ARTIGO ORIGINAL
CARACTERÍSTICAS EMPREENDEDORAS DE ENFERMEIROS NA REGIÃO SUL DO BRASIL: DESAFIOS E REFLEXÕES
ENTREPRENEURIAL CHARACTERISTICS OF NURSES IN THE SOUTHERN REGION OF BRAZIL: CHALLENGES AND REFLECTIONS
CARACTERÍSTICAS EMPRENDEDORAS DE LOS ENFERMEROS DE LA REGIÓN SUR DE BRASIL:DESAFÍOS Y REFLEXIONES
https://doi.org/10.31011/reaid-2023-v.97-n.4-art.2026
1Juliano de Oliveira
2Alexander de Quadros
3Claudia Capellari
4 Morgana Thaís Carollo Fernandes
1Enfermeiro graduado pela Faculdades Integradas de Taquara/FACCAT. Brasil/RS. Orcid: https://orcid.org/0000-0002-0045-397X
2Me em Educação (PUCRS). Doutorando em Naturopatia (INNAP-STAU) Docente das Faculdades Integradas de Taquara, Brasil/RS. Orcid: https://orcid.org/0000-0002-3023-7514
3Me. em Enfermagem (UFRGS). Dra. em Medicina e Ciências da Saúde (PUCRS). Docente das Faculdades Integradas de Taquara, Brasil/RS. Orcid: https://orcid.org/0000-0002-2003-1424
4Enfermeira. Me e Doutora em Ciências da Saúde (PUCRS). Graduanda em Medicina (ULBRA/RS). Orcid: https://orcid.org/0000-0002-7989-294X
Submissão: 04-10-2023
Aprovado: 24-10-2023
RESUMO
Introdução: O empreendedorismo na enfermagem é uma importante ferramenta para ampliação do conhecimento, visibilidade da profissão e consolidação da ciência, tecnologia e inovação em diversos campos de atuação. Esses avanços vêm ganhando maior visibilidade, conhecimento e desenvolvimento profissional aos enfermeiros. Objetivo: Conhecer o perfil de enfermeiros empreendedores em diversas áreas do cuidado. Metodologia: Pesquisa de cunho descritivo, exploratório, de abordagem qualitativa realizada por meio de um questionário sociodemográfico/econômico e uma entrevista semiestruturada aplicada com enfermeiros empreendedores na região sul do Brasil. Resultados: As análises evidenciaram cinco categorias temáticas: definição de empreendedorismo e motivações; áreas de atuação do enfermeiro empreendedor; competências e habilidades do enfermeiro para empreender; desafios para a formação do enfermeiro empreendedor; dificuldades e potencialidades para ser enfermeiro empreendedor. Conclusão: Compreende-se que o empreendedorismo é uma forma de maior liberdade, autonomia e valorização, capaz de suprir necessidades do mercado, mas que encontra desafios que perpassam desde a formação do enfermeiro a cultura do empreendedorismo pelos profissionais.
Palavras-chave: Enfermagem; Empreendedorismo; Enfermagem no Consultório; Serviço de Saúde.
ABSTRACT
Introduction: Entrepreneurship in nursing becomes an important tool for expanding knowledge, visibility of the profession and consolidation of science, technology and innovation in various fields of activity. These advances have been gaining greater visibility, knowledge and professional development for nurses. Objective: To characterize the profile of entrepreneurial nurses in different areas of care. Methodology: Descriptive, exploratory research, with a qualitative approach, through a sociodemographic/economic questionnaire and a semi-structured interview applied with entrepreneurial nurses in the southern region of Brazil. Results: The analyzes showed five thematic categories: definition of entrepreneurship and motivations; areas of performance of the entrepreneurial nurse; nurses' skills and abilities to undertake; challenges for the training of entrepreneurial nurses; difficulties and potential to be an entrepreneurial nurse. Conclusion: It is understood that entrepreneurship is a form of greater freedom, autonomy and appreciation, capable of meeting market needs, but that it encounters challenges that permeate the culture of entrepreneurship by professionals from the training of nurses.
Keywords: Nursing; Entrepreneurship; Office Nursing; Health Services.
RESUMEN
Introducción: El emprendimiento en enfermería es una herramienta importante para ampliar el conocimiento, visibilizar la profesión y consolidar la ciencia, la tecnología de la innovación en diversos campos. Estos avances han ido ganando mayor visibilidad, conocimiento y desarrollo profesional para las enfermeras. Objetivo: Conocer el perfil de las enfermeras emprendedoras en diferentes áreas de atención. Metodología: Investigación descriptiva, exploratoria con enfoque cualitativo, realizada a través de un cuestionario sociodemográfico/económico y una entrevista semiestructurada aplicada a enfermeros emprendedores en la región sur de Brasil. Resultados: Los análisis mostraron cinco categorías temáticas: definición de emprendimiento y motivaciones, área de actuación de la enfermera emprendedora; competencias y habilidades de las enfermeras para emprender; desafíos para la formación de enfermeros emprendedores y dificultades y potencialidades para ser una enfermera emprendedora. Conclusión: Se entiende que el emprendimiento es una forma de mayor libertad, autonomía y valorización, capaz de atender las necesidades del mercado, pero que enfrenta desafíos que permea desde la formación de enfermeros hasta la cultura de emprendimiento de los profesionales.
Palabras Clave: Enfermería; Emprendimiento; Enfermería de Consulta; Servicios de Salud.
O termo “empreendedorismo” surgiu por meio das palavras francesas entrepreneur (empreendedor) ou entreprendre (empreender), que refere-se à organizar, administrar um negócio ou empreendimento, definido como uma ação para obter sucesso por meio de projetos, serviços e negócios. Acredita-se que este termo tenha surgido por volta do século XV. O empreendedorismo veio a entrar nas discussões no âmbito econômico, disseminando-se para a área social, política e institucional. Atualmente vem sendo associado ao desenvolvimento econômico, promovendo a inovação e relacionando a comportamentos e atitudes empreendedoras(1).
