ARTIGO ORIGINAL

 

A ADEQUABILIDADE DOS SEGUIMENTOS DE MULHERES COM LAUDOS ALTERADOS EM UM ESTADO DA AMAZÔNIA LEGAL

 

THE ADEQUACY OF FOLLOW-UP FOR WOMEN WITH AMENDED REPORTS IN A LEGAL AMAZON STATE

 

LA ADECUACIÓN DEL SEGUIMIENTO A MUJERES CON REGISTROS MODIFICADOS EN UN ESTADO LEGAL DE LA AMAZONÍA


 

https://doi.org/10.31011/reaid-2023-v.97-n.2-art.1503 

1 Eliane Cristina dos Santos Souza

2 Antonio Matheus Santos Medrado

3 Poliana Guerino Marson

4 Mayenne Myrcea Quintino Pereira Valente

5 Ana Caroline Costa da Silva

6 Danielle Rosa Evangelista

 

1 Biomédica. Especialista em Citologia Oncótica. Mestra em Ciências da Saúde -Palmas, Tocantins. Orcid: https://orcid.org/0000-0003-1884-7755

2 Enfermeiro pela Universidade Federal do Tocantins – UFT. Mestrando no Programa de Pós-Graduação em Ensino em Ciências e Saúde – PPGESC – UFT. Palmas, Tocantins. Orcid: https://orcid.org/0000-0002-3175-1961

3 Docente da Universidade Federal do Tocantins. Doutorado em Biotecnologia. Graduada em Farmácia Bioquímica e mestre em Bioquímica, Palmas, Tocantins. Orcid: https://orcid.org/0000-0002-3560-0749

4 Enfermeira. Especialista em Saúde Pública. Mestra em Enfermagem. Doutorado em Enfermagem. Professora Adjunto III da Universidade de Fortaleza, Ceará. Orcid: https://orcid.org/0000-0002-2082-4969

5 Enfermeira pela Universidade Federal do Tocantins – UFT, Palmas, Tocantins. Orcid: https://orcid.org/0000-0003-3675-6275

6 Enfermeira. Doutora em Enfermagem. Docente do Curso de Graduação em Enfermagem da Universidade Federal do Tocantins, Palmas, Tocantins. Orcid: https://orcid.org/0000-0002-4472-2879

 

Autor correspondente

Danielle Rosa Evangelista

Endereço: 109 Norte Av. NS-15, ALCNO-14. Plano Diretor Norte. CEP: 77001-090. Palmas/TO - Brasil, bloco lab 4, sala 03. E-mail: daniellerosa@mail.uft.edu.br

 

 

Submissão: 12-09-2022

Aprovado: 25-04-2023

 

RESUMO

Objetivo: O presente estudo teve como objetivo verificar a adequabilidade do segmento de mulheres com laudos alterados no estado do Tocantins. Métodos: Estudo do tipo transversal, avaliativo e documental. O presente estudo foi desenvolvido no Estado do Tocantins, o qual possui o SUS organizado pelo princípio da regionalização e possui 139 municípios. As regiões são: Capim Dourado, Bico do Papagaio, Amor Perfeito, Ilha do Bananal, Sudeste, Cerrado Tocantins Araguaia, Médio Norte Araguaia e Cantão. A população adotada foi de 29.531 mulheres, estimada a partir do levantamento do número de laudos citopatológicos emitidos durante o ano de 2019. O cálculo amostral considerou a utilização da fórmula para populações finitas, após aplicação da fórmula, o n ficou em 379 requisições e laudos de mulheres. Buscando ampliar ainda mais a fidedignidade dos dados, optou-se por triplicar o tamanho amostral, logo o quantitativo ficou 1.137 laudos de mulheres. Resultados: Dos laudos analisados para o seguimento, 22,5% estavam com o seguimento adequado e 77,5% não estavam com seguimento adequado (conduta inadequada ao diagnóstico e/ou tempo para realização da conduta não estava adequado), de acordo com os parâmetros estabelecidos na metodologia (recomendações de seguimento). Considerações finais: Para tanto, torna-se necessário a ampliação da cobertura alcançada e a alta cobertura da população alvo, somando-se a isso um programa de rastreamento organizado e acessível. Construir infraestrutura adequada, aumentar a rede de profissionais capacitados para atender as demandas desde a busca ativa das mulheres até a execução dos serviços citopatológicos bem como do tratamento adequado aos casos diagnosticados.

