ARTIGO DE REVISÃO INTEGRATIVA
O IMPACTO DA PANDEMIA DE COVID-19 NO SERVIÇO DE ATENDIMENTO PRÉ-HOSPITALAR DE MARINGÁ, PR
THE IMPACT OF THE COVID-19 PANDEMIC ON THE PRE-HOSPITAL CARE SERVICE IN MARINGÁ, PR
EL IMPACTO DE LA PANDEMIA DEL COVID-19 EN EL SERVICIO DE ATENCIÓN PREHOSPITALARIA EN MARINGÁ, PR
Talita Lopes Garçon1
Herbert Leopoldo de Freitas Góes2
1 Universidade Estadual de Maringá, Programa de Pós-Graduação em Enfermagem. Maringá, Paraná, Brasil.
E-mail: tallitalopesgarcon@hotmail.com Orcid: https://orcid.org/0000-0003-0700-2554
2 Universidade Estadual de Maringá, Programa de Pós-Graduação em Educação Física. Maringá, Paraná, Brasil.
E-mail: hlfgoes@uem.br
Orcid: https://orcid.org/0000-0002-6071-692X
Autor correspondente
Talita Lopes Garçon
Universidade Estadual de Maringá, Programa de Pós-Graduação em Enfermagem. Maringá, Paraná, Brasil
Submissão: 28-01-2023
Aprovado: 24-05-2023
RESUMO
Objetivo: conhecer o impacto da pandemia de COVID-19 no trabalho dos profissionais do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) do estado do Paraná. Métodos: estudo qualitativo do tipo exploratório-descritivo, realizado com 14 trabalhadores das equipes do SAMU, por meio de entrevista semiestruturada. Aplicou-se a teoria fundamentada nos dados. Resultados: foram identificadas as categorias: (1) comportamento dos trabalhadores frente as mudanças relacionadas a pandemia da covid-19: percebem aumento nas demandas assistenciais, dificuldades na relação com a rede de serviços e aumento no tempo resposta pela higienização das ambulâncias e paramentação dos profissionais; (2) Vivenciando o sofrimento laboral dos trabalhadores: sentem-se expostos ao risco de contaminação, preocupando-se com recursos de proteção; quanto aos efeitos sobre a saúde mental, os profissionais relataram: sentimentos de medo e insegurança quanto à sua saúde e dos familiares, bem como as limitações do distanciamento social. Considerações finais e implicações para a prática: a pandemia repercutiu sobre a rotina dos trabalhadores, bem como gerou novas necessidades acerca da precaução de contaminação e suporte emocional.
Palavras-chave: Pandemia; COVID 19; Atendimento Pré-hospitalar; Segurança; Profissionais de Saúde.
ABSTRACT
Objective: to know the impact of the COVID-19 pandemic on the work of professionals from the Mobile Emergency Care Service (SAMU) in the state of Paraná. Methods: qualitative exploratory-descriptive study, carried out with 14 workers from the SAMU teams, through semi-structured interviews. Grounded theory was applied. Results: the following categories were identified: (1) behavior of workers in the face of changes related to the covid-19 pandemic: they perceive an increase in care demands, difficulties in the relationship with the service network and an increase in the response time for cleaning ambulances and dressing up workers professionals; (2) Experiencing workers' suffering at work: they feel exposed to the risk of contamination, worrying about protection resources; regarding the effects on mental health, professionals reported: feelings of fear and insecurity regarding their health and that of their family members, as well as the limitations of social distancing. Final considerations and implications for practice: the pandemic had repercussions on the workers' routine, as well as generating new needs regarding contamination precautions and emotional support.
Keywords: Pandemic; COVID-19; Pre-hospital Care; Safety; Health Professionals.
