do Espírito Santo (25 de março de 2022, CAAE nº 56471422.1.0000.5060).
A coleta de dados ocorreu de junho a dezembro de 2022, com aplicação de roteiros estruturados, tendo como variavéis: sexo; idade/faixa etária; estado civil; escolaridade; ocupação; raça/cor autorreferida (sendo que a categoria “não branca” agrega raça/cor preta, parda, indígena e amarela); condição socioeconômica (CSE) de acordo com o critério Brasil – ABEP (BRASIL, 2022); ansiedade, que foi analisada por meio do Inventário de Ansiedade Geriátrica (IAG), uma escala traduzida por Martiny et al. (2011) e validada no Brasil,5 efetiva em distinguir indivíduos sem e com características de Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG), categorizada em “sem TAG” e “com TAG”; e qualidade de vida (QV) analisada por meio do 36-Item Short-Form Health Survey (SF-36),6 apresentando as dimensões Physical Component Summary (PCS) e Mental Component Summary (MCS) da qualidade de vida, que foram dicotomizadas abaixo da média e acima da média.
Para análise de lazer dos indivíduos utilizou-se a Escala de Práticas de Lazer (EPL), instrumento que apresenta índices de validade de conteúdo (clareza e linguagem=0,883; pertinência prática=0,879), reprodutibilidade (p>0,005) e consistência interna (Alpha de Cronbach=0,72) adequados.7 Trata-se de uma escala do tipo Likert, com 11 opções de respostas, variando de 0 (zero) a 10 (dez), com o zero representando atividades que a pessoa nunca realiza e o dez representando as atividades que a pessoa sempre realiza.7 As atividades de lazer avaliadas são divididas em 8 tipos, a saber: atividades artísticas (como ir ao cinema, teatro, shows musicais, participar de grupos de coral, entre outros); atividades manuais (como jardinagem, cozinhar, fazer artesanato, marcenaria, entre outros); atividades físicas/esportivas (como ir à academia, jogar bola, caminhadas, entre outros); atividades intelectuais (como participar de cursos, ler, ouvir ou compor músicas, entre outros); atividades sociais (como ir à igreja, sair com amigos, ir às festas, visitar familiares, entre outros); atividades turísticas (como viajar, participar de excursões, realizar passeios, entre outros); atividades virtuais (como navegar na internet, usar redes sociais, jogar videogame); atividades de contemplação/ócio (como apreciar a natureza, o pôr do sol, meditar, entre outros).7 As pontuações variam de 0 a 80 e classificou-se como “mais lazer” aqueles que obtiveram pontuações acima da mediana.
A associação entre práticas de lazer e as variáveis sociodemográficas foi realizada pelo teste de Mann & Whitney, e as variáveis ansiedade e QV (PCS e MCS) por meio do Teste Exato de Fisher. O teste de Kolmogorov & Smirnov verificou se a distribuição de probabilidade é normal. Para verificar a força de associação foi calculado o Odds Ratio (OR), com intervalo de confiança de 95% (IC95%). Utilizou-se modelo de regressão logística para controle de potenciais fatores de confusão. O nível de significância adotado foi de 5%. As análises estatísticas foram realizadas no IBM SPSS Statistics version 24.
RESULTADOS
A pesquisa apresentou amostra final composta de 345 idosos com questionários válidos, superando o cálculo amostral que previa amostra mínima de 326 idosos, frequentadores dos quatro CCTI’s.
O perfil demográfico da população estudada registra expressivamente participação feminina (91,3%), faixa etária entre 70 – 79 anos (48,4%), estado civil casado (33,9 %), raça branca (48,4%), ensino médio completo/superior incompleto, (31,5%), aposentado/pensionista (87,8%), renda de até 1.212,00 reais (salário mínimo vigente à época) (22,2 %), pertencentes às classes D-E (33,3%), residentes em apartamento (69,8 %), morando sozinhos (32,5%), com acesso ao computador (52,5%), e acesso à internet em mais de um local (54,8%), conhecimento básico em informática (51,9%) e tendo como o principal meio de informação a televisão (80,3%).
A Tabela 1 apresenta a associação entre práticas de lazer, variáveis sociodemográficas, ansiedade e qualidade de vida dos idosos atendidos nos Centros de Convivência. As variáveis que mostraram associação com as práticas de lazer foram: raça (p=0,023), escolaridade (p=<0,001), CSE (p=0,001), ansiedade (p=<0,001), QV física (p=<0,001) e QV mental (p=<0,001).