Palavras-chave: Câncer de Colo Uterino; Controle de Qualidade; Papiloma Vírus Humano; Rastreamento; Seguimento.

 

 ABSTRACT

Objective: The present study aimed to verify the suitability of the segment of women with altered reports in the state of Tocantins. Methods: Cross-sectional, evaluative and documentary study. The present study was developed in the State of Tocantins, which has the SUS organized by the principle of regionalization and has 139 municipalities. The regions are: Capim Dourado, Bico do Papagaio, Amor Perfeito, Bananal Island, Southeast, Cerrado Tocantins Araguaia, Middle North Araguaia and Cantão. The population adopted was 29,531 women, estimated from the survey of the number of cytopathological reports issued during the year 2019. The sample calculation considered the use of the formula for finite populations, after application of the formula, which stood at 379 requests and reports of women. Seeking to further expand the reliability of the data, it was decided to triple the sample size, so the amount was 1,137 reports from women. Results: Of the reports analyzed for follow-up, 22.5% had adequate follow-up and 77.5% did not have adequate follow-up (inadequate conduct for diagnosis and/or time to perform the conduct was not adequate), according to the parameters established in the methodology (follow-up recommendations). Final considerations: Therefore, it is necessary to expand the coverage achieved and the high coverage of the target population, in addition to an organized and accessible screening program. Build adequate infrastructure, increase the network of professionals trained to meet the demands from the active search for women to the execution of cytopathological services as well as the adequate treatment of diagnosed cases.

Keywords: Cervical Cancer; Quality Control; Human Papilloma Virus; Tracking; Follow-Up.

 

RESUMEN

Objetivo: El presente estudio tuvo como objetivo verificar la idoneidad del segmento de mujeres con informes alterados en el estado de Tocantins. Métodos: Estudio transversal, evaluativo y documental. El presente estudio fue desarrollado en el Estado de Tocantins, que posee el SUS organizado por el principio de regionalización y posee 139 municipios. Las regiones son: Capim Dourado, Bico do Papagaio, Amor Perfeito, Isla Bananal, Sudeste, Cerrado Tocantins Araguaia, Medio Norte Araguaia y Cantão. La población adoptada fue de 29.531 mujeres, estimada a partir de la encuesta del número de informes citopatológicos emitidos durante el año 2019. El cálculo de la muestra consideró el uso de la fórmula para poblaciones finitas, luego de la aplicación de la fórmula, que quedó en 379 solicitudes e informes de mujeres. Buscando ampliar aún más la confiabilidad de los datos, se decidió triplicar el tamaño de la muestra, por lo que la cantidad fue de 1.137 informes de mujeres. Resultados: De los informes analizados para el seguimiento, el 22,5% tuvo un seguimiento adecuado y el 77,5% no tuvo un seguimiento adecuado (conducta inadecuada para el diagnóstico y/o tiempo para realizar la conducta no fue el adecuado), según los parámetros establecidos en la metodología (recomendaciones de seguimiento). Consideraciones finales: Por lo tanto, es necesario ampliar la cobertura alcanzada y la alta cobertura de la población objetivo, además de un programa de tamizaje organizado y accesible. Construir infraestructura adecuada, incrementar la red de profesionales capacitados para atender las demandas desde la búsqueda activa de mujeres hasta la ejecución de servicios citopatológicos así como el tratamiento adecuado de los casos diagnosticados.

Palabras clave: Cáncer Cervicouterino; Control de Calidad; Virus del Papiloma Humano; Seguimiento; Hacer un Seguimiento.

                                                                                                                                                         


INTRODUÇÃO

 

O Câncer de Colo Uterino (CCU) é um importante problema de saúde pública. Segundo a Organização Pan Americana de Saúde (OPAS), em todo o mundo, o câncer cervical é o quarto câncer mais frequente em mulheres, com um número estimado de 570.000 novos casos em 2018, representando 7,5% de todas as mortes por câncer no sexo feminino. Das estimadas, mais de 311.000 mortes por CCU a cada ano, mais de 85% delas ocorrem em regiões menos desenvolvidas1.

