ARTIGO ORIGINAL

 

A PERCEPÇÃO DA VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA PELOS ENFERMEIROS RESIDENTES DA ENFERMAGEM OBSTÉTRICA NA REGIÃO NORTE

 

THE PERCEPTION OF OBSTETRIC VIOLENCE BY OBSTETRIC NURSING RESIDENTS IN THE NORTHERN REGION

 

PERCEPCIÓN DE LA VIOLENCIA OBSTÉTRICA POR LOS RESIDENTES DE ENFERMERÍA OBSTÉTRICA DE LA REGIÓN NORTE

 

https://doi.org/10.31011/reaid-2025-v.99-n.1-art.2267

 

Elizabeth Pinheiro AraújoI

Diego Pereira RodriguesII

Andressa Tavares ParenteIII

Elyade Nelly Pires Rocha CamachoIV

Valdecyr Herdy AlvesV

Malena da Silva Almeida VI

Tatiana do Socorro dos Santos Calandrini VII

 

I. Enfermeira. Residente em Enfermagem Obstétrica pela Universidade Federal do Pará. Belém/PA, Brasil. E-mail: elizabetharaujo2803@gmail.com ORCID: https://orcid.org/0000-0002-5826-8881

II Enfermeiro. Professor Adjunto da Universidade Federal do Pará. Belém/PA, Brasil. E-mail: diego.pereira.rodrigues@gmail.com ORCID: https://orcid.org/0000-0001-8383-7663

III. Enfermeira. Professora Adjunta da Universidade Federal do Pará. Belém/PA, Brasil. E-mail: andressaparente@yahoo.com.br ORCID: https://orcid.org/0000-0001-9364-4574

IV.  Enfermeira. Professora Adjunta da Universidade Federal do Pará. Belém/PA, Brasil. E-mail: elyadecamacho@gmail.com ORCID: https://orcid.org/0000-0002-7592-5708

V. Enfermeiro. Professor Titular da Escola de Enfermagem Aurora de Afonso Costa da Universidade Federal Fluminense. Departamento Materno Infantil Psiquiátrico. Niterói/RJ, Brasil. E-mail: herdyalves@yahoo.com.br ORCID: https://orcid.org/0000-0001-8671-5063

VI. Enfermeira. Mestranda em Enfermagem pelo Instituto de Ciências da Saúde da Universidade Federal do Pará. Belém/PA, Brasil. E-mail: malenaalmeida10@gmail.com ORCID: http://orcid.org/0000-0002-2362-5586

VII. Enfermeira. Mestre em Enfermagem. Professora Adjunta da Universidade Federal do Amapá. Macapá/AP, Brasil. E-mail: calandrinitatiana@gmail.com ORCID: https://orcid.org/0000-0003-2807-2682

 

Submissão: 05-02-2024

Aprovado: 30-12-2024

 

RESUMO

Objetivo: compreender a percepção dos residentes de Enfermagem Obstétrica sobre a violência obstétrica. Métodos: trata-se de um estudo do tipo descritivo exploratório, com abordagem qualitativa realizado com residentes de enfermagem obstétrica através de entrevista semiestruturada. As entrevistas foram transcritas na íntegra, e foram realizados o tratamento e análise dos dados. Em seguida foram estabelecidas três categorias: 1) Os significados da violência obstétrica em/na enfermagem; 2) O processo de trabalho da enfermagem obstétrica e as barreiras para o combate da violência; 3) A formação da enfermagem obstétrica: elo para mudança da violência obstétrica. Resultados: observa-se que a maioria dos residentes reconhecem a violência obstétrica e sabem como reduzir as práticas violentas nos cenários em que atuam, entretanto, a falta de autonomia e a falta de aceitação de mudança quanto as práticas por parte dos profissionais, se torna um obstáculo para esse combate à violência. Conclusão: o estudo proporcionou explorar os significados dos residentes sobre a violência obstétrica, além de destacar a importância da mesma, visto que é a ciência que prioriza o acolhimento, respeito à vontade da mulher e a educação em saúde, ferramentas que são imprescindíveis para o combate e mudança do atual modelo.

