ARTIGO ORIGINAL
PROCESSO DE TRANSFUSÃO SANGUÍNEA: ANÁLISE DE BOAS PRÁTICAS
BLOOD TRANSFUSION PROCESS: ANALYSIS OF GOOD PRACTICES
PROCESO DE TRANSFUSIÓN DE SANGRE: ANÁLISIS DE BUENAS PRÁCTICAS
1 Airton Batista
2 Denise Lunhani
3Maria Tereza Oliveira
4Gislene Aparecida Xavier dos Reis
1 Orcid: https://orcid.org/0000-0001-7148-7934
2 Orcid https://orcid.org/0000-0002-3779-0531
3 Orcid https://orcid.org/0000-0003-4948-9372
4 Orcid https://orcid.org/0000-0002-6232-1905
Autor correspondente
Airton Batista
Graduado em enfermagem – Centro Universitário Ingá – Maringá. Rua Cantor Raul Seixas, 417, Jardim Ipanema, Maringá, Paraná, Brasil. CEP: 87053-240.
E-mail: airtonsena30@hotmail.com. Contato: +55(44) 998827961.
Submissão: 05-10-2022
Aprovado: 02-02-2023
RESUMO
Estudo realizado com o objetivo de investigar a execução do processo de hemotransfusão em relação ao cumprimento do protocolo de boas práticas. Trata-se de estudo descritivo, com abordagem quantitativa. Em que se analisaram os prontuários de pacientes que receberam transfusões sanguíneas, no período entre 01 de outubro a 31 de dezembro de 2021, em um Hospital Ensino, de pequeno porte, situado na região noroeste do estado do Paraná. Durante o período investigado foram realizadas 63 hemotransfusões, sendo (n=43; 68,25%) em pacientes do sexo feminino, e a maioria (n=59; 93,65%) realizadas em Unidade de Terapia Intensiva. A maior adesão às práticas seguras foi na etapa de pré-transfusão (n=59; 93,65%); e durante transfusão (n=59; 93,65%). Os achados desse estudo evidenciaram potencialidades no comprimento do preenchimento do termo de consentimento e da prescrição médica. Por outro lado, identificaram-se fragilidades no preenchimento da Requisição Transfusional. Sendo necessário reforçar boas práticas com equipe de enfermagem, bem como, realizar capacitações para a realização de uma transfusão segura.
Palavras-chave: Sangue; Segurança do Sangue; Transfusão de Sangue; Segurança do Paciente; Enfermagem.
ABSTRACT
Study carried out with the objective of investigating the execution of the blood transfusion process in relation to compliance with the protocol of good practices. This is a descriptivo estudy with a quantitative approach. In which the medical records of patients who received blood transfusions were analyzed, in the period between October 1st and December 31st, 2021, in a small Teaching Hospital, located in the north we stregion of the state of Paraná. During the investigated period, 63 blood transfusions were performed, being (n=43; 68.25%) in female patients, and the majority (n=59; 93.65%) performed in the Intensive Care Unit. The greatest adherence to safe practices was in the pre-transfusion stage (n=59; 93.65%); and during transfusion (n=59; 93.65%). The findings of this studys howed potentialities in the length of completing the consente form and medical prescription. On the other hand, weaknesses were identified in completingthe Transfusion Requisition. It is necessary to reinforce good practices with the nursing team, as well as to carry out training to carry out a safe transfusion.
Keywords: Blood; Blood Safety; Blood Transfusion; Patientsafety; Nursing.
RESUMEN
Estudio realizado com el objetivo de investigar la ejecución del proceso de transfusión sanguínea em relación al cumplimiento del protocolo de buenas prácticas. Se trata de um estudio descriptivocon enfoque cuantitativo. Em el cual se analizaron los prontuarios de pacientes que recibieron transfusiones de sangre, em el período comprendido entre el 1 de octubre y el 31 de diciembre de 2021, em um pequeño Hospital Escuela, ubicado em la región noroeste del estado de Paraná. Durante el período investigado, se realizaron 63 transfusiones de sangre, siendo (n=43; 68,25%) en pacientes del sexo femenino, siendo la mayoría (n=59; 93,65%) realizadas em la Unidad de Cuidados Intensivos. La mayor adherencia a prácticas seguras fue em la etapa pretransfusional (n=59; 93,65%); y durante la transfusión (n=59; 93,65%). Los hallazgos de este estudio mostraron potencialidades em la duración de la cumplimentación del formulario de consentimiento y prescripción médica. Por otro lado, se identificaron debilidades em el diligenciamiento del Requerimiento de Transfusión. Es necessário reforzar las buenas prácticas com el equipo de enfermería, así como realizar capacitaciones para realizar una transfusión segura.