Quanto à mortalidade, na região Norte evidenciam as maiores taxas do país, sendo a única com nítida tendência temporal de crescimento. Em 2017, a taxa padronizada pela população mundial foi de 12,24 mortes por 100.000 mulheres, representando a primeira causa de óbito por câncer feminino nesta região2.

O Câncer de Colo Uterino (CCU) decorre da replicação desordenada do epitélio de revestimento do colo do útero, com comprometimento de tecido subjacente e podendo invadir órgãos adjacentes ou à distância. A infecção persistente pelo Papilomavírus humano (HPV) de tipos oncogênicos é a principal causa desta neoplasia. Esse tipo de câncer inicia-se a partir de uma lesão precursora, curável na quase totalidade dos casos, visto que a progressão deste tipo de câncer ocorre de forma lenta e assim passíveis de serem detectadas3.

A estratégia utilizada nas últimas décadas, em diversos países, para a detecção precoce deste câncer é o exame citológico de Papanicolaou, devendo este ser realizado em mulheres na faixa etária de 25 a 64 anos e que já tiveram atividade sexual. O exame deve ser feito a cada três anos, após dois exames normais consecutivos, realizados com um intervalo de um ano e a atenção básica à saúde tem sido a maior porta de entrada para este serviço4. As etapas do rastreio implicam desde a identificação e convite às mulheres, garantia dos recursos humanos e materiais, disponibilização de exames de qualidade, até o seguimento das mulheres assegurando tratamento e cuidados para aquelas com exames alterados.

O desempenho desses exames depende de vários fatores que podem estar relacionados com a qualidade do esfregaço, como também aqueles relacionados com o desempenho do profissional propriamente dito. O predomínio do trabalho manual é uma característica marcante do exame citopatológico do colo do útero5. O processo envolvendo a coleta, fixação e coloração do material até a liberação do resultado pelo laboratório retrata essa situação. Embora haja no Brasil diretrizes para o rastreamento para este câncer, não há parâmetros estabelecidos para a programação dos procedimentos de sua linha de cuidado6.

Diante disso, objetivo do presente estudo foi verificar a adequabilidade do segmento de mulheres com laudos alterados no estado do Tocantins.

MÉTODOS

 

Estudo do tipo transversal, avaliativo e documental.

O presente estudo foi desenvolvido no Estado do Tocantins, o qual possui o SUS organizado pelo princípio da regionalização e possui 139 municípios. Conforme pactuação na CIB de 29 de agosto de 2012, o Estado do Tocantins é composto por oito Regiões de Saúde, respeitando os critérios adotados pelo Decreto Federal 7.508/2011 e Resolução Tripartite 004/20127.

As regiões são: Capim Dourado, Bico do Papagaio, Amor Perfeito, Ilha do Bananal, Sudeste, Cerrado Tocantins Araguaia, Médio Norte Araguaia e Cantão.

A população adotada para este estudo foi de 29.531 mulheres, estimada a partir do levantamento do número de mulheres com laudos citopatológicos emitidos durante o ano de 20198. O cálculo amostral considerou a utilização da fórmula para populações finitas proposta por Viegas9, apresentada a seguir:

             

onde:

n= Tamanho (número de elementos) da amostra;

N= Tamanho (número de elementos) da população;

P= Prevalência esperada do evento, percentual com o qual o fenômeno se verifica, onde se adotou 50%, (valor de P= 0,5), por garantir a maior amostra possível;

Q= é o valor complementar de P, ou seja, 50% (valor de Q=0,5) também;

Zα= É o desvio do valor médio que aceitamos para alcançar o nível de confiança desejado (Nível de confiança 95%, valor de Zα= 1,96).

e= É a margem de erro máximo que vamos admitir, 5%, logo valor de e=0,05.

Após aplicação da fórmula, o n ficou em 379 requisições e laudos de mulheres. Buscando ampliar ainda mais a fidedignidade dos dados, optou-se por triplicar o tamanho amostral, para que a amostra fosse ainda mais representativa da população, logo o quantitativo ficou 1.137 laudos de mulheres.