Palavras-chave: Violência Contra a Mulher; Internato e Residência; Obstetrícia; Humanização da Assistência.

 

ABSTRACT

Aim: to understand obstetric nursing residents' perceptions of obstetric violence. Methods: this is a descriptive exploratory study, with a qualitative approach, carried out with obstetric nursing residents through semi-structured interviews. The interviews were transcribed in full and the data was processed and analyzed. Three categories were then established: 1) The meanings of obstetric violence in nursing; 2) The obstetric nursing work process and the barriers to combating violence; 3) Obstetric nursing training: a link to changing obstetric violence. Results: most residents recognize obstetric violence and know how to reduce violent practices in the settings in which they work; however, the lack of autonomy and the lack of acceptance by professionals to change their practices are obstacles to combating violence. Conclusion: the study allowed us to explore the residents' meanings about obstetric violence, as well as highlighting its importance, since it is the science that prioritizes welcoming women, respecting their wishes and health education, tools that are essential for combating and changing the current model.

Keywords: Violence Against Women; Internship and Residency; Obstetrics; Humanization of Care.

 

RESUMEN

Objetivo: conocer la percepción de las residentes de enfermería obstétrica sobre la violencia obstétrica. Método: se trata de un estudio exploratorio descriptivo con enfoque cualitativo, realizado con residentes de enfermería obstétrica mediante entrevistas semiestructuradas. Las entrevistas fueron transcritas en su totalidad y los datos fueron procesados y analizados. Se establecieron tres categorías: 1) Los significados de la violencia obstétrica en la enfermería; 2) El proceso de trabajo de la enfermería obstétrica y las barreras para combatir la violencia; 3) La formación de la enfermería obstétrica: un vínculo para cambiar la violencia obstétrica. Resultados: la mayoría de los residentes reconocen la violencia obstétrica y saben cómo reducir las prácticas violentas en los ámbitos en los que trabajan; sin embargo, la falta de autonomía de los profesionales y de aceptación de cambios en las prácticas es un obstáculo para combatir la violencia. Conclusión: el estudio permitió explorar los significados que los residentes tienen de la violencia obstétrica, además de resaltar su importancia, ya que es la ciencia que prioriza la acogida a la mujer, el respeto a sus deseos y la educación en salud, herramientas esenciales para combatir y cambiar el modelo actual.

Palabras clave: Violencia Contra la Mujer; Internado y Residencia; Obstetricia; Humanización de los Cuidados.

 

INTRODUÇÃO

 

O processo de parto e nascimento trouxe ao decorrer dos anos mudanças significativas, principalmente durante a assistência. No Brasil, a partir do final do século XIX, quando a medicina deu início à amplificação do processo de medicalização do parto e nascimento, houve um processo que relaciona diferença nos tipos de assistência dadas às gestantes sem recursos financeiros e mais marginalizadas pela sociedade. Essas mulheres, na maior parte das vezes, tiveram pouco acesso a cuidados médicos e hospitalares, além do controle superior do patriarcado, aonde tomava todas as decisões relativas ao corpo da mulher, sobre a quantidade de filhos, se ela engravidaria ou não, e outros fatores que tornava a mulher ainda mais submissa perante o homem(1,2).

        Com a repercussão de movimentos feministas, a Violência Obstétrica (VO) foi sendo reconhecida pela sociedade em geral. No Brasil, o termo violência obstétrica tem sido utilizado no país para denominar o conceito de Disrespect And Abuse During Childbirth. Essa denominação foi recomendada para a identificação de qualquer ato de violência direcionado à mulher durante a gravidez, durante e após o parto ou ao seu bebê, praticado pelo ato da assistência profissional bem como pelas normas e rotinas protocolares da instituição de saúde. Daí gera de forma significativa desrespeito à sua autonomia, integridade física, psicológica, moral, aos seus sentimentos, as suas opções e preferências no ciclo gravídico-puerperal(3).