No campo da Enfermagem, acredita-se que o empreendedorismo seja uma importante ferramenta para a ampliação do conhecimento, para o aumento da visibilidade da profissão e para a consolidação da ciência, tecnologia e inovação, nos mais diversos cenários em que o profissional atua. Esses avanços vêm proporcionando maior evidência para a enfermagem, conhecimento em saúde e alcance de maiores patamares de desenvolvimento profissional aos enfermeiros(1), embora ainda haja espaço para ampliar a utilização do empreendedorismo pela profissão(2).
Neste sentido, a enfermagem vem usando desta possibilidade para desvincular-se do emprego institucional com arranjos tradicionais de prática de enfermagem(3). Tendências relacionadas a estilos de vida, saúde preventiva e fechamento de hospitais se configuram como fatores favoráveis ao empreendedorismo e, dentro disso, a enfermagem inclui-se, visto o seu vasto conhecimento técnico em alguns negócios, explorando novas possibilidades de atuação(2).
Diante disso, alguns autores relatam que empreender na enfermagem significa atender as necessidades das comunidades e preencher as lacunas do sistema de saúde desarticulado e ineficiente(4-5). Além disso, os enfermeiros empreendedores contribuem para a criação de uma imagem pública positiva da própria profissão, ao oferecer cuidados de saúde eficientes e de qualidade(6).
Tendo em vista as oportunidades, existem fatores que estimulam o empreendedorismo no campo da enfermagem, como o envelhecimento da população, gerações dispostas a pagar pela saúde, falta de tempo e filhos reconhecendo que não podem cuidar de familiares. Além disso, há oportunidades em serviços de saúde em decorrência da falta de mão-de-obra, da redução de custos, e da terceirização de serviços não cobertos pelos serviços públicos ou privados(7).
Iniciativas específicas do conselho profissional também apontam para novas oportunidades Desde a Lei do exercício profissional(8), o enfermeiro tem por atividade privativa a realização de procedimentos técnicos de maior complexidade, como a aplicação de laserterapia de baixa intensidade, por exemplo(9). Já em 2016, a resolução do Conselho Federal de Enfermagem (COFEN) nº 529, de 2016, normatiza a atuação do enfermeiro na área da estética(9,10). Em 2018, o COFEN regulamentou o funcionamento de consultórios e clínicas de enfermagem(11), o que vem ao encontro da Lei do Exercício Profissional, que confere privativamente ao enfermeiro a consulta de Enfermagem. Tais determinações subsidiam iniciativas empreendedoras, ao garantirem ao enfermeiro que o mesmo atue independentemente do vínculo a um serviço de saúde.
No Brasil, há poucos estudos que abordam o empreendedorismo de negócios dentro da área da enfermagem(12). Assim, é preciso compreender o cotidiano de trabalho desses empreendedores, bem como produzir estudos que elucidem possibilidades de inserção do empreendedorismo de negócios no contexto da formação em enfermagem(13).
Acredita-se que investigar este tema possa ser chave para promover aos profissionais de enfermagem a conquista de novos campos de trabalho, contribuir para impulsionar a enfermagem como profissão autônoma, moderna e inovadora, trazendo qualidade na assistência à saúde da população e sendo reconhecida e desafiante dos padrões sociais vigentes.
Esta pesquisa teve como questões norteadoras: Quais as características sociodemográficas e econômicas dos enfermeiros empreendedores? Quais as áreas de atuação que os enfermeiros estão empreendendo? Quais as oportunidades e dificuldades encontradas por estes profissionais de enfermagem empreendedores? Sendo assim, o presente estudo teve como objetivo conhecer o perfil de enfermeiros que atuam como empreendedores de negócios em diversas áreas do cuidado, conhecer as percepções dos enfermeiros em relação ao empreendedorismo e identificar quais as principais oportunidades e dificuldades encontradas pelos enfermeiros em relação ao empreendedorismo.
Trata-se de uma pesquisa descritiva, exploratória e com abordagem qualitativa. A pesquisa descritiva tem como objetivo, conhecer a natureza do fenômeno estudado, a forma como ele se constitui, as características e processos que dele fazem parte. Essa abordagem busca conhecer e interpretar a realidade, sem interferir nela para poder modificá-la(14).
A pesquisa foi realizada com enfermeiros empreendedores na região Sul do Brasil, que contemplou os estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná, no período de setembro a dezembro de 2021. Os enfermeiros foram escolhidos pelo método de indicação, cada enfermeiro entrevistado indicava outro. Como critério de inclusão considerou-se ser empreendedor de negócio há pelo menos um ano; como critérios de exclusão pontuou-se seu negócio estar fechado devido à crise econômica vigente no período (pandemia de covid-19). Cinco (05) enfermeiros fizeram parte da amostra, sendo que o critério para o encerramento da coleta, incluindo este número de participantes, ocorreu por saturação dos dados.
O instrumento utilizado para a pesquisa foi composto por um questionário sociodemográfico e econômico, e por uma entrevista semiestruturada, com 7 (sete) perguntas que proporcionaram vislumbrar as subjetividades das respostas dos entrevistados e explorar melhor as realidades vivenciadas pelos participantes.
Para as entrevistas, os pesquisadores optaram por reuniões via Google Meet, ponderando os riscos pandêmicos da covid-19, o que permitiu ser gravada e transcrita pelos pesquisadores, respeitando a segurança de privacidade e compliance do Google Meet. Para identificação dos entrevistados foram utilizados os codinomes E1 (Entrevistado 1), E2, E3, E4 e E5. Antes das realizações das entrevistas foi enviado o TCLE (Termo de Consentimento Livre e Esclarecido) por e-mail, e devolvido aos pesquisadores com a devida autorização.