Buscou-se ter análise de todas as regiões de saúde do Tocantins e para tanto, foi realizada a técnica de amostragem aleatória proporcional estratificada dos laudos citopatológicos para cada região de Saúde. Essa técnica considera que a população é dividida em subconjuntos (no presente estudo, as regiões de saúde são os subconjuntos) homogêneos dos quais os elementos são selecionados aleatoriamente e proporcional porque considerou proporcionalmente o tamanho do estrato10.

Os levantamentos dos dados deram-se mediante levantamento documental no banco de dados do SISCAN, de forma sigilosa, em local fechado e reservado para pesquisa, sob a supervisão, participação e acompanhamento de uma das pesquisadoras que detém a guarda dos dados conforme Termo de Fiel Depositário em anexo (TFD).

Além disso, foram capturados os laudos alterados emitidos via SISCAN, na seção Monitoramento. Fez-se uma análise referente ao período compreendido entre o primeiro e o segundo laudo (quando presente) e as condutas utilizadas no seguimento se estavam em conformidade com as Diretrizes Brasileiras para o Rastreamento do Câncer do Colo do Útero11.

As análises dos dados foram realizadas em programas estatísticos Software R e SPSS. Inicialmente, os resultados foram apresentados utilizando-se frequência absoluta e relativa, expressos em porcentagens, médias, desvio padrão, utilizando estatística descritiva, e Intervalos de Confiança (IC 95%). Para as variáveis categóricas, utilizou-se o Teste do Qui- quadrado ou Teste Exato de Fisher para estimar as diferenças entre os grupos, do laudo com presença de alteração nos laudos (variável categórica dicotômica SIM/NÃO) e entre as variáveis do laudo alterado com a adequabilidade do seguimento (variável categórica dicotômica SIM/NÃO).

O projeto de pesquisa foi cadastrado na Plataforma Brasil, submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da UFT e obteve parecer favorável em 13/07/2020 sob o número do parecer 4.152.647. Toda a pesquisa foi realizada em conformidade com as diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos do Conselho Nacional de Saúde, segundo resolução 466 de 12.12.201212.

 

 

RESULTADOS

Desta forma foram avaliadas 1132 mulheres cujo perfil demonstrou que a maioria estava dentro da faixa etária preconizada (25 a 64 anos), a raça predominante foi a não branca, o nível de escolaridade não foi contemplado, e grande parte residia longe do local de coleta do exame citopatológico.

Dos 1132 aceitos na análise pré-analítica, 41 (3,6%) foram classificados como amostra insatisfatória. Os motivos foram: 36 (87,9%) artefatos de dessecamento, dois (4,9%) material acelular ou hipocelular, outros dois (4,9%) por contaminantes externos e um (2,4%) por presença de sangue em mais de 75% da lâmina. Dessa forma os laudos válidos para a análise dos fatores associados à presença de alteração foram 1091.

Dos laudos analisados, 7% apresentou alguma alteração e todas as regiões tiveram pelo menos um laudo alterado. A distribuição dos laudos alterados por região territorial do Tocantins está mostrada no Gráfico 1 e foi 34 (44,6%) na região Capim Dourado, 16 (21,1%) na região Ilha Bananal, 12 (15,8%) na região Médio Norte, 05 (6,6%) na região do Cantão, 03 (3,9%) na região Amor Perfeito, 03 (3,9%) na região do Cerrado, 02 (2,6%) na região Bico do Papagaio e 01 (1,3%) na região Sudeste.


Gráfico 1 - Frequência absoluta e relativa dos laudos que apresentaram alterações. Tocantins, Brasil. 2019.

ASC-US: Células Escamosas Atípicas de Significado Indeterminado; ASC-H:  Células Escamosas Atípicas, não se pode excluir HSIL; AGC: Células Glandulares Atípicas; LSIL: Lesão Intraepitelial Escamosa de Baixo Grau; HSIL: Lesão Intraepitelial Escamosa de Alto Grau.

Fonte: SISCAN, 2019. Organização: Souza, 2021.

 


Na presente pesquisa, mais de um epitélio mostrou associação com o desfecho como apresentado na Tabela 1.


 

Tabela 1 - Fatores presentes no laudo citopatológico associados à presença de alteração. Tocantins, Brasil. 2019.