Palabras clave: Sangre; Seguridad de la Sangre; Transfusión de Sangre; Seguridaddel Paciente; Enfermería.
INTRODUÇÃO
A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda aos profissionais de saúde o uso seguro e racional de sangue, bem como a redução de transfusões desnecessárias e inseguras, para diminuir o número de falhas no processo transfusional e proporcionar segurança ao paciente. Segundo o Ministério da Saúde, o processo transfusional de sangue e hemocomponentes é considerado uma atividade técnica bastante abrangente e complexa. Desse modo, faz-se importante que os profissionais envolvidos no referido ato sejam e estejam devidamente qualificados, com intuito de diminuir a ocorrência de riscos transfusionais imediatos ou tardios (1).
A necessidade de regulação do processo hemotransfusional decorre dos riscos inerentes à transfusão sanguínea, que são minimizados com a implementação de normas. A supervisão regulatória é defendida pela OMS como um elemento essencial de qualquer sistema de sangue para garantir que esses padrões sejam atendidos. Dentro de um sistema nacional de regulamentação do sangue, surgem questões políticas sobre a melhor forma de gerenciar a segurança e a disponibilidade do sangue no contexto mais amplo dos recursos de saúde pública e das expectativas da sociedade (2).
No período entre 1º de janeiro de 2007 a 31 de dezembro de 2015, de acordo com o Sistema de Notificações em Vigilância Sanitária (NOTIVISA), ocorreram 65.863 reações transfusionais. Sendo a unidade com maior prevalência de Requisição Transfusional (RT) a clínica médica, seguida pela Unidade de Terapia Intensiva/Centro de Terapia Intensiva (UTI/CTI) e ambulatório de transfusão. Infere-se que quanto maior o número de transfusões, maior será a possibilidade de ocorrência de reações, mas não significa que a unidade de saúde possui menos qualidade e segurança em comparação com as demais. Isso ocorre devido o concentrado de hemácias ser o hemocomponente mais transfundido, quando comparado aos demais componentes (3).
Ao ser identificada a necessidade de hemotransfusão, faz-se necessário o cumprimento de boas práticas, a fim de evitar/minimizar a ocorrência de falhas atreladas ao processo hemotransfusional, a saber: compatibilidade entre doador e receptor; preenchimento completo e adequado Requisição Transfusional (RT). Posteriormente ao preenchimento da RT, é realizada a coleta das amostras pré-transfusionais na qual é essencial que a identificação esteja completa, sem rasuras.
Em seguida, deve-se realizar o transporte do hemocomponente em caixas térmicas padronizadas, com temperatura de até 10ºC, exceto o transporte de plaquetas, a qual deverá ocorrer a 22ºC. Ademais, as bolsas de sangue total, hemácias e plaquetas não devem estar em contato direto com gelo, bem como não deve ser infundido o hemocomponente junto a reagentes e/ou tubos de amostra. Além disso, deve-se utilizar equipo com filtros de microagregados, ou filtros de leucorredução, no caso de transfusão em pacientes oncológicos, transplantados ou politransfundidos(4).
Contudo, 30 minutos antes de iniciar a transfusão sanguínea deve-se retirar o hemocomponente da refrigeração com intuito de deixá-lo com a temperatura mais próxima da corporal. Ademais, antes de transfundir o hemocomponente, deve-se realizar a conferência da identificação do paciente, prescrição médica. Na sequência, deve-se inspecionar o hemocomponente, sendo observado aspecto (cor, hemólise, coágulos) e rótulo (validade, etiquetas imunohematológicas); garantir acesso venoso de alto calibre e exclusivo; aferir e registrar sinais vitais antes, após 15 minutos do início da infusão, e após término.