RESUMEN
Objetivo: conocer el impacto de la pandemia de COVID-19 en el trabajo de los profesionales del Servicio Móvil de Atención de Emergencia (SAMU) en el estado de Paraná. Métodos: estudio exploratorio-descriptivo cualitativo, realizado con 14 trabajadores de los equipos del SAMU, a través de entrevistas semiestructuradas. Se aplicó la teoría fundamentada. Resultados: se identificaron las siguientes categorías: (1) comportamiento de los trabajadores frente a los cambios relacionados con la pandemia de covid-19: perciben aumento en las demandas de atención, dificultades en la relación con la red de servicios y aumento en el tiempo de respuesta para limpieza de ambulancias y vestuario de trabajadores profesionales; (2) Experimentar el sufrimiento de los trabajadores en el trabajo: se sienten expuestos al riesgo de contaminación, preocupándose por los recursos de protección; en cuanto a los efectos en la salud mental, los profesionales relataron: sentimientos de miedo e inseguridad con respecto a su salud y la de sus familiares, así como las limitaciones del distanciamiento social. Consideraciones finales e implicaciones para la práctica: la pandemia repercutió en el cotidiano de los trabajadores, además de generar nuevas necesidades en cuanto a precauciones de contaminación y apoyo emocional.
Palabras clave: Pandemia; COVID-19; Atención Prehospitalaria; Seguridad; Profesionales de la Salud.
INTRODUÇÃO
A importância do atendimento rápido e eficiente as vítimas de acidentes e agravos de saúde que acontecem no serviço pré-hospitalar, tem estado cada vez mais em evidência, tanto nas discussões pelos profissionais da saúde, quanto pela própria sociedade que tem compreendido cada vez mais a importância deste serviço (1-2). No Brasil o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU), é o serviço que é vinculado ao Ministério da Saúde (MS), e que faz parte da rede de atendimento de emergência do Sistema Único de Saúde (SUS)(3).
O SAMU realiza um atendimento mais complexo no próprio local do atendimento, com o objetivo de no primeiro momento se estabilizar a vítima, e depois levá-la ao serviço hospitalar de referência. Dentro destas equipes de atendimento avançado existe ainda uma subdivisão, onde além das equipes de atendimento terrestre, também se encontra a equipe de atendimento aero médico, que é responsável por efetuar os atendimentos em áreas onde as equipes de apoio terrestre não poderiam chegar(4).
Devido as suas particularidades, o serviço de Atendimento Pré-Hospitalar móvel sempre foi visto como uma área que possui características que o diferencia dos demais serviços de saúde, onde o foco está em prestar o atendimento mais eficiente e da maneira mais rápida o possível, independentemente do local em que este atendimento ocorra(5-6). Destaca-se que o atendimento pré-hospitalar não se restringe ao componente móvel, havendo, também, o componente fixo, a exemplo das unidades de pronto atendimento.
Em 2020, com a pandemia do novo coronavírus, os serviços de saúde se viram diante de um inimigo invisível, um adversário que não respeita fronteiras, que não diferencia as pessoas, e que possui uma capacidade de fazer com que esta cadeia de atendimento sofresse um impacto importante na sua principal característica, a velocidade de atuação da equipe(7-9). Com isso, os serviços de atendimento pré-hospitalar iniciaram o preparo para atender e transportar pacientes acometidos pela Covid-19. Ressalta-se que a maioria das instituições de urgência e emergência já apresentavam superlotação de atendimentos em virtude de outras doenças que acometem a população(10).
Por se tratar de uma doença com um alto grau de transmissibilidade, foi necessário que governos ao redor do mundo tomassem medidas para conter a disseminação do vírus. Isso levou a uma série de complicações que atingiu de forma direta ou indireta todas as camadas sociais, e todos os serviços prestados para a sociedade em geral(5,11-12). Como era de se esperar, os serviços públicos de saúde ofertados para a população, foram afetados de uma forma gigantesca, em todos os seus níveis e das mais diversas formas possíveis(13). Entre os serviços de saúde, os serviços de emergência foram um dos primeiros a sentir os impactos da pandemia do novo coronavírus, tanto nos serviços de atendimento intra-hospitalares, quanto no serviço pré-hospitalar.