Tabela 1 - Associação entre práticas de lazer, variáveis sociodemográficas, ansiedade e qualidade de vida dos idosos atendidos nos Centros de Convivência de uma capital da região sudeste do Brasil, 2022.
Variáveis |
Práticas de Lazer |
p |
ODD |
||||
Menos Lazer |
Mais Lazer |
Intervalo Confiança |
|||||
nº |
% |
nº |
% |
LI |
LS |
||
Sexo |
|
|
|
|
|
|
|
Masculino |
19 |
63,3 |
11 |
36,7 |
0,093 |
1,806 |
|
Feminino |
154 |
48,9 |
161 |
51,1 |
0,832 |
3,919 |
|
Faixa etária |
|
|
|
|
|
|
|
Até 69 anos |
56 |
47,1 |
63 |
52,9 |
0,236 |
1,208 |
|
70 anos ou mais |
117 |
51,8 |
109 |
48,2 |
0,774 |
1,884 |
|
Status conjugal |
|
|
|
|
|
|
|
Sem companheiro |
116 |
52,7 |
104 |
47,3 |
0,123 |
1,331 |
|
Com companheiro |
57 |
45,6 |
68 |
54,4 |
0,857 |
2,067 |
|
Raça |
|
|
|
|
|
|
|
Branco |
74 |
44,3 |
93 |
55,7 |
0,023 |
1,575 |
|
Não branco |
99 |
55,6 |
79 |
44,4 |
1,030 |
2,409 |
|
Escolaridade |
|
|
|
|
|
|
|
Até 10 anos estudo |
85 |
65,9 |
44 |
34,1 |
<0,001 |
2,810 |
|
Acima 10 anos estudo |
88 |
40,7 |
128 |
59,3 |
1,784 |
4,425 |
|
CSE |
|
|
|
|
|
|
|
AB |
23 |
32,4 |
48 |
67,6 |
0,001 |
2,525 |
|
CDE |
150 |
54,7 |
124 |
45,3 |
1,455 |
4,380 |
|
Ansiedade |
|
|
|
|
|
|
|
Sem TAG |
125 |
44,0 |
159 |
56,0 |
<0,001 |
4,697 |
|
Com TAG |
48 |
78,7 |
13 |
21,3 |
2,437 |
9,051 |
|
Qualidade vida - PCS |
|
|
|
|
|
|
|
Abaixo da média |
41 |
83,7 |
8 |
16,3 |
<0,001 |
6,367 |
|
Acima da média |
132 |
44,6 |
164 |
55,4 |
2,886 |
14,050 |
|
Qualidade vida - MCS |
|
|
|
|
|
|
|
Abaixo da média |
37 |
82,2 |
8 |
17,8 |
<0,001 |
5,577 |
|
Acima da média |
136 |
45,3 |
164 |
54,7 |
2,513 |
12,379 |
*CSE: Condição Socioeconômica; *TAG: Transtorno de ansiedade generalizada; *PCS: Physical Component Summary *MCS: Mental Component Summary.
Desta forma, idosos da raça “não branca”, com até 10 anos de estudo, pertencentes à CSE C/D-E, com características de TAG e QV (física e mental) abaixo da média estão associados a menores práticas de lazer.
Na tabela 2, o pseudo-R² que é a porcentagem de variação na variável de desfecho que é explicada pelo modelo foi de 22,0%. Existe pelo menos uma variável independente com valor preditivo sobre o desfecho pelo teste de Omnibus (p < 0,001) e o teste de Hosmer e Lemeshow não rejeitou a hipótese (p = 0,791) de que os valores previstos pelo modelo não diferem dos observados, ou seja, há um bom ajuste.
Um idoso do sexo feminino tem 2,8 vezes mais chances de ter mais prática de lazer em comparação a um idoso do sexo masculino. Já quem tem acima de 10 anos de estudo tem estas chances aumentadas em comparação a quem tem até 10 anos de estudo em 2,3 vezes. O idoso da CSE AB tem estas chances aumentadas em 2,0 vezes em relação a quem é da CSE C/D-E. Idoso sem características de TAG tem 5,0 vezes mais chances de ter mais lazer do que o idoso com características de TAG. E aquele com qualidade de vida física (PCS) acima da média tem estas chances aumentadas em 2,6 vezes em relação ao que tem qualidade de vida física (PCS) abaixo da média (Tabela 2).