         Nesse contexto, o profissional enfermeiro deve incentivar e apoiar a mulher quanto as suas escolhas, tanto ao tipo de parto, quanto ao seu direito de não ser violentada por meio de técnicas e manobras desnecessárias (como kristeller, episiotomia, puxos dirigidos, dentre outros) de estar acompanhada por uma pessoa de sua escolha durante todo o pré-parto, parto e pós-parto e de ter esclarecimento quanto aos procedimentos a serem realizados, apenas com a sua autorização quando não há risco de vida(4).

       Para a Organização Mundial da Saúde (OMS)(5), toda mulher tem direito a um parto respeitoso, acolhedor, mantendo a dignidade, privacidade e confidencialidade, com a garantia da ausência de qualquer dano e maus tratos. Ademais, dentre as práticas não recomendadas, estão: o uso rotineiro de episiotomia, tricotomias, enemas, ocitocina de rotina, entre outras. Assim, por meio da iniciativa de atualização dos profissionais atuantes, busca-se mudar tais práticas que são prejudiciais à saúde da mulher para práticas humanizadas, que respeitem a fisiologia do parto.

          As residências tiveram seu início com a Lei nº 11.129, de 30 de junho de 2005, que instituiu as residências em área profissional de saúde e criou a Comissão Nacional de Residência Multiprofissional em Saúde no âmbito do Ministério da Educação (MEC). Tal ação permitiu que a modalidade de residência fosse aceita como pós-graduação lato senso(6).

         O programa tem o objetivo de capacitar futuros enfermeiros obstétricos para serem inseridos no Sistema Único de Saúde (SUS). Os profissionais que entrarem no programa, ao final do mesmo estarão aptos a atuar desde o pré-natal e parto até o nascimento e pós-parto dentro do preconizado pela Rede Cegonha, que foi rebatizado em 2024 como Rede Alyne Pimentel. A estratégia criada visa reforçar a assistência integral e humanizada à saúde das mulheres e crianças, desde o planejamento reprodutivo, passando pela confirmação da gravidez, parto e nascimento seguro, puerpério, até o segundo ano de vida da criança com atenção ao crescimento e desenvolvimento(6-7).

         O combate da violência e a sua redução deve focar no processo de humanização nas instituições de saúde, com a participação de enfermeiras obstétricas (EO), respeitando a fisiologia do parto. Em um estudo transversal realizados por residentes de EO foi observado que fatores como: dieta livre, liberdade de movimentação, presença de acompanhante e uso de métodos não farmacológicos para o alívio da dor são mais utilizados quando o parto é assistido pela enfermeira obstétrica(8). Comprovando assim, que são esses profissionais que priorizam em suas práticas, a humanização e o respeito à fisiologia.

        Entende-se que, a percepção dos residentes de EO em relação as definições da “violência obstétrica” influenciam diretamente na forma do cuidado prestado à mulher, pois são profissionais que estão sendo inseridos no serviço para prestar o cuidado. Diante disso, a investigação da percepção dos mesmos é de suma importância para que a partir do entendimento sobre a problemática, as condutas sejam baseadas apenas em evidências e que os mesmos sejam agentes de mudança do cenário obstétrico atual, influenciando os profissionais já atuantes na área, mudando as práticas que não são mais recomendadas com o embasamento de pesquisas atuais.

            Desse modo, o objetivo do estudo se trata em compreender a percepção dos residentes de Enfermagem Obstétrica sobre a violência obstétrica.

 

MÉTODOS

 

Trata-se de um estudo descritivo exploratório, de abordagem qualitativa, realizado no programa de residência em enfermagem obstétrica de uma instituição de ensino superior do estado do Pará.

Os participantes do estudo foram vinte e três enfermeiros(as) (23) residentes em enfermagem obstétrica do 1° e 2° ano do programa. Foi realizado contato por aplicativo de mensagem, mediante a convite, e aqueles que aceitaram foi aplicado os seguintes critérios de elegibilidade: 1) ser enfermeiro(a); 2) estar matriculado na residência em enfermagem obstétrica da Universidade Federal do Pará. Os critérios de exclusão foram: residentes com licença ou em período de férias durante a coleta de dados. 