Para a análise de conteúdo das entrevistas qualitativas, foram utilizados os preceitos de Bardin, que consiste em um conjunto de análise das comunicações, sendo elaborada por procedimentos sistemáticos tendo como finalidade a declaração do conteúdo das mensagens, permitindo assim o conhecimento relativo às condições que são elaboradas. A técnica de Análise de Conteúdo de Bardin é organizada em três fases: (1) Pré-análise, (2) exploração do material e (3) tratamento dos resultados, inferência e interpretação; na última etapa ocorre a condensação e o destaque das informações para a análise(15).
Esta pesquisa esteve em conformidade com a resolução 510/16, referente à pesquisa em ciências humanas e sociais(16), recebeu aprovação ética sob número do Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE): 49052821.1.0000.8135.
Para melhor conhecimento do perfil dos entrevistados, optou-se por elaborar uma tabela com os principais dados sociodemográficos e econômicos. Conforme a Tabela 1, participaram da pesquisa 5 (cinco) enfermeiros empreendedores, o sexo com maior prevalência foi o feminimo (80%), com idade de maior prevalência entre 30-40 anos (60%), possuindo o estado civil como casado(a) (60%) e com grau de instrução de pós-graduação/especialização (80%), entre estes foi citado: gerontologia, gestão em saúde, estomaterapia, dermatológica, enfermagem estética, podiatria e ozonioterapia. Em relação ao tempo que levou para empreender, após a formação de graduação superior em enfermagem, teve maior prevalência após os 10 anos de formação (60%).
A média de renda mensal do empreendimento dos participantes indicou que 40% deles possuem renda de 3 a 6 salários mínimos (de R$3.300,00 até R$6.600,00), seguido de 40% para mais de 12 salários mínimos (mais de R$13.200,00) e 20% de 6 a 9 salários mínimos (de R$6.600,00 até R$9.900,00). Em relação ao tempo no mercado empreendedor como enfermeiro, houve maior prevalência de 1 a 5 anos (60%).
Para as horas semanais trabalhadas no empreendimento, foi relatado que 40% trabalha 40 horas, seguido de 40% entre 41 a 60 horas e 20% trabalham mais de 60 horas semanais. Foi questionado se exercem função remunerada em outro local de trabalho, a maioria relatou possuir outro emprego, além do empreendimento (60%), seguido de 40% para aqueles que trabalham apenas em seu empreendimento.
Tabela 1 – Dados sociodemográficos e econômicos dos participantes. Taquara, RS, Brasil, 2023.
VARIÁVEIS |
% (n) |
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Sexo Masculino Feminino |
20% (1) 80% (4)
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Idade Entre 30-40 anos Entre 41-50 anos Acima de 60 anos
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60% (3) 20% (1) 20% (1) |
Estado Civil Solteiro(a) Casado(a) Divorciado(a)
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20% (1) 60% (3) 20% (1) |
Grau de escolaridade Graduação superior Pós-graduação/Especialização
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20% (1) 80% (4) |
Tempo que levou para empreender, após formação de graduação superior de enfermagem De 1 a 5 anos De 5 a 10 anos Após 10 anos
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20% (1) 20% (1) 60% (3) |
Média de renda mensal, aproximadamente, com seu empreendimento De 3 a 6 salários mínimos (de R$3.300,00 até R$6.600,00) De 6 a 9 salários mínimos (de R$6.600,00 até R$9.900,00) Mais de 12 salários mínimos (mais de R$13.200,00) |
40% (2)
20% (1)
40% (2)
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Quanto tempo no mercado empreendedor De 1 a 5 anos De 5 a 9 anos Mais de 10 anos
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60% (3) 20% (1) 20% (1) |
Quantas horas semanais você trabalha no seu empreendimento 40 horas 41 a 60 horas Mais de 60 horas
Exerce função remunerada em outro local de trabalho Não, apenas meu empreendimento Sim, possuo outro emprego. |
40% (2) 40% (2) 20% (1)
40% (2) 60% (3)
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Fonte: Os autores, 2021.
Por meio dos dados coletados, transcritos, organizados e analisados, houve o surgimento de cinco categorias temáticas, que são: I- Definição de empreendedorismo e motivações; II- Áreas de atuação do enfermeiro empreendedor; III- Competências e habilidades do enfermeiro para empreender; IV- Desafios para a formação do enfermeiro empreendedor; V- Dificuldades e potencialidades para ser enfermeiro empreendedor. Temáticas essas que serão discutidas separadamente a seguir:
I: Definição de empreendedorismo e motivações
Os participantes da atual pesquisa quando questionados quanto ao que consideravam ser um enfermeiro empreendedor e o motivo da busca pelo empreendedorismo relataram questões relacionadas à liberdade oportunizada pelo empreendedorismo, necessidade do mercado, valorização da enfermagem, desejo pessoal, autonomia, qualidade de vida, maior qualidade no assistência prestada, rentabilidade maior, o que pode-se notar pelas falas a seguir:
E1: Pra mim é ser, cara, é ter liberdade pura, é poder sonhar acordado, acho que a liberdade é meu fôlego do dia a dia quando acordo entendeu [...] O que me motivou muito foi [...] a questão da liberdade né, e hoje eu [...] posso criar meu serviço e ter na franquia uma consultoria [...].
E5: Na verdade é você ousar de suas ferramentas, de todas as suas ferramentas que você vai acumulando ao longo da profissão e construindo um processo de trabalho, que você tenha mais liberdade né, você aculuma conhecimento, você faz uma formação, investe, e em um determinado momento você tá capacitado para reverter isso em trabalho remunerado com qualidade de vida [...]