Tabela 2 - Resultado regressão logística das práticas de lazer de idosos atendidos nos Centros de Convivência de uma capital da região sudeste do Brasil, 2022 (Análise Multivariada).
Variável dependente - Práticas de lazer (Mais lazer) |
Valor p* |
OR |
IC de 95% para OR |
||
Limite inferior |
Limite superior |
||||
Sexo |
Masculino |
- |
1 |
- |
- |
Feminino |
0,016 |
2,808 |
1,209 |
6,524 |
|
Escolaridade |
Até 10 anos estudo |
- |
1 |
- |
- |
Acima 10 anos estudo |
0,001 |
2,327 |
1,409 |
3,844 |
|
Condição socioeconômica |
AB |
0,031 |
1,977 |
1,066 |
3,670 |
CDE |
- |
1 |
- |
- |
|
Ansiedade |
Sem TAG |
< 0,001 |
4,989 |
2,496 |
9,973 |
Com TAG |
- |
1 |
- |
- |
|
Qualidade de vida - PCS |
Abaixo da média |
- |
1 |
- |
- |
Acima da média |
0,009 |
2,620 |
1,267 |
5,416 |
|
Teste de Omnibus = χ² (62,27); p < 0,001 |
|
|
|
|
|
Teste de Hosmer-Lemshow = χ² (2,40); p = 0,791 |
|||||
Pseudo-R² = 22,0% |
|
|
|
|
(*) Regressão logística múltipla com método forward; OR - Odds Ratio; (1) categoria de referência; significativo se p ≤ 0,050
Variáveis inseridas no modelo: Sexo, faixa etária, estado civil, raça, escolaridade, condição socioeconômica, ansiedade, qualidade de vida PCS, qualidade de vida MCS
PCS - Physical Component Summary; MCS - Mental Component Summary
A tabela 3 apresenta a associação entre os domínios da EPL e a variável sexo dos idosos. As mulheres realizaram mais atividades manuais (p=0,001) e nos demais domínios, não foram identificadas diferenças significativas entre os sexos.
Tabela 3 - Relação entre os domínios das práticas de lazer e a variável sexo de idosos atendidos nos Centros de Convivência de uma capital da região sudeste do Brasil, 2022.
Domínios |
Masculino |
Feminino |
Valor p* |
||
Mediana |
Ranking |
Mediana |
Ranking |
||
Artísticos |
5 |
170,97 |
5 |
173,19 |
0,905 |
Manuais |
4 |
113,27 |
9 |
178,69 |
< 0,001 |
Físicos/Esportivos |
9 |
158,62 |
9 |
174,37 |
0,393 |
Intelectuais |
9 |
195,65 |
8 |
170,84 |
0,183 |
Sociais |
9 |
170,22 |
9 |
173,27 |
0,866 |
Turísticas |
8 |
169,18 |
8 |
173,36 |
0,822 |
Virtuais |
5 |
162,92 |
5 |
173,96 |
0,556 |
Contemplação/Ócio |
9 |
175,07 |
8 |
172,80 |
0,903 |
(*) Teste de Mann-Whitney; significativo se p ≤ 0,050
No que tange à associação entre os domínios da EPL e nível de escolaridade (Tabela 4), todos os domínios foram significativos entre as escolaridades, com exceção dos “manuais e sociais”, portanto, para estes, os escores medianos da prática de lazer foram considerados
similares. Já nos demais domínios “artísticos, físicos/esportivos, intelectuais, turísticas, virtuais e contemplação/ócio”, todos os escores medianos foram maiores para a escolaridade de mais de 10 anos de estudo em comparação a quem tem até 10 anos de estudo.
Tabela 4 - Relação entre os domínios das práticas de lazer e nível de escolaridade etária de idosos atendidos nos Centros de Convivência de uma capital da região sudeste do Brasil, 2022.