Após esse processo foi marcado a coleta de dados no período de aula teórica da residência, que ocorre na segunda-feira, entre junho a setembro de 2023, utilizando-se roteiro semiestruturado, com perguntas abertas e fechadas relacionadas ao perfil dos residentes sobre gênero, idade, religião, instituição formadora na graduação, ano de formação. O roteiro semiestruturado da entrevista se compôs de questionamentos básicos sobre o perfil dos residentes e questionamento sobre qual a percepção da violência obstétrica no campo do parto e nascimento, ou seja, a entrevista foi desenvolvida a fim de permitir a evolução espontânea do pensamento do participante.

            Todos os 23 enfermeiros abordados aceitaram participar da entrevista, tendo assim, aceitação de 100% dos enfermeiros abordados. As entrevistas foram realizadas em local tranquilo e com privacidade, a fim de evitar constrangimentos, com duração média de 30 minutos cada. A forma de obtenção da entrevista foi por meio de aparelho digital, mediante consentimento prévio de cada entrevistado, a fim de preservar a fidedignidade dos respectivos depoimentos.

As gravações dos depoimentos foram transcritas na íntegra pela pesquisadora principal, para garantir a fidedignidade do que os residentes relataram. Essas gravações e os respectivos textos serão armazenados por um período de cinco anos, sob a responsabilidade da pesquisadora, e após esse prazo, excluídos, como prevê a Resolução nº 466/12 do Conselho Nacional de Saúde.

Sendo assim, foi realizada a análise de conteúdo na modalidade temática, a organização da análise é formada por três etapas: 1) pré-análise, 2) exploração do material e 3) tratamento dos resultados, inferência e interpretação(9).

Os dados foram ordenados, com a transcrição das entrevistas na íntegra. Foi realizada uma leitura flutuante e agrupamento, submetendo à análise detalhada e exaustiva confrontando com a literatura científica. Em segundo plano, foi realizada a seleção das unidades de análise (unidades de significados - US), surgindo por meio da sua frequência (repetição de sentidos). Finalmente, na última fase do processo analítico, a identificação das unidades de significados possibilitou a última etapa da análise, a categorização dos elementos construtivos e o reagrupamento dos sentidos, com base na categorização não apriorística, que emergiu perante o contexto das respostas dos participantes, que fundamentaram a construção das categorias(9).

            Por intermédio do tratamento dos resultados, a inferência e interpretação permitiram a identificação das unidades de significação, a categorização dos elementos e reagrupamento de sentidos, com a elaboração das seguintes categorias: 1) Os significados da violência obstétrica em/na enfermagem; 2) O processo de trabalho da enfermagem obstétrica e as barreiras para o combate da violência; 3) A formação da enfermagem obstétrica: elo para mudança da violência obstétrica.

A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética e Pesquisa do Instituto de Ciências da Saúde da Universidade Federal do Pará, conforme o protocolo 5.739.983/2022, CAAE: 63246522.9.0000.0018, como preconiza a Resolução nº 466 de 12 de dezembro de 2012 do Conselho Nacional de Saúde, a qual determina as Diretrizes e Normas Regulamentadoras de Pesquisa envolvendo seres humanos.

Durante a técnica de coleta de dados foi realizada assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, termo que mostra a anuência em participar da pesquisa. Salientando o esclarecimento sobre temática; objetivos, técnicas, coleta de dados e análise dos dados, como os riscos, benefícios e demais assuntos correlacionados à pesquisa.  Para assegurar a privacidade e o sigilo quanto aos dados coletados, os participantes foram identificados pela letra R (residente), seguido de algarismo arábico (R1, R2, R3, ..., R23) para mencionar os participantes da pesquisa.