Tais excertos estão em concordância com o encontrado em estudo sobre ações empreendedoras em Enfermagem, no qual os autores conceituam o empreendedorismo na profissão como a possibilidade de dispor de senso de oportunidade, ser autônomo, independente, flexível, determinado, inovador, proativo, autoconfiante, disciplinado, comunicativo, responsável, tomar riscos calculados, agir de forma holística, conquistar novos cenários de atuação voltados ao cuidado, agregar valor à profissão perante a sociedade, impulsionar o crescimento econômico do país, realizar a gestão financeira e de conflitos, ter consciência legislativa e voltar-se para o futuro(17).
Podemos observar nos trechos apresentados a seguir, percepções diferenciadas sobre o que é ser enfermeiro empreendedor:
E2: É a gente conseguir identificar uma necessidade do mercado, né, e conseguir atender essa necessidade em prol da população [...] Então, o que me motivou é, como eu falei né, eu comecei a ver os pacientes, eu fazia muitos cursos [...] aí fui tendo conhecimento e vendo a necessidade do mercado para esses treinamentos e para pacientes ter resolutividades, foi isso que me motivou.
E5: [...] eu percebi que havia um nicho no mercado que era carente de atendimento especializado [...] a maior motivação foi a observação do nicho de trabalho que você pode atuar de uma forma profissional, competente, que vão te dar essas possibilidades de rentabilidade maior.
As falas de E2 e E5 vão ao encontro do descrito por autores que abordaram o empreendedorismo de negócios na Enfermagem, quando relatam que empreender relaciona-se também às tendências empreendedoras dos enfermeiros descritas como fundamentais e facilitadoras para o enfermeiro que deseja empreender. 2 Em conjunto a essa tendência, outra publicação defende que o sucesso do empreendimento liga-se ainda à capacidade de percepção do enfermeiro quanto à região em que está inserido, sabendo filtrar e priorizar as necessidades locais e a viabilidade de seu projeto inovador(13).
Os entrevistados E3 e E4 abordaram em suas falas a oportunidade de serem reconhecidos, ter autonomia e evidenciar o comprometimento da profissão com a sociedade:
E3: Olha, desde que comecei meu curso em 2011, eu já tinha esse desejo de ter meu negócio [...] então o que me motivou durante a minha graduação a ter um negócio, a empreender, foi essa questão da valorização da enfermagem mesmo né, de me posicionar no mercado de trabalho de ser valorizada como enfermeira né, eu sentia essa falta de valorização mesmo da minha classe né [...] essa autonomia né [...].
E4: Ser um enfermeiro empreendedor é abrir portas, é buscar realmente, quebrar barreiras, mostrar a nossa competência quanto profissional, quanto enfermeiro que muitas vezes a gente não tem esse reconhecimento [...] ser enfermeiro empreendedor é mostrar nossa realidade, é mostrar nosso comprometimento, mostrar o que realmente a enfermagem é capaz né. Nós trabalhamos em conjunto com uma equipe multidisciplinar aqui [...] mas eu não sou submissa a eles né, então nós somos colegas, nós estamos na mesma linha, então mostrar isso para a população é algo assim, muito gratificante pra mim [...]
O senso de oportunidade também surge nos achados desta pesquisa como característica de um empreendedor na Enfermagem. A oportunidade para a Enfermagem configura-se por novas frentes de atuação profissional, possibilitando resultados em prol de melhoria para a sociedade, desde melhorias relacionadas ao cuidado, educação, negócios ou em qualquer outro cenário de atuação do enfermeiro(18). Em uma revisão de literatura sobre o tema, os autores comentam ainda que, dentro do senso de oportunidade, é preciso identificar as possibilidades nos cenários de prática profissional, para que o empreendedorismo possa surgir(1).
Na mesma revisão ora citada, os autores relatam que o conceito de empreendedorismo na Enfermagem vincula-se principalmente às características pessoais do profissional, fator este que permite a associação do empreendedorismo a um comportamento, perfil, ou atitude do enfermeiro(1). Além destes fatores, as tendências relacionadas a estilos de vida, saúde preventiva e fechamento de hospitais também se configuram como fatores favoráveis ao empreendedorismo(2).
Para os enfermeiros E4 e E5, os motivos externos que levaram ao empreendedorismo na enfermagem envolvem as seguintes proposições:
E4: [...] eu comecei a perceber que as empresas não estão interessados nos funcionários, eles estão interessados em produção [...] aí eu falei, não, isso aqui não está certo, não é assim que eu quero trabalhar, e foi aí que eu falei, não, eu vou buscar alguma coisa pra área do empreendedorismo [...] mas hoje eu falo que é muito gratificante, né, ter visto meus filhos crescer, eu tenho dois filhos pequenos, então ter ido na festinha dos dias das mães sabe, ter participado de coisas com eles, do qual se eu estivesse na área hospitalar ou trabalho CLT eu nao teria vivido, então foi assim todo o começo.
E5: [...] eu tenho 42 de enfermagem, então assim, eu poderia estar aposentada [...] dentro de tudo aquilo que a gente acumula de conhecimento e de técnicas, a gente pode melhorar a qualidade de rentabilidade e exercer uma enfermagem com mais qualidade, porque dentro de uma instituição, por mais que seja uma instituição com o conceito humanizado, é bem difícil você dedicar integralmente o seu saber no teu tratamento, além do que, como profissional liberal, você consegue melhorar a qualidade de vida né, direcionar com melhor qualidade o seu trabalho [...].
Entre os motivos externos que levam o profissional de enfermagem em busca da prática privada ou à abertura de negócio, desvinculando-se do emprego institucional com arranjos tradicionais de prática de enfermagem em hospitais e clínicas, estão as visões negativas destes ambientes organizacionais, o que vai ao encontro das falas anteriores. Neste sentido, as lacunas no cuidado, turnos, ambiente estressor disfuncional, sobrecarga de trabalho, cuidado voltado à doença, modelo médico-centrado e modelo de cuidado hospitalar são frequentemente relatados como os motivos principais para a procura pelo empreendedorismo(3).