Ao final da hemotransfusão, não retirar acesso venoso pelo menos 30 minutos após o término, orientar o paciente sobre eventuais reações nas 24 horas após a transfusão, registrar o procedimento em prontuário (4).
Neste cenário, de busca contínua pelas boas práticas existeo profissional enfermeiro, o qual é responsável pela instalação da transfusão sanguínea. Atividade repleta de riscos, ainda mais em um ambiente laboral com inúmeras atribuições, sobrecarga de trabalho, dimensionamento de pessoal inadequado (5).
Diante de tais recomendações, faz-se necessário investigar se os serviços de saúde realizam as referidas práticas para a execução do processo de hemotransfusão a fim de identificar falhas. Desse modo, o presente estudo possui a seguinte questão de pesquisa: como se apresenta a execução do processo de hemotransfusão? Para responder tal questionamento, tem-se como objetivo investigar a execução do processo de hemotransfusão em relação ao cumprimento do protocolo de boas práticas.
MÉTODO
Trata-se de estudo descritivo, com abordagem quantitativa, em que se analisaram todos os prontuários de pacientes maiores de 18 anos que receberam transfusão sanguínea de hemocomponentes, no período entre 01 de outubro a 31 de dezembro de 2021, em um Hospital Ensino, de pequeno porte, situado na região noroeste do estado do Paraná. A seleção de prontuários a serem analisados foram retirados dos livros de registro de transfusão das unidades, depois foi solicitado auxílio ao setor de auditoria para encontrar tais prontuários no SAME.
A coleta de dados foi realizada por meio de checklist, elaborado pelo pesquisador, o qual era composto por variáveis relacionados à etapa pré-transfusão, tais como a presença de termo de consentimento livre e esclarecido, preenchimento do livro de controle de infusão; prescrição médica do hemocomponente; preenchimento adequado da RT, registro dos sinais vitais (SSVV) antes da transfusão; a etapa transfusional, a saber, horário de início da transfusão, registro dos SSVV 15 minutos após iniciar a infusão; pós-transfusão: registro de SSVV após término da infusão, registro do procedimento no prontuário, horário que finalizou a transfusão, ocorrência de reação transfusional.
Posteriormente à coleta, os dados foram transferidos para a planilha Excel e procedeu-se à análise por frequência absoluta e relativa. Todos os preceitos éticos que envolvem pesquisas com seres humanos foram respeitados, e a proposta desta investigação está registrada no Comitê de Ética em Pesquisa, sobe númerode CAAE: 60276622.5.0000.5220.
Durante o período investigado foram realizadas 63 hemotransfusões, destas 68,25% (n=43) ocorreram em pacientes do sexo feminino, sendo a maioria (n=59; 93,65%) realizadas em Unidade de Terapia Intensiva (UTI).
Tabela 1 – Características sociodemográficas das transfusões analisadas (n=63). Maringá (PR), Brasil, 2022.
Características sociodemográficas e das hemotransfusões |
n |
% |
Sexo |
||
Feminino |
43 |
68,25 |
Masculino |
20 |
31,75 |
Motivo de internação |
||
AVEI* |
09 |
14,28 |
Retossigmoidectomia |
09 |
14,28 |
Derrame pleural |
06 |
9,53 |
Osteomielite |
05 |
7,94 |
Outros* |
34 |
53,97 |
Faixa etária |
||
34 a 41 anos |
06 |
9,53 |
42 a 49 anos |
11 |
17,44 |
50 a 57 anos |
00 |
0,00 |
58 a 60 anos |
02 |
3,18 |
Maiores de 60 anos |
44 |
69,85 |
Unidade de Internação |
||
UTI** |
59 |
93,65 |
Clínica Médica e Cirúrgica |
03 |
4,76 |
Centro Cirúrgico |
01 |
1,59 |
Tipos de hemocomponentes e hemoderivados transfundidos |
||
Concentrado de Hemácias |
56 |
88,88 |
Plasma |
7 |
11,12 |
*AVEI: acidente vascular encefálico isquêmico; UTI: Unidade de Terapia Intensiva
Fonte: prontuários analisados.