 

RESULTADOS

 

Dentre os participantes da pesquisa, 20 são do sexo feminino e 3 do sexo masculino; em relação a idade 15 pessoas predominaram na faixa etária de 23 < 25 anos, 6 entre 26 < 28 anos e 2 entre 33 < 38 anos. No que tange a formação dos profissionais, 15 são de instituição pública e 8 de instituição privada; de acordo com os anos de formação 12 pessoas possuem de 2 a 3 anos de formados e 11 pessoas 1 ano de formação.

 

Os significados da violência obstétrica em/na enfermagem

 

Os significados dos enfermeiros residentes em enfermagem obstétrica com a relação da violência obstétrica nos campos de prática que atuam, expressam numa situação oriunda do ciclo gravídico-puerperal, configurando em atitudes sustentadas na violência na atenção a pré-concepção, pré-natal, parto, puerpério e ao abortamento:

 

Para mim violência obstétrica é tudo aquilo que nós fazemos com a intenção ou sem a intenção de prejudicar uma paciente gestante [...] por exemplo: não prestar uma assistência de qualidade, não fornecer informações que essa paciente precise seja no pré-natal seja no primeiro atendimento no hospital ou em uma unidade de referência. (R3)

 

Eu acho que é todo aquele tipo de violação que venha roubar, retirar ou negligenciar o direito da mulher de ter uma assistência completa no seu período gravídico-puerperal e até mesmo no período antes da concepção, quando aquela mulher ela está querendo engravidar, eu acredito também que possa existir momentos de violência nessa assistência pré concepção, no planejamento familiar e tudo aquilo que venha fazer ela se sentir violada, constrangida, coagida [...] (R10)

         

Os significados dos residentes em EO proporciona formulação de estratégias de formação e também para a prática profissional, com novos profissionais no mercado de trabalho.

           A violência obstétrica se passa por uma relação direta do contexto do trabalho dos profissionais de saúde, possibilitando muitas vezes, a discriminação, negligência da assistência, violência verbal com a mulher:

 

Negligenciar uma dor que a paciente esteja sentindo, não apenas isso, mas também tem frases como: “Ah você aguenta, na hora de fazer você não chorou, você não gritou” “Ah isso é normal, essa dor é normal” é: “você tem que relaxar” (R6)

 

Eu vejo uma violência muito grande na forma de lidar com os pacientes, no acolhimento, na forma de conversar. Eu estou vindo agora de uma urgência e emergência obstétrica e a gente vê alguns profissionais né, da área da obstetrícia não tendo o menor tato para falar com as mulheres sendo grosseiros ao lidar com elas (R2)

 

A violência obstétrica, umas das suas nuances correspondente para além do componente físico, mas no campo psicológico, sexual, institucional e estrutural:

 

Para mim violência obstétrica é o contrário de humanização então são atos dos profissionais que podem agredir o binômio tanto a mulher quanto o bebê que também no caso a violência obstétrica né, aí violência seria outro assunto então no caso a mulher durante o parto...então eu acho que são atos que a equipe pode ter equivocados, podem agredir a mulher de várias maneiras, tanto físico quanto emocional quanto psicológico sim e também a família, não só a mulher porque eu acho que isso influencia muito a rede de apoio dela (R4)

 

Isso acaba sendo um tipo de violência, porque você acaba invadindo a privacidade da mulher, por exemplo entrando em um quarto PPP com dez alunos, isso é muito comum, então eu acho que só o fato de estar cheio de alunos e residentes isso aí isso já é um tipo de violência obstétrica (R8)

 

Os residentes mencionam que a violência obstétrica se estabelece além da violência física, mas psicológica, sexual, institucional e estrutural, que se estabelece na prática profissional e também das normativas institucionais. Essas normas e prática sustentam uma violência que se torna velada junto ao ambiente obstétrico.