O interesse pelo empreendedorismo motivado por melhores condições de trabalho, o interesse em não depender de terceiros para exercer suas funções, e o desejo de garantir seu lugar na sociedade como profissão autônoma e suficiente para com os clientes também apresentam-se como motivadores para o empreendedorismo de negócios no campo da enfermagem(13, 19). Esse estímulo pode surgir a partir da unidade familiar, como também em meio a graduação ou por meio de conhecidos que atuam ou atuaram de forma autônoma(20).
Quanto aos enfermeiros que iniciaram no empreendedorismo após anos de atuação profissional, destaca-se como fator motivador para empreender a exaustão na realização da jornada hospitalar, baixos salários e decepções com as funções anteriormente exercidas. Para estes, a experiência profissional em áreas específicas é fundamental para o direcionamento dos empreendimentos(13).
II: Áreas de atuação do enfermeiro empreendedor
Quanto às áreas de empreendimento dos enfermeiros participantes do estudo destacam-se a terceirização da gestão, home care, treinamentos para produtos no mercado e cuidados em feridas, esporte, terapias complementares (liberação miofascial, ventosaterapia, ozonioterapia), estética, podiatria, estomaterapia e atendimento gerais de enfermagem, conforme podemos observar nos relatos seguintes:
E1: [...] personalizar o cuidado dentro da residência né, e deshospitalizar o paciente que está dentro do hospital, tirar do hospital ter um acompanhamento home care com ele [...].
E2: Realizo treinamentos para produtos no mercado e cuidados com pacientes que possuem feridas, mas também atendo procedimentos de enfermagem sim [...].
E3: Aqui no nosso espaço, que é um centro de saúde e treinamento físico [...] eu sempre falo que faço a parte de gestão de saúde dos nossos alunos né [...] eu faço toda essa consulta de enfermagem né, toda essa avaliação de saúde [...] faço às liberações miofasciais caso precise, ventosaterapia [...].
E4: [...] meu consultório só atendia a parte de estética, massagens, terapias e tudo mais, aí eu fiz a enfermagem de estomaterapia, então eu comecei a focar em tratamento de lesões e feridas, e agora por último, eu estou finalizando minha pós graduação em podiatria [...].
E5: Meu empreendimento é um atendimento direcionado para tratamento de lesões [...] através de processos de análise dermatológica associado a ozonioterapia.
Dentro das possibilidades, o profissional de enfermagem possui a oportunidade de criar sua própria empresa, dedicando-se a serviços de enfermagem de forma direta, educativa, de pesquisa, ou ainda de consultoria(21) . A organização individual privada ou pública também trata-se de áreas disponíveis à enfermagem. Com o uso da criatividade, é possível desenvolver melhorias ao serviço e processos, ou novos produtos e novas formas de utilizar produtos já existentes(2).
A diversidade de negócios vem sendo destacada em diversos estudos, sendo as possibilidades voltadas aos cuidados primários, secundários e terciários, havendo prevalência nos cuidados primários(22) . A predominância de negócios relacionados à área de saúde são relatadas como aquelas voltadas à prática clínica privada, além de serviços como home care, sendo ainda descritos os cuidados com feridas e com diabéticos(3,13, 21, 23).
Ainda neste contexto, a expansão da área de atuação para além da saúde ao assumir papéis não tradicionais ao atuar em campos como estética, podologia e tratamentos alternativos também são relatados(3). Dentro deste aspecto, os serviços de assessoria, consultoria e gestão de projetos se encontram em ascensão visto a experiência destes profissionais em apresentar soluções para problemas complexos(23).
III: Competências e habilidades do enfermeiro para empreender
Quando questionados sobre quais os conhecimentos, habilidades e competências necessários para um enfermeiro empreendedor todos citaram conhecimentos relacionados à legislação e normativas como fundamentais. Outras citações voltaram-se à atualização em procedimentos técnicos, marketing, gestão, finanças, planejamento estratégico para captação de clientes, e pós-graduações:
E2: [...] eu acompanho tudo que vem do COREN, do COFEN, como estão às normativas para saber o que pode ou não pode fazer, na área de treinamentos como a gente tem que atualizar muito, não só no procedimento técnico mas também na legislação vigente [...].
E4: [...] você saber que tem a legislação que precisa de POP, tu precisa de PGRSS, tu precisa de alvarás, de registro e tudo mais, isso é o mínimo né, mas tem muita coisa por trás do empreendedorismo que a gente nem imagina [...].
E5: [...] eu possuo conhecimento das legislações, é uma questão que revê bastante durante as pós-graduações [...] Eu sou associada [...] e sou associada à SOBENFEE, que é uma sociedade de enfermagem de feridas, através dessas associações e do próprio COREN eu to sempre me atualizando sobre legislações.
Como em qualquer mudança sistémica ou organizacional, reintroduzir a enfermagem aos empreendedorismos requer preparação dos praticantes e do campo de ação. Dessa forma, estes achados corroboram com os resultados de um estudo, em que os autores defendem a necessidade de estruturas legais, socioeconômicas, profissionais e pessoais para respaldar este profissional no processo de empreendedorismo(6).
Os profissionais de enfermagem são reconhecidos pelo perfil empreendedor, visto o olhar criativo, inovador, confiante, motivado, realista, trabalhador e comunicativo, nato da profissão.24 Outros autores relacionam também à capacidade de autocontrole, de autorregulação nas relações interpessoais, de saber fazer autoavaliação, criticar e gerenciar, reconhecendo seus pontos fortes e fracos, estabelecer objetivos, planos e metas para superar problemas e otimizar ações na vida e no trabalho como primordiais para o perfil empreendedor(25).