 

Presença de alteração

 

Sim

n(%)

Não

n(%)

p-valor

RP

IC

Número de epitélios (n=1091)

Um epitélio

Mais de um epitélio

 

10 (1%)

66 (6%)

 

408 (37,4%)

607 (55,6%)

0,000*

4,4

2,25-8,72

Representatividade da zona de transformação (n=1091)

Sim

Não

 

 

66 (6%)

10 (1%)

 

 

607 (55,6%)

408 (37,4%)

0,000*

0,2

 

0,11-0,44

Presença de microbiologia (n=1091)

Sim

Não

 

73 (6,7%)

03 (0,3%)

 

1012 (92,7%)

03 (0,3%)

0,006**

0,7

0,14-0,36

Presença de alterações benignas (n=1091)

Sim

Não

 

 

73 (6,7%)

03 (0,3%)

 

 

1012 (92,7%)

03 (0,3%)

0,006**

0,7

0,14-0,36

*Teste Qui-quadrado;** Teste Exato de Fisher

Fonte: SISCAN, 2019. Organização: Souza, 2021.

 


Dando continuidade à análise dos dados verificou-se sobre o seguimento das mulheres com laudos alterados. Dos laudos analisados para o seguimento, 22,5% estavam com o seguimento adequado e 77,5% não estavam com seguimento adequado (conduta inadequada ao diagnóstico e/ou tempo para realização da conduta não estava adequado), de acordo com os parâmetros estabelecidos na metodologia (recomendações de seguimento).

O cruzamento dos laudos alterados com a adequabilidade do seguimento foi verificado para identificar se algum laudo específico tinha associação com o seguimento e está apresentada na Tabela 2.


 

Tabela 2 - Diagnóstico descrito nos laudos alterados e associação com a adequabilidade do seguimento. Tocantins, Brasil. 2019.

 

Adequabilidade do seguimento

 

Sim

n(%)

Não

n(%)

p-valor**

RP

IC

ASC-US (n=71)

Sim

Não

 

02 (2,8%)

14 (19,7%)

 

23 (32,3%)

32 (45,2%)

0,310

0,19

0,41-0,96

ASC-H (n=71)

Sim

Não

 

06 (8,4%)

10 (14,1%)

 

09 (12,8%)

46 (64,7%)

0,740

3,06

0,88-10,5

AGC (n=71)

Sim

Não

 

00 (00%)

16 (22,5%)

 

02 (2,8%)

53 (74,7%)

0,598

1,30

1,14-1,48

LSIL (n=71)

Sim

Não

 

00 (00%)

16 (22,5%)

 

10 (14,1%)

45 (63,4%)

0,063

1,35

1,16-1,57

HSIL (n=71)

Sim

Não

 

08 (11,3%)

08 (11,3%)

 

11 (15,5%)

44 (61,9%)

0,022

4,0

1,22-13,0

**Teste Exato de Fisher

ASC-US: Células Escamosas Atípicas de Significado Indeterminado; ASC-H: Células Escamosas Atípicas, não se pode excluir HSIL; AGC: Células Glandulares Atípicas; LSIL: Lesão Intraepitelial Escamosa de Baixo Grau; HSIL: Lesão Intraepitelial Escamosa de Alto Grau.

 


DISCUSSÃO

 

Dentre os laudos alterados, cinco deles não foi possível monitoramento. Isso pode ser explicado pelo fato de a mulher ser de outro estado brasileiro e ter realizado a coleta no Tocantins, o que não permite alimentação do sistema, pelo Tocantins. O módulo Seguimento no SISCAN não concede que o usuário de um estado acesse ou modifique dados de pacientes de outro estado. Como o Tocantins faz divisa com outros estados (Maranhão e Pará, ao Norte; Goiás, ao Sul; Maranhão, Piauí e Bahia, ao Leste; Pará e Mato Grosso, a Oeste) é usual esse tipo de conduta pela população que mora nos limites do estado.