De acordo com a Tabela 2, a maior adesão às práticas seguras foi na etapa de pré-transfusão (n=59; 93,65%); e durante transfusão (n=59; 93,65%).
Tabela 2 –Adesão às práticas seguras nas etapas de pré – transfusão, durante e após transfusão (n=63). Maringá (PR), Brasil, 2022.
Adesão às práticas seguras |
Sim |
Não |
||
n |
% |
n |
% |
|
Pré – transfusão |
59 |
93,65 |
4 |
6,35 |
Durante transfusão |
59 |
93,65 |
4 |
6,35 |
Pós – transfusão |
54 |
85,71 |
9 |
14,29 |
Fonte: prontuários analisados.
Conforme apresentado na Tabela 3, o item de prática segura frequentemente realizado foi o preenchimento do termo de consentimento (n=59; 93,65%), seguido da realização da prescrição médica (n=54; 85,71%). Cabe mencionar que em 22 (34,92%) RTs não houve preenchimento do horário de solicitação e/ou entrega.
Tabela 3 – Adesão às práticas seguras na etapa pré-transfusional (n=63). Maringá (PR), Brasil, 2022.
Adesão às práticas seguras Pré-transfusão |
Sim |
Não |
||
n |
% |
n |
% |
|
Preenchimento de termo de consentimento |
59 |
93,65 |
4 |
6,35 |
Identificação correta do paciente |
52 |
82,53 |
11 |
17,47 |
Realização de prescrição médica |
54 |
85,71 |
9 |
14,29 |
Requisição Transfusional totalmente preenchida |
0 |
0 |
63 |
100 |
Tempo adequado de entrega do hemocomponente* |
37 |
58,73 |
4 |
6,34 |
Temperatura adequada ao receber |
52 |
82,53 |
11 |
17,47 |
* Ausência desta informação em 22 RTs.
Fonte: prontuários analisados.
Em relação às boas práticas realizadas durante a transfusão sanguínea, observou-se que a aferição de SSVV no início e 15 minutos após o início foi realizada em 51 transfusões, 80,95%. Cumpre citar que no item tempo adequado de infusão, em 23 (36,50%) prontuários não houve o preenchimento do tempo de início e fim
.
Tabela 4 – Adesão às práticas seguras durante a transfusão sanguínea (n=63). Maringá (PR), Brasil, 2022.
Adesão às práticas seguras durante transfusão |
Sim |
Não |
||
n |
% |
n |
% |
|
Tempo adequado de infusão* |
49 |
77,77 |
1 |
1,58 |
Aferição de SSVV no início |
51 |
80,95 |
12 |
19,04 |
Aferição de SSVV 15 minutos após o início |
51 |
80,95 |
12 |
19,05 |
*13 Rts sem informação.
Fonte: prontuários analisados.
No que tange às práticas seguras a serem realizadas na etapa pós-transfusão, identificou-se que o preenchimento do livro de controle e o registro no prontuário do número da bolsa, e, nome do responsável pela infusão tiveram 51 das transfusões preenchidas (80,95%).
Tabela 5 – Adesão às práticas seguras na etapa pós-transfusional (n=63). Maringá (PR), Brasil, 2022.
Práticas seguras pós-transfusão |
Sim |
Não |
||
n |
% |
n |
% |
|
Aferido SSVV após término da transfusão |
51 |
80,95 |
12 |
19,05 |
Ocorrência de reação transfusional |
0 |
0 |
63 |
100 |
Preenchimento do livro de controle |
54 |
85,71 |
9 |
14,29 |
Registro no prontuário do número da bolsa, e, nome do responsável pela infusão |
54 |
85,71 |
9 |
14,29 |
Fonte: prontuários analisados.
DISCUSSÃO
No presente estudo, verificou-se que maior número de hemotransfusões em pacientes do sexo feminino, com idade acima de 60 anos, sendo a maioria ocorrida em Unidade de Terapia Intensiva. Dentre a maior adesão às práticas seguras, destacou-se a etapa de pré-transfusão e durante transfusão.
Em relação a maior ocorrência de transfusão em pacientes transfundidas, infere-se que tal dado pode ser devido ao aumento da expectativa de vida e o desenvolvimento tecnológico, resultando na ampliação no número de doenças crônico-degenerativas e cirurgias mais complexas que requerem maior quantidade de hemotransfusões(6).