Diante da pandemia os profissionais de saúde que atuam em serviços de emergência pré-hospitalar móvel precisaram estar preparados para a prevenção e controle da pandemia, tendo em vista as particularidades dessa infecção(14). Os serviços de emergência pré-hospitalar apresentam características diversas em função do espaço físico, do processo e organização do trabalho, de condições operacionais de trabalho, do dimensionamento de pessoal, dos equipamentos disponíveis e dos procedimentos realizados(6). Tais características podem conferir maior risco, diante de uma pandemia.
Neste sentido, buscou-se com o estudo responder ao seguinte questionamento: Qual o impacto da pandemia da Covid-19 no trabalho dos profissionais de saúde atuantes no serviço pré-hospitalar móvel de Urgência (SAMU) do estado do Paraná? Este estudo busca identificar e apresentar ao público os impactos sofridos por este serviço em decorrência da pandemia, os desafios enfrentados diariamente pelos profissionais atuantes no serviço, as lacunas que foram deixadas em aberto durante a preparação para o enfrentamento deste desafio, e o que poderá ser levado como aprendizado para a prática profissional no pós-pandemia.
MÉTODOS
Trata-se de estudo de delineamento qualitativo, do tipo exploratório e descritivo. Foram seguidos os critérios do Consolidated criteria for reporting qualitative research (COREQ), que orienta a pesquisa qualitativa(15).
Estudo realizado no Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU), que presta serviço público especializado pré-hospitalar móvel. O SAMU em estudo responde por uma área territorial de 487,012 km2 e uma população estimada a partir do Censo 2010 de 436.472 pessoas(16).
Participaram do estudo Técnicos de Enfermagem, Enfermeiros, Médicos e Condutores que fazem parte do consórcio PROAMUSEP e que atuam no SAMU NORTE NOVO. Todos os profissionais 233 que estavam em exercício de suas funções no SAMU no período da coleta dos dados Julho a setembro de 2022 foram convidados a participar do estudo, os quais compunham uma equipe 23 condutores, 53 médicos, 27 enfermeiros, 16 técnicos de enfermagem. Foram excluídos profissionais em férias e/ou afastamento de qualquer natureza e a amostra de participantes do estudo foi constituída por todos os trabalhadores que responderam à pesquisa (n=14).
A coleta das informações foi realizada por meio de roteiro de questões elaborado pela autora e versavam sobre características dos participantes, (questionou-se sexo, idade, formação profissional, tempo de formação e de trabalho na instituição, titulação, carga horária); impacto da pandemia da COVID-19 sobre o trabalho, (questionou-se como o serviço do SAMU se organizou frente as necessidades da pandemia, as mudanças no contexto de trabalho; e a saúde dos trabalhadores, sendo questionado se, e como, atuar na pandemia teve mudanças na vida e saúde mental, se gerou sofrimento aos trabalhadores. As respostas às questões (n=14) compuseram um banco de dados de onde foi extraído o conjunto textual submetido à análise.
Os dados obtidos foram analisados por meio da TFD, e adotadas as etapas analíticas de codificação inicial e focalizada(17). Na etapa de codificação inicial, os dados foram analisados linha a linha, o que permitiu a obtenção de insights, direcionando as investigações posteriores.
Em seguida, na etapa da codificação focalizada, admitiu-se a separação, classificação e a síntese dos dados, com a formação de códigos mais elaborados, seletivos, permitindo a organização de conceitos, para elucidar as subcategorias e categorias do estudo(17).
O estudo seguiu preceitos éticos da Resolução 466/2012. Contou com a autorização do Coordenador do SAMU e, na sequência, foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição sob o CAAE: 58440722.0.0000.0104 e, parecer 5.520.427, de 11 de julho de 2022. Ao responder as perguntas do formulário, o trabalhador consentiu sua participação no estudo, através da assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido, os resultados foram apresentados, utilizando fragmentos das respostas dos participantes, sendo identificados com códigos referentes a letra E de entrevistado, seguidos do número relativo à ordem das entrevistas.