Neste sentido, para exercer o papel empreendedor se faz necessário o desenvolvimento de certas habilidades e competências. Algumas destas competências são a visão estratégica, habilidade de inovação, ética, determinação, persistência, entre outras, visando explorar as potencialidades de cada indivíduo. Dessa forma, na enfermagem, o comportamento empreendedor deve servir de alicerce para as competências gerenciais necessárias, indo além do saber tecnicista, rumo à habilidade racional, relacional e estratégica no trabalho(26), o que percebe-se pelas falas a seguir:
E4: [...] mas ser enfermeiro empreendedor tu precisa ter conhecimento em técnica, questão técnica, porque você será o profissional responsável por aqueles atendimentos [...] tem que saber sobre marketing, você tem que saber sobre gestão, finanças, porque você vai ter que saber calcular quanto você gasta pra se manter o teu negócio, quanto que você vai cobrar por cada sessão, você tem que ter planejamento estratégico para captação de clientes [...] a fazer anuncio [...] toda parte financeira, contábil né [...] toda parte de divulgação, instagram [...].
E5: Olha, inicialmente, eu reuni o meu conhecimento prático, do meu conhecimento prático, o meu conhecimento diário do exercício profissional da instituição [...] eu acumulei esse conhecimento ao longo de 20 anos, e associei a uma formação especializada com uma pós-graduação dermatológica [...] foi a principal ferramenta.
Para uma atuação empreendedora, são necessárias competências específicas, como, por exemplo, comunicação, liderança, tomada de decisão e capacidade de resolução de problemas(1, 27) .Dessa forma, o desenvolvimento e aprimoramento dessas competências ao longo da formação em enfermagem se faz necessário. Para isso, utilizar metodologias e estratégias didáticas inovadoras, além da existência de uma gestão universitária capaz de influenciar a formação de um perfil empreendedor é fundamental neste processo(28).
IV: Desafios para a formação do enfermeiro empreendedor
Os participantes desta pesquisa foram questionados quanto à terem recebido conhecimentos voltados ao empreendedorismo em meio à sua graduação. Somente um participante respondeu acreditar que sim:
E3: Ai, eu acho que sim, as disciplinas nos estimulavam né, por exemplo desenvolver trabalhos né, a fazer ligações com outros profissionais, com empresas, então isso tudo foi nos estimulando a ser empreendedor [...] e isso tudo a gente vai desenvolvendo na graduação, é só saber aproveitar as oportunidades né [...].
O estudante deve ser instigado a exercer sua autonomia, além de estimular suas características para atuação como futuro empreendedor dentro da profissão. Para que o desenvolvimento dessas competências e do empreendedorismo em enfermagem ocorram, devem ser inseridos no currículo cursos e práticas que orientem atividades criativas e inovadoras, bem como aquelas que contribuam para tornar este profissional hábil para o enfrentamento de riscos, situações indefinidas e complicadas(28).
Neste sentido, as escolas de enfermagem possuem um papel primordial ao preparar os profissionais e atuar na evolução contínua do empreendedorismo(6). O ensino de empreendedorismo na graduação de enfermagem deve ocorrer ampliando-se os conceitos para além das atividades mercantilistas. A utilização de metodologias ativas de ensino e a avaliação permanente num processo de melhoria constante deve ser implementado(2).
No entanto, a atuação do enfermeiro atualmente ainda continua atrelada às práticas culturais que por vezes colocam o enfermeiro em uma posição de trabalho assistencial hospitalar e muitas vezes subordinado à classe médica.18 Essas amarras continuam a desencorajar os enfermeiros a ocuparem novos papéis dentro da profissão afetando inclusive a graduação em enfermagem onde faltam disciplinas na grade curricular, além de iniciativas de estímulo e atividades práticas que incitem o empreendedorismo do enfermeiro e que estimulem aos futuros enfermeiros a ter seu próprio negócio(29), o que pode-se notar nas seguintes falas:
E1: Não. Hoje eu tô lutando pra ter mais nas faculdades essa exposição do enfermeiro, passar a luta diária do enfermeiro empreendedor, o que o enfermeiro empreendedor faz, como que ele trabalha, como que vai fazer a captação, quais os tipos de negócios, de legislações [...].
E2: Na faculdade na verdade a gente não é estimulado a abrir uma empresa né [...] a empreender sozinho [...] a gente é muito treinado para ser enfermeiro generalista [...].
E4: Nenhum, nenhum… não porque fiz a 18 anos a graduação, então não se falava nisso né [...].
E5: Não, não há. Eu acho que não. Eu acho que a formação acadêmica ela deixa a desejar pelo menos inicialmente, quando você não tem uma cadeira específica voltada para esse conhecimento, você vê em outras graduações [...] nós não temos, não tínhamos pelo menos, talvez agora esteja começando a se desenhar, mas na graduação o enfermeiro ficava muito voltada ao conhecimento técnico/científico específico do atendimento direcionado ao paciente, e pouca coisa era trabalhada nesse sentido, eu acho que ainda hoje é carente.
Estes achados corroboram com os resultados de um estudo que objetivou identificar a tendência empreendedora junto a estudantes de enfermagem(30). Os autores encontraram uma baixa tendência empreendedora nos participantes do seu estudo, o que indica que o tema ainda é pouco abordado nos cursos de graduação, fato também apontado pela maioria dos participantes do estudo.
V: Dificuldades e potencialidades para ser enfermeiro empreendedor
Dentre as dificuldades frente ao empreendimento relatados neste estudo encontra-se a falta de habilidade relacionada a marketing e vendas, captação de clientes, falta de apoio dentro da classe de enfermagem, dificuldade de cobrar adequadamente pelo serviço realizado, desvalorização da enfermagem pela população, demora para ter retorno financeiro do empreendimento, legislação rigorosa, e menos oportunidades comparado à outras áreas da saúde(21).