No que tange o gênero feminino, isso pode ser explicado pela maior presença das mulheres utilizando os serviços de saúde, e pela maior sobrevida após a faixa etária dos 70 anos (3).
No quesito unidade em que ocorreu maior número de transfusões, aproximadamente 95% dos pacientes em UTIs desenvolvem algum processo anêmico durante sua estadia nesta unidade (7). Além disso, a causa para tal resultado é considerada como multifatorial, sendo sua ocorrência devido a: flebotomias frequentes, baixa produção de hemácias, perdas sanguíneas devido a procedimentos invasivos, hemólise, diminuição da produção de eritropoietina, distúrbios do metabolismo do ferro, dentre outros fatores (8). O que justifica os achados do presente estudo, em que mais da metade das hemotransfusões foram realizadas em UTI.
Em relação a elevada transfusão de hemácias, está se dá pela necessidade do transporte de oxigênio, a qual a única fonte é pela bolsa de hemácia, o que resulta na melhora da oxigenação tecidual (9). Em consonância com tal evidência, realizou-se um estudo prospectivo em 284 UTI’snorte-americanas, no período de 2000 a 2001, e identificou que 44% dos pacientes admitidos nesta unidade receberam uma ou mais unidades de hemácias (10). Além disso, dos 5000 pacientes transfundidos, 31% destes receberam transfusão de hemácias (7).
No que tange o processo de hemotransfusão, sabe-se que este se configura em um procedimento complexo, que requer vigilância e controle contínuo (8).
Para isso, existe o programa da qualidade no serviço de hemoterapia o qual garante que cada hemocomponente seja processado da mesma maneira, desde a seleção do doador até a transfusão, por meio do controle da qualidade das amostras, que fornece segurança a todo processo executado (11).
Em estudo realizado em um Hospital Universitário, em 2013, reforçou a importância do registro das informações relacionadas a etapa de pré-transfusão, sendo elas os sinais vitais, data e hora de início da transfusão, via e local de acesso venoso, bem como a correta orientação ao paciente ou responsável sobre o procedimento e campo para observações (8,19). Contudo, em uma investigação realizada na UTI adulto, de um hospital público de Santa Catarina, identificaram-se dificuldades quanto ao controle do tempo da transfusão e o gotejamento da infusão (6).
O tempo de transfusão adequado é de 90 a 120 minutos, sendo tempo máximo de até quatro horas (12). Contudo, verificou-se na presente pesquisa que na maioria das infusões não houve o registro quanto ao horário de início e término da transfusão, não sendo possível avaliar se houve cumprimento a tal requisito.
Dentre as estratégias para proporcionar maior segurança no ato transfusional, existe a checagem da identificação do paciente a qual deve ser verificado no mínimo dois identificadores, sendo eles: nome completo do paciente, nome da mãe, data de nascimento, e, número do prontuário(13).Além desses há os dados transfusionais que precisam ser analisados, como: transfusão sanguínea anterior, reação transfusional; identificação e resultado da pesquisa de anticorpos irregulares, fenotipagem eritrocitária quando realizada, teste de compatibilidade sanguínea, e resultado de exames laboratoriais, sendo que todos devem ser incluídos na ficha do paciente. A hemotransfusão também pode acarretar na ocorrência de infecção relacionada à própria transfusão e complicações clínicas inesperadas, como lesão pulmonar aguda relacionada (6). Além disso, os efeitos adversos ocorrem devido a erros e ausência de cuidados durante o processo transfusional.
Diante desse contexto, faz-se necessário e importante a aplicação do termo de consentimento livre e esclarecido visto o direito do paciente em receber informações e autorizar quanto a realização de tratamento, salvo em situações de risco iminente de morte (14).
O consentimento do paciente deve necessariamente envolver: 1) o reconhecimento da relação, pretendida como direta e não mediada, entre um profissional de saúde e um paciente, e 2) o respeito à autodeterminação do paciente (liberdade de escolha) de acordo com as informações e processo de tomada de decisão em relação à sua saúde (14). Sendo que no presente estudo tal prática foi amplamente realizada, o que se configura em aceite do paciente para o tratamento hemotransfusional.