A violência também é expressa nos residentes de enfermagem obstétrica, sugestivo do processo de trabalho de profissionais médicos e enfermeiros, com as intervenções obstétricas, como a episiotomia, manobra de Kristeller, toques excessivos, uso de ocitócitos de rotina ou sem o consentimento da parturiente, com o intuito de acelerar o parto, e não agir conforme a fisiologia da parturição, agindo conforme sua condição ideológica:

 

Fazer toque sem informar que vai fazer toque, tocar na mulher, na barriga sem avisar que vai fazer, pedir para que ela faça força sem estar de fato em trabalho de parto ativo e ter a necessidade e a própria episiotomia (R16)

 

Proibir o acompanhante da escolha da gestante, episiotomia, é não fornecer analgesia quando ela pedir, ou impedir da gestante de se movimentar durante o trabalho de parto, é a separação da mãe e do bebê, não esperar o contato pela pele. (R23)

 

A negação dos direitos das mulheres quanto a uma parturição de forma ativa, quanto aos seus direitos de uma experiência positiva e exitosa, como a livre posição do parto; a expressão de seus sentimentos oriundos do nascer; o afastamento por rotinas protocolares o recém-nascido após o nascimento, significados que perpassam pela violência obstétrica:

 

A posição de parto, quando é um parto assistido por enfermeiros você vê a liberdade da mulher, agora quando é um parto assistido pela equipe médica ou por alguns outros obstetras você vê aquela posição ginecológica sendo imposta ali, porque é mais fácil para o profissional, é mais cômodo. (R12)

 

Impedir a mulher de mudar de posição, de expressar o que ela está sentindo né, o próprio grito, pedir para ela fazer silêncio, negligenciar o apoio, que ela beba água, que ela se movimente, acho que também é tipo olhar feio, tudo isso. (R13)

 

Os discursos dos enfermeiros residentes em obstetrícia, afirma a existência da violência obstétrica no seu cotidiano nos campos de prática em que atuam, com uma violência ocasionada pela práxis profissional:

 

Ali no próprio trabalho de parto a gente acaba vendo algumas situações onde a mulher não tem escolha do que ela quer fazer no próprio trabalho de parto, as vezes por ela não ter tido esse esclarecimento ali no pré-natal né, mas as vezes a gente vê que acaba sendo mais confortável para o profissional em si a forma como está acontecendo né e algumas outras situações (R2)

 

Olha o maior que eu vejo assim todo dia mas as vezes até eu acabo cometendo também mas é muito difícil eu acho tento me policiar bastante [...] é aquele colocar o dedo no períneo assim, aquele movimento circular para ajudar o bebê a vim né, tanto médico quanto os enfermeiros (R7)

 

O processo de trabalho da enfermagem obstétrica e as barreiras para o combate da violência

 

       Dentre os fatores que prejudicam a integralização de uma assistência mais humanizada estão a falta de interesse na atualização profissional, conservadorismo e a não aceitabilidade por parte dos profissionais de saúde sobre as práticas violentas, conforme os depoimentos:

 

A falta de atualização da equipe, falta de atualização da gerência, falta de atualização dos protocolos, falta de atualização da equipe multidisciplinar e a falta de informação para os pacientes, não que não tenha informação, mas a falta de informação dos profissionais para o paciente. (R3)

 

Acho que um dos maiores obstáculos mesmo é aqueles profissionais que já estão há muito tempo no serviço e eles acabam não se atualizando ou criando vícios de profissão entendeu, e muitas das vezes não conseguem observar que aquela prática ela não é mais aceita, ela não é mais digamos que necessária entendeu (R20)

 

           A precariedade nos serviços de pré-natal com a falta de acesso a informação para as gestantes sobre a violência obstétrica, vulnerabilizando-as durante o parto e nascimento.