Além disso, as iniciativas empreendedoras dentro da área da saúde no Brasil enfrentam determinantes negativos como o modelo de cuidado hospitalar, a cultura centrada no médico, e a valorização da profissão médica acima das outras(29). Os mesmos autores revelaram que as principais dificuldades encontradas por enfermeiros liberais voltam-se à rejeição e o preconceito por alguns profissionais de saúde ou parte da comunidade, a pouca aceitação pela sociedade, e as dificuldades financeiras, o que pode-se notar pelo diálogo abaixo:
E3: Então no início era sempre uma dificuldade para os alunos entender que eu faria toda a consulta de enfermagem, avaliação de exames físico, de saúde, exames e avaliação física junto né, então até pro [...] (esposo) era difícil de explicar isso. Às vezes pode parecer que eu dei um retrocesso na minha profissão né, eu tava bem estabilizada, tinha um bom trabalho, benefícios, e abri mão para empreender né, justamente numa área que não é valorizada, que não tem por aqui, e eu vejo isso num longo prazo né, hoje eu preciso estar com alguém, para depois crescer, seguir sozinha né, às vezes empreender é isso, tu se unir com outras pessoas, outros profissionais, não é um retrocesso, é crescer junto né, e pra tu conseguir de desenvolver e ser visto né.
Fatores como a rejeição, o preconceito por parte de outros profissionais de saúde, a pouca aceitação por parte da comunidade, e as dificuldades financeiras, bem como a falta de preparação para o empreendedorismo, também se tornam condicionantes para a prática de empreendedorismo pela enfermagem como profissão liberal(29).
Podem ser citadas outras dificuldades enfrentadas frente ao empreendedorismo, como a multiplicidade de funções a serem desempenhadas e os requisitos legais, o que também foi citado pelos participantes nesta pesquisa.
E5: [...] eu percebo que para você iniciar um projeto empreendedor, você esbarra numa legislação que é extremamente rigorosa, e você não vai ter as mesmas oportunidades que algumas outras áreas da saúde, então pro enfermeiro a gente precisa entender que, por exemplo, que às nossas legislações, o COREN, nos restringe pra muitas coisas, procedimentos, que a gente sabe que ninguém melhor estaria preparado, e no entanto nosso conselho não libera, e aí você precisa ter muito jogo de cintura para você prestar atendimento dentro de um processo legal, com respaldo jurídico e com qualidade, essa é a maior dificuldade.
O relato também corrobora com os achados de um estudo realizado nos Estados Unidos, no qual foram identificadas outras dificuldades, como o excesso de burocracia, ausência de fiscalização e desconhecimento dos órgãos competentes, demonstrando uma fragilidade na regulação do mercado pelas instâncias responsáveis(31).
A dificuldade financeira também é citada como um grande desafio, devendo ser considerada, visto que, a sobrevivência e crescimento no mercado são consequências de uma infraestrutura financiada adequadamente(22), o que pode-se notar nos excertos a seguir:
E2: Eu recebi uma proposta para dar treinamento, aí perguntei pra um colega, como que eu cobro isso né? A gente não estava acostumado a cobrar isso né, a gente não é ensinado a cobrar na verdade [...] é difícil o início né a gente tem que confiar muito pra dar certo, tem que investir tempo, tem que investir no trabalho [...].
E4: Facilidades até hoje eu não tenho não. Ainda não encontrei, mas as dificuldades são inúmeras né, entre elas, primeira coisa, saber calcular os meus gastos né, para eu conseguir cobrar das pessoas e ter segurança no cobrar, fazer que as pessoas entendam qual o meu preço e qual que é o meu valor, no momento que ela identifica o meu valor, o preço se torna bem acessível para elas sabe [...].
Frente às potencialidades relacionadas ao empreendedorismo relatadas neste estudo, encontra-se a captação de clientes quando se atua em uma área com pouca concorrência, a certeza que dará certo se trazer resolutividade e atenção ao cliente, a parceria com outros profissionais, a flexibilidade, e o diferencial no atendimento em decorrência da bagagem de conhecimento inerente à classe da enfermagem.
E1: O que eu achei fácil pra mim, te falar que em Porto Alegre naquela época [...] só tinha eu e mais outro, então isso foi muito fácil pra mim sabe, e meu serviço tinha poucos, comecei a me especializar, e, não acredito: “que começou a chover pacientes na minha porta”, então eu tive uma grande demanda.
E2: [..] mas dá certo, independente da área que queira trabalhar, então o que faz o teu trabalho é a maneira que tu trata as pessoas, a resposta que tu da pra elas do tratamento, eu acho que isso faz com que as coisas funcionem.
E3: As facilidades foi eu ter essa parceria com meu esposo, vamos dizer assim, unir uma profissão a outra, se relacionar, então isso facilitou de certa forma, eu me inserir no mercado né, de repente eu me inserir no mercado sozinha abrindo o consultório poderia ser um pouco mais difícil [...].
E4: Sobre facilidade [...] se for falar assim, qual a vantagem de ser empreendedora, eu acho que essa flexibilidade da nossa venda, uma qualidade de vida muito melhor, ter acompanhado meus filhos, então isso tem uma vantagem [...].
E5: [...] o nosso conhecimento, a nossa prática diária, a nossa permanência à beira leito, a nossa necessidade de sistematizar o atendimento, então a gente atua em todas as fases do atendimento do paciente, isso te dá um escopo né, te dá uma bagagem que vai facilitar na hora de você montar o seu empreendimento, você tem uma visão muito mais abrangente que muitas outras profissões, então eu acho que a mesma coisa que te pune é a mesma que te beneficia sabe.
O empreendedorismo na enfermagem é favorecido por três razões: a prestação de uma assistência holística desenvolvida a partir do curso de graduação; campos diferenciados de atuação profissional existentes; e a parcela predominante do gênero feminino, que vem adquirindo espaço na gestão empresarial(32). O enfermeiro, em decorrência da sua carga de experiência ao lidar com o paciente e a sua família, possui como característica inerente à profissão a possibilidade de identificar as necessidades e elaborar soluções adequadas, podendo ser feita através da oferta de serviços liberais. Muitas são as áreas disponíveis para a atuação da enfermagem, podendo ser exploradas dentro do contexto empreendedor(33).