RESULTADOS
Participaram do estudo 14 trabalhadores: 3 técnicos de enfermagem (21,4%), condutores (28,5%), 2 médicos (14,2%) e enfermeiros (35,7%), dentre os quais 5 eram do sexo masculino (35,7%) e 9 do sexo feminino (64,2 %). A faixa etária dos trabalhadores foi 30-39 anos (57,1%), 40-49 anos (35,7%), 50-59 anos (7,1 %), conforme mostra a Tabela 1.
Tabela 1 - Caracterização dos participantes do estudo. Maringá, Paraná, 2022.
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Nº. |
% |
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Sexo |
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Masculino |
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5 |
35,7% |
Feminino |
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9 |
64,2% |
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Idade |
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30-39 |
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8 |
57,1% |
40-49 |
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5 |
35,7% |
50-59 |
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1 |
7,1 % |
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Formação profissional |
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Enfermeiro (a) |
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5 |
35,7% |
Médico (a) |
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2 |
14,2% |
Técnico (a) de enfermagem |
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3 |
21,4% |
Condutor socorrista |
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4 |
28,57% |
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Tempo de formação |
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1 a 5 anos |
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6 |
42,8% |
6 a 10 anos |
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5 |
35,7% |
Mais de 10 anos |
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3 |
21,4% |
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Tempo de atuação no SAMU |
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1 a 5 anos |
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8 |
57,14% |
6 a 10 anos |
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3 |
21,4% |
Mais de 10 anos |
|
3 |
21,4% |
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Fonte: os autores |
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No processo de análise de dados, as vivências dos profissionais do SAMU em meio à pandemia da COVID-19 puderam ser compreendidas a partir das categorias: (1) comportamento dos trabalhadores frente as mudanças relacionadas a pandemia da covid-19: percebem aumento nas demandas assistenciais, dificuldades na relação com a rede de serviços e aumento no tempo resposta pela higienização das ambulâncias e paramentação dos profissionais; (2) Vivenciando o sofrimento laboral dos trabalhadores: sentem-se expostos ao risco de contaminação, preocupando-se com recursos de proteção; quanto aos efeitos sobre a saúde mental, os profissionais relataram: sentimentos de medo e insegurança quanto à sua saúde e dos familiares.
Comportamento dos trabalhadores do SAMU frente as mudanças relacionadas a pandemia da covid-19
Nesta categoria, as mudanças frente a covid-19, trouxeram aos profissionais do SAMU um comportamento que levou a exaustão e sobrecarga de trabalho. A nova rotina nos atendimentos, com o aumento na demanda assistencial, dificuldades de encaminhamentos para a rede de serviços e o aumento no tempo resposta de atendimento pela higienização das ambulâncias e paramentação dos profissionais, confirmam que o surgimento da pandemia, acarretou uma sobrecarga para os serviços de emergência, como evidenciado na fala:
Aumentou os atendimentos, aumentaram os atestados, a cobertura de outros plantões também aumentou, então a gente trabalhou muito mais, aumentou as atividades de rotina do SAMU, rotina de limpeza da ambulância, rotina de conferência, rotina de atendimento, então tudo foi feito um novo protocolo durante a pandemia (E1).
a abordagem do paciente ficou uma coisa muito mais aflorada, que todo mundo já sabia fazer, executar (E9)
as demandas ficaram maiores, as grades de referências mudaram, o transporte dos pacientes, os cuidados eram diferentes, eram pacientes que exigiam um cuidado maior e um conhecimento pra essa questão respiratória, proteção individual, então houve mudanças (E13).