Diferente dos dados apresentados na presente pesquisa, uma pesquisa do sul do Brasil revelou que em 56,3% da amostra houve somente a representação do epitélio escamoso, conferindo ausência da Zona de Transformação (ZT) em mais de metade das amostras. Nas demais, a representação foi distribuída entre epitélios glandulares e metaplásicos associados ao epitélio escamoso. Em contrapartida, identificou-se a existência de associação significativa entre a representação dos epitélios e alterações anormais. Em 32,7% das amostras com alterações celulares anormais foi verificada a representação do epitélio escamoso associado ao glandular. Essa porcentagem foi para 51% quando a presença dos epitélios escamoso, glandular e metaplásico13. Dessa forma, o estudo em questão corrobora com o nosso e sugere que amostras com representação do epitélio escamoso associado ao glandular e/ou metaplásico tem mais chances de detectar lesões precursoras.

De acordo com os fatores presentes no laudo citopatológico associados à presença de alteração a descrição das alterações benignas no laudo consiste em: inflamação, metaplasia escamosa imatura, reparação, atrofia com inflamação, radiação e outros que necessitam ser especificados no laudo citopatológico. A inflamação sem identificação de agente é caracterizada por alterações citomorfológicas decorrentes de trauma físico ou químico, radiação, irritação por DIU ou outras causas não específicas. Essas alterações celulares associadas à inflamação obedecem aos critérios a seguir: aumento nuclear de grau variável, os núcleos em geral não estão sobrepostos, binucleação ou multinucleação, hipocromasia nuclear, hipercromasia nuclear (porém a cromatina é homogênea), limites citoplasmáticos bem definidos, o citoplasma pode apresentar vacuolização, policromasia ou halos perinucleares, os nucléolos únicos ou múltiplos podem estar presentes, as células aumentadas geralmente formam camadas coesas que se interdigitam em uma arquitetura clássica de “cardume”14.  

A inflamação e a metaplasia escamosa imatura foram as alterações benignas mais frequentes. A Metaplasia escamosa imatura mostrou associação estatisticamente significante com alterações (p=0,000). O processo de metaplasia representa a substituição de um tipo de epitélio (neste caso endocervical) por outro (escamoso) como resposta protetora14.

Percebe-se que o fato de a mulher ter laudo alterado com alterações mais graves, a conduta é adequada. Todavia, quando as lesões estão em estágios iniciais os profissionais erram nas condutas o que pode justificar os achados de número de casos elevados, pois a intervenção precoce adequada não é realizada. Outro fato grave é que as atipias glandulares, que deveriam ser encaminhadas para colposcopia imediatamente, foram negligenciadas sem nenhuma conduta adequada.

Reforça-se a preocupação com relação à cobertura populacional dos exames citopatológicos que é de 1/3 da população feminina de 25 a 64 anos6 e cujo valor correspondente é de 107.095 mulheres no estado do Tocantins. Em 2019 ficou pactuado (0,56) deste valor que corresponde à realização de 59.973 exames citopatológicos (SES, 2019). Entretando o número alcançado de coletas realizadas de PCCU em 2019 ficou em apenas 29.531 mulheres beneficiadas, muito aquém da meta estabelecida.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

A principal razão para a desigualdade no CCU quando se compara os países desenvolvidos com os subdesenvolvidos ou em vias de desenvolvimento é a falta de acesso a exames de qualidade garantidos a essas mulheres. Para tanto, torna-se necessário a ampliação da cobertura alcançada e a alta cobertura da população alvo, somando-se a isso um programa de rastreamento organizado e acessível. Construir infraestrutura adequada, aumentar a rede de profissionais capacitados para atender as demandas desde a busca ativa das mulheres até a execução dos serviços citopatológicos bem como do tratamento adequado aos casos diagnosticados. Entretanto, torna-se necessária a organização programática e desempenho adequados à realidade da região norte do Brasil, onde se detectam os maiores índices de CCU.

A implementação do rastreamento universal do CCU é imprescindível, porém o esforço deve estar associado a um seguimento adequado. A presente pesquisa detectou que o seguimento no estado do Tocantins é inadequado. As condutas tardias ou ainda a falta delas corroboram para o desfecho de altos índices de carcinoma invasivo e de óbitos por CCU na região norte do país. As recomendações das Diretrizes Brasileiras para o Rastreamento do CCU não estão sendo seguidas, sendo necessário o treinamento e capacitação técnica responsável pelo seguimento, desde a alimentação do sistema SISCAN e convocação das mulheres, ao tratamento adequado.