 

 Eu acredito um pré-natal não eficaz, que é pré-natal onde a gente vai tirar todas as dúvidas da mulher, onde a gente vai apresentar para ela todas essas situações, profissionais também que não procuram ver a mulher pelo lado mais humanizado, é uma cultura mais humanizada em relação a isso acho que principalmente esses assim, a questão da atenção primária mesmo durante o pré-natal, de expor pra mulher toda essa situação (R15)

 

O desconhecimento das gestantes sobre a violência obstétrica, provocando maior hierarquia profissional e sobreposição do conhecimento, que contribui para uma relação mais verticalizada e detenta de relações de poder oriundas do profissional de saúde com a mulher, conforme os depoimentos:

 

Primeiro eu acho que o desconhecimento das pacientes, das gestantes, dos seus acompanhantes né também do que seria a violência obstétrica né, as vezes as mulheres elas têm os seus direitos suprimidos, elas são desrespeitadas, mas elas não sabem que estão sendo desrespeitadas né, elas estão naquele momento vulnerável (R19)

 

A impunidade e a falta de leis que protegem a mulher durante o período gestacional é uma das barreiras mais desafiadoras para garantir o fim da violência obstétrica. Uma solução tangível é incentivar a denúncia nas ouvidoras, que garantiria mais transparência para casos de violência, conforme os depoimentos:

 

Havendo punição né, a verdade é que essas práticas existem até hoje porque há um sentimento de impunidade, é não importa se a mulher está sofrendo com o que ela está passando isso faz parte do trabalho de parto normal, as mulheres estão passando por violências obstétricas e elas acham que isso faz parte do trabalho e não é parte do trabalho de parto é porque na verdade é um sistema que deixa as mulheres as vezes parece até intencionalmente desinformadas, a gente acaba vendo muito esse tipo de situação pela própria desinformação (R2)

 

Um documento respaldando de fato a cada conduta que foi realizada e a justificativa para que tivesse uma melhor fiscalização (R16)

 

        O processo educativo, com as gestantes com a educação em saúde se torna uma importante estratégia para o enfrentamento da violência obstétrica, e disseminação de um conhecimento, por meio de trocas compartilhadas e diálogo entre o profissional e a mulher. Este fato contribui para que a mulher esteja informada, e empoderada quanto aos seus direitos para uma assistência segura e exitosa.

 

Eu acho que desde o pré-natal a gente informar a mulher, informar a família, sempre tentar estimular que o parceiro vá para o pré-natal, informar sobre a violência, quais são os atos de violência obstétrica e preparar ela (R4)

 

A formação da enfermagem obstétrica: elo para mudança da violência obstétrica

 

A necessidade de discussão sobre a violência obstétrica, deve começar nos processos formativos, nas Universidades. O meio acadêmico deve iniciar esse campo de discussão, para propiciar reflexão e um nova ressignificação com as situações vivenciadas pelas mulheres e um novo sentido do processo de trabalho. Mas, a formação da graduação, ainda não focalizou temas importantes, como a violência obstétrica, para assim, promover uma discussão ampliada, sendo muitas vezes ocorre na especialização, o debate, pela vivência cotidiana no meio do cuidado:

 

Eu acho que assim na graduação, na academia, tem uma fragilidade muito grande em mostrar, de ofertar, de possibilitar uma formação assim mais crítica assim, que os assuntos sejam mais abordados. (R21)

 

A limitação da autonomia dos residentes e o poder exercido dentro dos espaços de autoridade, como as maternidades, este processo fomenta a inércia, mas que não é totalmente impeditivo do agir da profissional:

 

A gente não tem muito a autonomia em relação a isso e ver uma intervenção que seria a violência e fazer alguma coisa na hora, a gente só fica refletindo sobre, mas na hora a gente não consegue fazer porque eles não dão autonomia pra a gente intervir, as vezes até uma paciente que a gente está assumindo aí entra outro profissional e começa a intervir, aí não tem muita autonomia em relação a isso. (R9)

 

Acho que a maior para mim foi a que eu me deparei, o fato de nós não termos uma voz ativa na equipe de poder conduzir, isso é errado a gente sente como se fôssemos internos, graduandos, alunos ainda de faculdade porque a gente não pode se posicionar como profissional (R10)

 

A gente não consegue fazer muita coisa pelo fato de a gente ser residente e não atuar de fato naquele campo. A gente chega e faz, se a gente questionar alguma prática é como se fosse uma ofensa pra eles [...] a gente não tem liberdade de atuação, a gente faz de acordo com o que o nosso preceptor acha correto, quando a gente muda de preceptor já é uma outra atitude a gente tem que se adaptar de acordo com o preceptor (R1)