Para os profissionais de saúde, a adoção dos protocolos foi necessária, pelo fato de estarem lidando com uma doença até então desconhecida, entretanto, o tempo resposta no atendimento aumentou pela higienização das viaturas e o processo de paramentação e desparamentação, como se percebe nas seguintes falas:
toda a vez que entrava uma chamada suspeita de covid, mudava a paramentação, se precisasse entubar um paciente ficava só o enfermeiro e o médico e se retirava parte da equipe pra evitar a contaminação. (E7)
Teve um aumento de trabalho no sentido de ter que ficar lavando ambulância, cada vez que transportava um paciente, tinha a limpeza da ambulância, tinha que lavar a roupa (E10).
equipes exauridas com a jornada de trabalho, as condições que tinham que ser as condições certas, mas né estar com a roupa do SAMU que já é uma roupa quente, vestir toda aquela paramentação por cima, o cuidado para tirar e colocar a paramentação, então teve muita mudança (E8).
Os resultados também apontaram a vivência dos profissionais, principalmente associada às características do trabalho realizado, conforme os relatos:
Acho que sequência rápida de intubação, acho que teve melhora na dinâmica do atendimento, ventilação mecânica que teve bastante dificuldade, acho que teve bastante evolução na parte da enfermagem e medicina (E2).
Por estar entrando no começo da pandemia é meio complicado falar, mas foi uma situação nova, uma situação diferente da forma trabalhada, então foram procedimentos diferentes que a gente teve que adotar e fazer né (E3).
Foi bom, porém cansativo porque a gente tinha muitos protocolos de assepsia, muito protocolo de proteção da equipe e a gente não sabia com o que a gente tava lidando e aí se tornou muito cansativo (E4).
no começo foi bem intenso, não sabia o que podia ser, como podia ser, como que podia ter contato com o familiar, depois eu particularmente fui me adaptando (E5).
Vivenciando o sofrimento laboral dos trabalhadores
Nesta categoria, a insegurança, o medo do desconhecido e de contaminar os familiares foram aspectos que se destacaram nos relatos dos trabalhadores do SAMU. Os relatos trazem as mudanças ocorridas no convívio e a dificuldade de manter o afastamento, principalmente dos familiares, o que representa um acréscimo no sofrimento laboral dos trabalhadores
Na época da pandemia, que estava com um maior número de atendimento, um maior número de mortes, eu tinha medo de ir pra casa e levar para os meus familiares a doença. Minha filha evitava de me abraçar, de ficar perto, ela não queria e eu também tinha medo de ir pra casa levar contaminação para eles, isso foi bem triste mesmo (E1).
Você vê perder tanta gente, transportar uma pessoa e infelizmente aquela pessoa não sobreviveu, triste (E3).
A saúde física ficou um pouco prejudicada... antes da pandemia, eu tinha uma rotina praticando atividade física, acabei parando durante a pandemia e ainda não voltei para minhas atividades normais (E4).
Eu perdi meu pai na época da pandemia, fiquei internado por 10 dias também (E7).
Além do medo e preocupação com a doença, a saúde física dos trabalhadores também foi impactada com a pandemia, trazendo prejuízos na rotina destes trabalhadores e consequentemente na qualidade de vida.
Tive a parte psicológica e física bastante afetada e tive por conta disso um desgaste, eu tive um ganho ponderal de 20 quilos durante a pandemia. Além disso, trouxe insegurança, incerteza e desgaste, físico, emocional, a parte psicológica foi muito afetada, desenvolvi a síndrome de Burnout, ansiedade, depressão, descontei tudo na comida pra não tomar remédio (E8).
Ainda não consegui relaxar na verdade, ainda trabalho como se estivesse em pandemia, é muito desgastante, ainda estou desgastada física e mentalmente, muito mesmo, porque mesmo eles falando nesse período pós pandemia, mas ainda não estamos nesse período de pós, estamos na pandemia ainda, nossa, a situação está muito cansativa (E12).