Nem todo método de rastreamento por si só alcança grandes êxitos. Como método auxiliar à citologia oncótica, sugere-se a Inspeção Visual do colo com Ácido Acético (VIA), de baixo custo, muito utilizado em países com recursos limitados tais como Bangladesh e Índia que utilizaram esse meio e ampliaram seus programas de rastreamento do CCU alcançando elevados graus de organização programática e desempenho.

 

REFERÊNCIAS

 

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3. Ministério da Saúde (BR). Atenção básica cadernos de controle dos cânceres do colo do útero e da mama atenção básica cadernos de controle dos cânceres do colo do útero e da mama [Internet]. 2a ed. Brasília: Editora do Ministério da Saúde; 2013. [cited 2022 Jun 27]. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/controle_canceres_colo_utero_2013.pdf

 

4.  Ministério da Saúde (BR). Protocolos da Atenção Básica: saúde das mulheres [Internet].  Brasília-DF: Ministério da Saúde; 2016. 2016. [cited 2022 Jun 27]. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/protocolos_atencao_basica_saude_mulheres.pdf

 

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6. Instituto Nacional de Câncer (BR). Parâmetros Técnicos para o Rastreamento do Câncer do Colo do Útero [Internet]. Rio de Janeiro: INCA; 2019. [cited 2022 Jun 27]. Disponível em: https://www.inca.gov.br/publicacoes/livros/parametros-tecnicos-para-o-rastreamento-do-cancer-do-colo-do-utero

 

7. Comissão Intergestores Bipartite. Decreto Federal 7.508/2011 e Resolução Tripartite 004/2012. Secretaria Estadual de Saúde do Tocantins – SES, 2020.

 

8. Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva. Estimativa 2020. Incidência do Câncer no Brasil [Internet]. Rio de Janeiro: INCA; 2019. [cited 2022 Jun 27]. Disponível em:  https://www.inca.gov.br/publicacoes/livros/estimativa-2020-incidencia-de-cancer-no-brasil

 

9. Viegas W. Fundamentos lógicos da Metodologia Científica [Internet]. 3. Ed. Rev. Brasília: Universidade de Brasília; 2007. [cited 2022 Jun 27]. Available from: https://brapci.inf.br/index.php/res/v/4999

 

10. Polit DF, Beck CT. Fundamentos de Pesquisa em Enfermagem - 7ed: Avaliação de Evidências para a Prática da Enfermagem [Internet]. Google Books. Artmed Editora; 2016 [cited 2022 Jun 27]. Available from: https://books.google.com.br/books/about/Fundamentos_de_Pesquisa_em_Enfermagem_7e.html?id=2AKpDAAAQBAJ&redir_esc=y

 

11. Instituto Nacional de Câncer (BR). Diretrizes brasileiras para o rastreamento do câncer do colo do útero [Internet]. Rio de Janeiro: INCA; 2018. [cited 2022 Jun 27]. Available from: https://www.inca.gov.br/publicacoes/livros/diretrizes-brasileiras-para-o-rastreamento-do-cancer-do-colo-do-utero

 

12. Brasil. Conselho Nacional de Saúde. Resolução n° 466, de 12 de dezembro de 2012. Aprova normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. Brasília: Diário Oficial da União; 2013. https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/cns/2013/res0466_12_12_2012.html

 

13. Ceolin R, Nasi C, Coelho DF, Paz AA, Lacchini AJB. Análise do rastreamento do câncer do colo do útero de um município do sul do Brasil. Rev Pesqui (Univ Fed Estado Rio J, Online) [Internet]. 2020 [cited 2022 Jun 27];440–6. Available from: https://pesquisa.bvsalud.org/portal/resource/pt/biblio-1052977

 

14. Nayar R. Sistema Bethesda para Relato de Citologia Cervical- Definições, Critérios e Notas Explicativas. Ritu Nayar; David C. Wilbur. Tradução de Samantha Abreu. 3a Ed. São Paulo: Livraria Livromed; 2018. 384p.

 

Todos os autores contribuíram com a confecção do artigo

 

Fomento: não há instituição de fomento

 

Editor Científico: Francisco Mayron Morais Soares. Orcid: https://orcid.org/0000-0001-7316-2519



Rev Enferm Atual In Derme 2023;97(2):e023065