A utilização de formulários para solicitação de sangue pode auxiliar na diminuição da taxa de casos com complicações, bem como reduzir o uso inadequado de hemoderivados (6). Visto que neste documento o médico deve prescrever o tipo de hemoderivado e quantidade, o que diminui a possibilidade de o Hemocentro enviar hemocomponentes errados. Contudo, não exime a responsabilidade da equipe em conferir o componente com a prescrição médica e RT.
Outra ação para promover segurança durante a hemotransfusão, está relacionada à monitorização dos sinais vitais antes, após 15 minutos de início da transfusão e após o término (11). As alterações são frequentemente observadas durante a transfusão, que pode ser devido a uma doença subjacente; reação transfusional, ou pode uma resposta esperada à transfusão (15).
Diante da possibilidade de ocorrência de respostas inesperadas durante ou após a hemotransfusão, reforça a importância de o profissional avaliar o paciente depois de finalizada a infusão. Tal resposta pode ocorrer devido os anticorpos preexistentes produzidos pelo receptor da transfusão podem ser responsáveis por uma série de reações, como alérgica leve, febril não hemolítica, hemolítica aguda e anafilática (15). Desse modo, a possibilidade de ocorrência de tais situações, reforça ainda mais a importância da monitorização dos sinais vitais, após a realização do procedimento (14).
É necessário ressaltar, que segundo a legislação, as solicitações para transfusão de sangue ou componentes devem ser realizadas exclusivamente por profissionais médicos, em formulário de requisição específico, que contenha informações suficientes para a correta identificação do receptor (15). Fato este que justifica a alta realização deste procedimento em nossos resultados, visto que sem a prescrição médica, o hemocomponente não é entregue para o procedimento.
Estudos apontam necessidade em investir em ensino sobre hemoterapia nos cursos técnicos e de graduação em enfermagem, focando em instruir os mesmos sobre a importância em realizar treinamentos no serviço sempre que necessário, para atualizar a equipe e fixar informações importantes, exemplo que a conferência da RT não deixe de ser realizada. Os treinamentos foram vistos como cargo chave na quebra de dificuldades de conhecimento e para o avanço positivo da segurança transfusional (16, 20).
Dentre as estratégias para melhorar a execução das boas práticas hemotransfusionais, destaca-se o papel do enfermeiro. O qual possui a responsabilidade de cuidar, educar, gerenciar e investigar o cuidado em saúde (17). Ademais, o enfermeiro é responsável por organizar e administrar o processo de transfusão de sangue e hemocomponentes nos mais variados tratamentos e procedimentos.
Para subsidiar a prática dos profissionais de enfermagem, existem políticas públicas e resoluções do COFEN, as quais definem a execução das atividades relacionadas a hemoterapia. Além disso, o enfermeiro também se faz presente no processo de captação de doadores para transfusão sanguínea, o qual sem o manejo adequado inviabiliza as hemotransfusões(18).
O presente estudo possui como limitações: carência de informações nas RT’s o que nos impede de generalizar os dados; e, a pesquisa ser realizada somente por meio da análise de prontuário, visto que as entrevistas em profundidade poderiam evidenciar oportunidades de melhoria acerca do cuidado antes, durante e após a hemotransfusão.
CONCLUSÃO
Os achados desse estudo evidenciaram potencialidades no comprimento do preenchimento do termo de consentimento e da prescrição médica. Por outro lado, identificaram-se fragilidades no preenchimento da Requisição Transfusional.
A prática transfusional segura, eficaz e adequada é obrigatória para uma boa qualidade do atendimento aos pacientes que necessitam de transfusão como parte de seu tratamento.
A formulação de políticas regulatórias para a segurança do sangue é necessária para lidar com ameaças emergentes, sendo necessário considerar os riscos e benefícios de novos produtos e tecnologias e responder a eventos adversos. Ademais, faz-se importante encontrar melhores maneiras de treinar e apoiar a equipe diretamente envolvida nas diversas etapas do processo de transfusão.
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Fomento: não há instituição de fomento
Editor Científico: Francisco Mayron Morais Soares. Orcid: https://orcid.org/0000-0001-7316-2519