DISCUSSÃO
O impacto da COVID-19 nos trabalhadores do SAMU, de acordo com os resultados deste estudo, foi relacionado a sobrecarga de trabalho, em razão das características do serviço, o qual exige agilidade e rapidez nos atendimentos. Além disso, a exposição ao risco de infecção, para si e para suas famílias corroborou para o sofrimento do trabalhador.
A pandemia da covid-19 sensibilizou esforço conjunto para reconhecimento da etiologia e adesão de medidas equivalentes a proteção global. Nesse momento, em virtude da pandemia, os serviços de atendimento de urgência e emergência pré-hospitalares também iniciaram o preparo para receber pacientes suspeitos e confirmados pela COVID-19(10). Os profissionais de saúde, grupo que é composto por distintas categorias, estão diariamente desenvolvendo atividades no atendimento para pessoas infectadas pela COVID-19 e, portanto, integram um grupo de risco específico para essa infecção(7-8).
A pandemia em curso expôs a fragilidade do setor de saúde em garantir a segurança dos profissionais envolvidos no cuidado aos infectados e a maioria, se não todos os profissionais de saúde, estão expostos e possuem alto risco de adquirir a doença, particularmente ao realizar procedimentos em vias aéreas ou próximos a elas(18).
Após a declaração do Ministério da Saúde (MS), por meio da portaria n° 188, de 3 de fevereiro de 2020, emitiu Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (ESPIN) após a decreto do Ministério da Saúde (MS), por meio da Portaria n° 188, de 3 de fevereiro de 2020, proferiu Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (ESPIN), em decorrência da infecção Humana pelo novo Coronavírus, sucedeu-se o fundamento da requisição do emprego iminente de medidas de prevenção, controle e combate de riscos, e danos à saúde pública. Nessa perspectiva, a diversidade desta situação sensibilizou determinação conjunto de todos as ferramentas da rede de saúde do Sistema Único de Saúde (SUS) para inspeção da etiologia e execução de medidas equipolentes e restritas aos riscos(19).
Um dos maiores desafios da COVID-19 é o fato de ser uma patologia nova. Essa realidade tem causado sérios impactos na saúde pública, que levou a mudanças abruptas na organização das instituições de saúde, bem como na forma de atender as pessoas infectadas por esta doença(11,20). A experiência de diferentes países tem mostrado um alto número de casos de COVID-19. Muitos dos pacientes acometidos podem evoluir para situações de emergência no ambiente extra-hospitalar ou que requeiram transferências intra-hospitalares para unidades mais complexas, contexto em que o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) se destaca, por apresentar particularidades que pode, conforme apontado no relato dos participantes, vulneráveis a adquirir a doença e a sobrecarga de trabalho(21-22).
As equipes de atendimento móvel atuam em diversas situações, muitas vezes não sendo possível prever se são ou não casos suspeitos e/ou confirmados de COVID-19, o que torna imprescindível a implementação de amplas medidas preventivas antes, durante e após esses atendimentos. As unidades móveis pré-hospitalares apresentam diversas especificidades em função das características do espaço físico onde se processa o cuidado, de condições operacionais de trabalho, do número de profissionais nas equipes, dos equipamentos disponíveis e dos procedimentos realizados, e ainda a particularidade dos cenários do atendimento(20,23). Tais características podem conferir maior risco aos seus profissionais, diante de uma pandemia como a do COVID-19.
Nas situações em que a equipe é acionada para atender um caso suspeito ou confirmado de Covid-19, é obrigatório preparar a ambulância para o atendimento, assim como paramentar os profissionais. Com a finalidade de proteger as equipes e assegurar assistência adequada aos pacientes, algumas mudanças foram instituídas nos procedimentos de rotina, exclusivamente para casos suspeitos ou confirmados de infecção por Covid-19(24).