Domínios |
Até 10 anos estudo |
Mais 10 anos estudo |
Valor p* |
||
Mediana |
Ranking |
Mediana |
Ranking |
||
Artísticos |
3 |
154,14 |
5 |
184,26 |
0,006 |
Manuais |
8 |
176,42 |
8 |
170,96 |
0,611 |
Físicos/Esportivos |
7 |
148,29 |
9 |
187,76 |
< 0,001 |
Intelectuais |
6 |
142,51 |
8 |
191,21 |
< 0,001 |
Sociais |
9 |
163,54 |
9 |
178,65 |
0,150 |
Turísticas |
6 |
141,43 |
9 |
191,85 |
< 0,001 |
Virtuais |
2 |
127,77 |
7 |
200,01 |
< 0,001 |
Contemplação/Ócio |
8 |
156,57 |
9 |
182,81 |
0,015 |
(*) Teste de Mann-Whitney; significativo se p ≤ 0,050
A associação entre os domínios da EPL e a CSE evidencia que todos os domínios foram significativos, com exceção dos “sociais”, logo o escore mediano da prática de lazer deste foi similar entre as condições. Já os domínios “artísticos, físicos/esportivos, intelectuais,
turísticas, virtuais e contemplação/ócio”, todos os escores medianos foram maiores para a CSE AB em comparação a CSE C/D-E, mas no domínio “manuais” ocorreu o contrário, ou seja, a prática de lazer deste domínio foi maior em escore mediano para a CSE C/D-E (Tabela 5).
Tabela 5 - Relação entre os domínios das práticas de lazer e condição socioeconômica de idosos atendidos nos Centros de Convivência de uma capital da região sudeste do Brasil, 2022.
Domínios |
AB |
CDE |
Valor p* |
||
Mediana |
Ranking |
Mediana |
Ranking |
||
Artísticos |
6 |
193,42 |
5 |
167,71 |
0,048 |
Manuais |
7 |
143,87 |
9 |
180,55 |
0,004 |
Físicos/Esportivos |
9 |
197,65 |
8 |
166,61 |
0,016 |
Intelectuais |
9 |
203,28 |
8 |
165,15 |
0,003 |
Sociais |
10 |
187,98 |
9 |
169,12 |
0,133 |
Turísticas |
10 |
213,48 |
8 |
162,51 |
< 0,001 |
Virtuais |
7 |
201,31 |
5 |
165,66 |
0,006 |
Contemplação/Ócio |
9 |
196,70 |
8 |
166,86 |
0,021 |
(*) Teste de Mann-Whitney; significativo se p ≤ 0,050
DISCUSSÃO
O lazer é definido como um conjunto de práticas nas quais ocorre o envolvimento de forma espontânea e desinteressada após afazeres sociais. O entendimento sob o enfoque da psicologia e do comportamento, o lazer é caracterizado como uma necessidade humana e cultural, compreendendo tempos disponíveis. 1,7,8 As razões que movem um indivíduo a praticar regularmente atividades de lazer são fortemente delineadas com base nas atitudes e valores pessoais,1,7 significativamente afetadas pela presença do coronavírus, no contexto das restrições de atividades cotidianas.2
A coleta de dados do presente estudo ocorreu em um período pandêmico e com uma população de risco para a COVID-19, as mudanças provenientes do isolamento social podem ter afetado diretamente a adesão às atividades ofertadas nos CCTI’s, pois em março de 2018 a população de frequentadores dos quatro centros de convivência do município compreendia 2.416 idosos, enquanto que em maio de 2022 perfazia o total de 1.284 pessoas.9 Fatores como o medo de contrair a COVID-19, as possíveis sequelas da doença como problemas respiratórios graves, fadiga, depressão (devido ao medo de morrer) e até mesmo óbitos, também podem ter contribuído com a diminuição acentuada de idosos nas atividades de lazer dos locais do estudo.