Este estudo possibilitou compreender que os enfermeiros empreendedores consideram o seu negócio como uma forma de possuir mais liberdade, além de suprir necessidades do mercado, se desafiar, ter mais autonomia, melhor qualidade de vida, e trazer maior valorização para a classe da enfermagem. Os motivos que levam os enfermeiros a empreender voltam-se à necessidade de possuir liberdade profissional, motivação pessoal, necessidade de ofertar tratamentos mais resolutivos para os pacientes, fazer seu próprio horário e maior rentabilidade.
As áreas de atuação englobam terceirização da gestão, home care, treinamentos para produtos no mercado e cuidados em feridas, esporte, terapias complementares (liberação miofascial, ventosaterapia, ozonioterapia), estética, podiatria, estomaterapia e atendimento gerais de enfermagem. Os conhecimentos, habilidades e competências necessários para um enfermeiro empreendedor compreende como fundamental os conhecimentos relacionados à legislação e normativas, além da atualização contínua de procedimentos técnicos, marketing, gestão, finanças, planejamento estratégico para captação de clientes, e pós-graduações.
Quanto à graduação em enfermagem, percebe-se que o curso não oferece capacitação voltada para o empreendedorismo, o que configura-se como um ponto negativo. Destaca-se que oportunizar esta vivência ao discente em enfermagem permitiria que os mesmos refletissem e ampliassem a visão acerca das possibilidades empreendedoras, o que facilitaria um empreendimento dentro da futura profissão.
O presente estudo também revela que as principais dificuldades frente ao empreendimento voltam-se a falta de habilidade relacionada à marketing e vendas, captação de clientes, falta de apoio dentro da classe de enfermagem, dificuldade de cobrar adequadamente pelo serviço realizado, desvalorização da enfermagem pela população, demora para ter retorno dentro do empreendimento, legislação rigorosa, e menos oportunidades comparado às outras áreas da saúde. Já as principais potencialidades neste campo englobam a facilidade de adquirir clientes quando se atua em uma área com pouca concorrência, a certeza que dará certo se trazer resolutividade e atenção ao cliente, a parceria com outros profissionais, a flexibilidade, e o diferencial no atendimento em decorrência da bagagem de conhecimento inerente à classe da enfermagem.
Destaca-se que uma das principais limitações desta pesquisa foi a dificuldade de encontrar enfermeiros empreendedores dispostos a participarem da pesquisa, sugere-se ainda a realização de outros estudos na área do empreendedorismo na enfermagem para melhor conhecimento do fenômeno que é empreender no cenário atual.
8. Brasil. Lei no 7.498, de 25 de junho de1986. Dispõe sobre a regulamentação do exercício da enfermagem, e dá outras providências [Internet]. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. 1986 [cited 2023 Sep 27]. Available from: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7498.htm
9. Conselho Federal de Enfermagem (BR). Parecer Técnico no 114/2021/CTAS/COFEN. Parecer técnico sobre a atuação do enfermeiro na irradiação intravascular a laser no sangue - ILIB [Internet]. COREN/ES; 2021 [cited 2023 Sep 27]. Available from: http://www.coren-es.org.br/enfermeiro-capacitado-pode-atuar-na-irradiacao-intravascular-a-laser-no-sangue-ilib_27861.html
10. Conselho Federal de Enfermagem (BR). Resolução COFEn no 0529/2016 - Alterada pelas resoluções COFEn no 626/2020 e no 715/2023. Normatiza a atuação do Enfermeiro na área de Estética [Internet]. Brasília-DF:Cofen; 2016 [cited 2023 Sep 27]. Available from: https://www.cofen.gov.br/resolucao-cofen-no-05292016/
11. COFEn. Resolução COFEn no 568/2018 - Alterada pela Resolução COFEn no 606/2019. Aprova o Regulamento dos Consultórios de Enfermagem e Clínicas de Enfermagem [Internet]. Cofen. 2018 [cited 2023 Sep 27]. Available from: https://www.cofen.gov.br/resolucao-cofen-no-0568-2018/
15. Bardin L. Análise de Conteúdo. Lisboa: Edições 70; 2011.
16. Brasil. Resolução no 510, de 07 de abril de 2016. Dispõe sobre as normas aplicáveis a pesquisas em Ciências Humanas e Sociais [Internet]. Conselho Nacional de Saúde; 2016 [cited 2023 Sep 27]. Available from: https://conselho.saude.gov.br/resolucoes/2016/Reso510.pdf
20. Villarinho PRL. Características e habilidades dos enfermeiros empreendedores adquiridas por meio do aprendizado na formação e na prática profissional [Internet] [Master]. Universidade Federal do Rio de Janeiro; 2016 [cited 2023 Sep 27]. Available from: http://objdig.ufrj.br/51/teses/855296.pdf
32. Moura DCA, Alvarenga-Martins N, Resende TM, Parreira PMSD, Arreguy-Sena C, Greco RM. Processo de concepção de uma tecnologia para o cuidado em enfermagem e saúde. Ciênc cuid saúde. 2016;15(4):774–9.
Critérios de autoria (contribuições dos autores)
JULIANO DE OLIVEIRA. Responsável pelo projeto, concepção, planejamento do estudo, redação e provação final da versão publicada.
ALEXANDER DE QUADROS. Orientador do projeto.
CLAUDIA CAPELLARI. Banca de TCC e revisão final.
MORGANA THAÍS CAROLLO FERNANDES. Banca de TCC e revisão final.
Declaração de conflito de interesses
Nada a declarar.
Editor Associado: Edirlei Machado dos-Santos. Orcid: https://orcid.org/0000-0002-1221-03