A higienização da ambulância, por exemplo, de acordo com os profissionais passou a ser feita pela equipe de plantão, juntamente com a higienização dos materiais e equipamentos, o que gerou segundo eles, uma sobrecarga de trabalho e, ainda, morosidade nos atendimentos. Esse fato não é exclusivo deste estudo. A segurança instrumental nas unidades moveis era realizada pela equipe e profissionais contratados por empresa terceirizada, com o preparo da ambulância atendendo as recomendações adotadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para prevenção e controle da pandemia(10).
A oferta de cuidados nas unidades móveis pré-hospitalares é condicionada a restrição de espaço físico, de tempo, circunstâncias operacionais de trabalho, número de profissionais nas equipes e dos equipamentos disponíveis e dos procedimentos realizados. Tais características podem conferir maior risco de exposição à COVID-19, o que torna imprescindível a implementação de amplas medidas preventivas antes, durante e após todos os atendimentos realizados(14).
No processo de paramentação e desparamentação, estudos apontam dificuldades relacionadas as informações sobre os chamados, forma de utilização dos equipamentos de proteção individual, insegurança e medo de contaminação. O uso do material que é fornecido que nem sempre são adequados ou de boa qualidade. Alguns itens só estão disponíveis em certos setores com horário específico dificultando o seu acesso(14).
A insegurança e o medo contaminar os familiares foram aspectos que se destacaram nos relatos dos trabalhadores do SAMU. Adaptações sociais impactam a saúde dos trabalhadores na medida em que os profissionais se percebem como potenciais vetores de contaminação por estarem em contato com a população diariamente(14).
As mudanças no modo de viver e o medo gerado pela pandemia causaram diversos efeitos físicos e psíquicos, conforme estudos(14). Em algumas situações extremas, Marques et al(10) refere que trabalhadores de saúde “deixaram suas casas para habitar outros ambientes como forma de evitar o contato com familiares na tentativa de protegê-los”. Especificamente no cotidiano do trabalho das equipes dos serviços móveis de urgência, os atendimentos, durante este período pandêmico, têm sido ofertados da maneira mais precavida possível aos pacientes e familiares e, ao mesmo tempo, buscando proteger todos os profissionais de eventual contágio(10).
Mediante a adoção de todas essas medidas em prol do cuidado qualificado em tempos de pandemia, os profissionais inseridos no contexto pré-hospitalar buscam promover a própria segurança e também a do paciente.
É importante apontar algumas limitações relacionadas a esta pesquisa, uma delas, remete ao número de participantes, dificultando generalizações. A realização de uma investigação com a participação de mais trabalhadores poderia representar melhor o tema em estudo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O estudo apontou que sobrecarga de trabalho dos profissionais do SAMU e a exposição ao risco de infecção para si e para a família, ocasionou maior impacto na saúde física e mental desses trabalhadores, corroborando para o sofrimento dos mesmos.
A pandemia repercutiu sobre a rotina dos trabalhadores, no atendimento pré-hospitalar, bem como gerou novas necessidades acerca da precaução de contaminação e suporte emocional. Além de ser um serviço imprescindível para a população, interessa vislumbrar aspectos que envolvem a saúde e segurança dos trabalhadores, face à sua exposição aumentada ao adoecimento físico e mental durante a pandemia.
Acredita-se que o impacto da pandemia da covid-19 na vida desses trabalhadores possa nos ajudar a entender melhor outros comportamentos e inspirar a construir um controle melhor e ao direcionamento de políticas específicas.
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Contribuição de autoria
Concepção do estudo: Garçon TL, Góes HLF; Coleta de dados: Garçon TL; Análise e interpretação dos dados: Garçon TL, Góes HLF; Discussão dos resultados: Garçon TL, Góes HLF; Redação e/ou revisão crítica do conteúdo: Garçon TL, Góes HLF; Revisão e aprovação final: Garçon, TL, Góes HLF
Fomento: não há instituição de fomento
Editor Científico: Francisco Mayron Morais Soares. Orcid: https://orcid.org/0000-0001-7316-2519