É perceptível no estudo uma associação positiva entre práticas reduzidas de lazer em meio à indivíduos com CSE menos favorecidas, baixa escolaridade, características de TAG e qualidade de vida física abaixo da média, durante a pandemia da COVID-19. São dados relevantes e preocupantes, uma vez que a atividade física tem sido apontada como recurso indispensável para reduzir a degeneração provocada pelo envelhecimento, bem como possibilitar ao idoso manter uma qualidade de vida ativa.1,7,10
Boas condições de saúde física têm um efeito direto e significativo sobre a diminuição da angústia e estão relacionadas a altos níveis de integração social e de autoestima. Logo, evidencia-se a importância da atividade física regular para a população idosa, pois ela é fator crucial na determinação das condições que promovem o aumento de sua capacidade geral de adaptação em todas as suas esferas. Em adição a isso, contribui no combate aos efeitos de condições sociais e pessoais que tendem a gerar mudanças no senso de controle, na atividade e no envolvimento, como a aposentadoria, o desemprego e a diminuição da capacidade física ativa, sendo de extrema importância para os idosos no momento de enfrentamento à pandemia da COVID-19. 7,10,11
Além disso, obteve-se ainda, evidência neste estudo de que idosos pertencentes às classes menos favorecidas, realizaram mais atividades manuais, ao passo que pertencentes a classes mais favorecidas eram praticantes mais assíduos de atividades físicas, intelectuais, turísticas, de contemplação e apreciação. Os estudos estabelecendo relações entre a CSE e a adoção de práticas de atividades no lazer ainda são escassos na literatura, prevalecendo a premissa de que as variações no poder aquisitivo modulam o maior ou menor engajamento de hábitos de lazer.2,7,11
Em relação às práticas manuais, este estudo encontrou uma prevalência mais acentuada no sexo feminino, o que se mostra em consonância com os dados disponíveis na literatura, onde há evidências que apontam que as mulheres têm um maior envolvimento com atividades manuais e sociais no tempo disponível. Acredita-se na justificativa de que ainda se perpetue a manutenção da construção social de que as atividades manuais, como artesanato, tricô, crochê, entre outras, são culturalmente mais designadas às mulheres o que pode refletir no baixo envolvimento dos homens com este tipo de modalidade de lazer.7,11
No que tange o nível de escolaridade, os resultados encontrados demonstram que idosos com mais de 10 anos de estudo possuem maior inclinação à prática de atividades artísticas, físicas/esportivas, intelectuais, turísticas, virtuais e de contemplação/ócio. Esta relação pode ser explicada pelo fato de que indivíduos com nível de escolaridade menor, geralmente, têm oportunidades mais escassas de emprego com boas condições de trabalho e, consequentemente, menor poder aquisitivo e que incide diretamente sobre o estado motivacional do idoso em relação à adesão às práticas. 3,7,11
Ao analisar a relação das características de ansiedade associadas às práticas de lazer, nota-se nesta pesquisa que idosos que não lidam com limitações impostas por episódios de ansiedade são praticantes mais assíduos de lazer em suas variadas modalidades, assim como aqueles que possuem uma rotina diária com mais qualidade de vida. Estudos demonstram que a importância desses fatores se expressam na ênfase, atualmente dada, para a ação potencialmente benéfica dos exercícios físicos, para a moderação da ingestão de bebidas alcoólicas, para a cessação do hábito de fumar, para a observância de dieta adequada, entre outras medidas, o que contribui inquestionavelmente para o aprimoramento da qualidade de vida e envelhecimento com mais saúde e felicidade.10,11 Esses indicadores contribuem para redução do potencial de desenvolvimento de doenças e de incapacidades funcionais, promovem melhora do funcionamento mental e físico, e estimulam um envolvimento mais engajado e ativo com a vida.2,11
O equilíbrio e a força muscular, além da mobilidade, são fatores importantes para a vida independente e envelhecimento, prezando a qualidade, saúde geral, a manutenção das funções motoras finas e a prevenção de eventos de quedas na população idosos, fatores esses que em meio às práticas de lazer podem ser gradativamente atingidos. Altos níveis de estresse, associados à solidão, como a ausência de amigos ou familiares, podem reduzir a resistência do organismo às doenças, diminuindo a expectativa de vida dessa população.3,7,10 As práticas de lazer englobam todas as atividades que se referem também ao imaginário, ou seja, as imagens, emoções e os sentimentos relacionados ao estético e à busca da beleza e do encantamento, como ao que é atingido nas atividades de apreciação de paisagens, telas e músicas.2,10 Diante de tais evidências, é preciso se atentar ao entendimento sobre o processo biológico de envelhecimento, e compreender os fatores que incidem diretamente sobre ele.3,10,2
O desenho transversal é considerado limitação do estudo, pois não possibilita a inferência de relações causais. Os frequentadores dos CCTI’s apresentam características peculiares, não permitindo inferir resultados para a população idosa de todo o município, para tal faz-se necessária pesquisa com delineamento de amostra de base populacional. Todavia, trata-se de pesquisa de extrema relevância, realizada presencialmente com quantitativo significativo de idosos, em tempos de pandemia da COVID-19.
CONCLUSÕES
Conclui-se que idosos do sexo masculino, que possuem até 10 anos de estudo, pertencentes à CSE C/D-E, com características de Transtorno de Ansiedade Generalizada e qualidade de vida física abaixo da média estão associados à menores práticas de lazer. As atividades físicas/esportivas, intelectuais, turísticas, virtuais e contemplação/ócio estão associadas aos idosos com mais de 10 anos de estudo e pertencentes à CSE AB, evidenciando que as iniquidades sociais existentes interferem diretamente nas práticas de lazer e consequentemente no bem-estar dessa população.
O estudo identificou que os idosos desfavorecidos foram os mais afetados, demonstrando a necessidade de estratégias e ações específicas para esses indivíduos. Sendo assim, a criação e disseminação de políticas públicas de saúde que facilitem e ampliem o acesso à essas práticas tornam-se de fundamental importância para oportunizar às pessoas com idade mais avançada um envelhecimento saudável.
REFERÊNCIAS
1. Andrade RD, Schwartz GM, Felden EPG. Variáveis Socioeconômicas e o Envolvimento no Lazer: Análise com a Escala de Práticas no Lazer (EPL). Licere. 2018; 21(1):292-312. DOI: 10.35699/2447-6218.2018.10813
2. Silva PSC, Boing AFF. Fatores associados à prática de atividade física no lazer: análise dos brasileiros com doenças crônicas. Cienc Saude Colet. 2021; 26(11):5727-38. DOI: 10.1590/1413-812320212611.08672020
3. Ribeiro OCF, Santana GJ, Tengan EYM, Silva LWM, Nicolas EA. Os Impactos da Pandemia da Covid-19 no Lazer de Adultos e Idosos. Licere 2020; 23(3):391-428. DOI: 10.35699/2447-6218.2020.25456
4. Day P, Gould J, Halzeby G. A public health approach to social isolation in the elderly. J Community Nurs. 2020;34(3):54-59. DOI: 10.15640/jcn.v34n3a11
5. Massena PN, Araújo NB, Pachana N, Laks J, Pádua AC. Validation of the Brazilian Portuguese version of Geriatric Anxiety Inventory--GAI-BR. Int. Psychogeriatr. 2015;27(7):1113-19. DOI: 10.1017/S1041610214002285
6. Ware JE, Sherbourne CD. The MOS 36-item short form health survey (SF36). Conceptual framework and item selection. Med Care. 1992;(6):473-83. DOI: 10.1097/00005650-199206000-00002
7. Andrade RD, Schwartz GM, Tavares GH, Pelegrini A, Teixeira CS, Felden EPG. Validade de construto e consistência interna da Escala de Práticas no Lazer (EPL) para adultos. Cienc Saude Colet. 2018;23(2):519-28. DOI: 10.1590/1413-81232018232.00652017
8. Kuykendall L, Tay L, Ng V. Leisure engagement and subjective well-being: A meta-analysis. Psychol. Bull. 2015;141(2):364-403. DOI: 10.1037/bul0000007
9. Aguiar AD, Oliveira ERA, Miotto MHMB. Tooth loss, sociodemographic conditions and oral health-related quality of life in the elderly. Pesqui. Bras. Odontopediatria Clín. Integr. 2022;22:e200189-e200189. DOI: 10.1590/pboci.2022.01
10. Nahas MV. Atividade física, saúde & qualidade de vida: conceitos e sugestões para um estilo de vida ativo. 7. ed. Florianópolis: Ed. do Autor; 2017.
11. Maugeri G, Castrogiovani P, Battaglia G, Pippi R, D’Agata V, Palma A, et al. The impact of physical activity on psychological health during Covid-19 pandemic in Italy. Heliyon. 2020;6(6):e04315. DOI: 10.1016/j.heliyon.2020.e04315
Critérios de autoria (contribuições dos autores)
1. Contribuição: Concepção e planejamento, análise e interpretação dos dados; Elaboração do rascunho ou na revisão crítica do conteúdo; Aprovação da versão final do manuscrito.
2. Contribuição: Concepção e planejamento, análise e interpretação dos dados; Elaboração do rascunho ou na revisão crítica do conteúdo; Aprovação da versão final do manuscrito.
3. Contribuição: Concepção e planejamento, análise e interpretação dos dados; Elaboração do rascunho ou na revisão crítica do conteúdo; Aprovação da versão final do manuscrito.
4. Contribuição: Concepção e planejamento, análise e interpretação dos dados; Elaboração do rascunho ou na revisão crítica do conteúdo; Aprovação da versão final do manuscrito.