 

A rotatividade nos campos de prática dos enfermeiros residentes torna-se como obstáculo para a aceitação da equipe, em um curto período, favorecendo a hierarquia e o bloqueio profissional:

 

O residente querendo ou não ele é como se fosse uma visita ali no local de trabalho, o meu vínculo não é com aquela instituição que eu estou, o meu vínculo é com a UFPA então como residente eu não tenho muito o que fazer (R2)

 

Olha é a hierarquia né, dos maiores que mandam e a gente que está lá embaixo na pirâmide não pode fazer nada, então a gente não pode ir contra o preceptor porque a gente pode acabar sendo prejudicado na nossa avaliação ou na hora da convivência durante o período naquele setor (R7)

 

      Dentre os benefícios da residência para a formação da EO estão o resgate ao protagonismo e autonomia da mulher dentro dos serviços de saúde, sendo assim, estimular práticas humanizadas com base nas evidências científicas reduz as chances de práticas violentas no ambiente das maternidades, conforme os depoimentos:

 

Eu acho que a formação de enfermeiros obtétricos que está baseada nisso, numa técnica não intervencionista, mais humanizada (R9)

 

A enfermagem ela tem sido sim pioneira nessa questão de mudar essa assistência ao parto, trazer um olhar mais humanizado mais individual para aquela mulher (R10)

 

       A constante atualização proporciona tanto para o residente que está em constante aprendizado quanto para o serviço a atualização profissional, novos conhecimentos e integração para com a equipe através da educação continuada, conforme os depoimentos:

 

É a gente como residente a gente tem essa autonomia de fazer uma prática de educação em saúde né com a equipe então a gente traz meios novos então nós somos uma pessoa nova na equipe na verdade, então a gente consegue trazer meios novos, estudos novos, nos atualizar porque a gente está construindo nossos conhecimentos então eu acho que por meio da educação em saúde (R4)

 

Quando a gente faz os estímulos do residente por meio desses debates e por meio de rodas de conversas, estudo de caso, coisas que aconteceram em outras assistências, a gente amplia o olhar desse residente né e faz com que ele faça parte do sistema e modifique aquela realidade (R17)

 

DISCUSSÃO

 

A violência obstétrica é consequência do não pertencimento ao próprio corpo e aos fenômenos a ele relacionados.  A partir dessa intervenção, a mulher sente-se objetificada, submissa ao saber profissional, desrespeitando o processo fisiológico, retirando assim, seu protagonismo durante a gestação, parto e puerpério(10).

            Para os enfermeiros residentes e os seus significados vão para além da violência obstétrica majoritariamente no parto. Pois, esses significados detona a importante de discussão do tema na formação, e assim potencializar mudanças para o exercício de novos profissionais no mercado de trabalho. Desse modo, um profissional alinhado com práticas saudáveis, com base nas evidencias científicas, no respeito e humanização repercute positivamente na qualidade da assistência.

No que se refere aos conhecimentos a respeito da violência obstétrica, foi relatado que ela abrange toda assistência e desrespeito as mulheres no abortamento, mostrando que não constitui uma prática restrita a intervenções, que promovem uma ausência de cuidado com a mulher, desrespeitando e promovendo inúmeras situações, comportamentos e práticas caracterizadas como violência obstétrica. A humanização de todo o processo de gestação, parto, puerpério e até o aborto deve ser respeitado e sempre prevalecendo a vontade e protagonismo da mulher, visto ser um momento único que ficará marcado na memória, seja por uma assistência positiva ou negativa, e assim, deve ser vivenciada de maneira mais respeitosa e humana.

Dentre os fatores a serem considerados na violência obstétrica, ela está compreendida todo ciclo gravídico-puerperal, englobando toda gestação, parto e puerpério, além do abortamento. Em uma pesquisa realizada com os residentes, a violência obstétrica pode ser definida como maus-tratos físicos, psicológicos e verbais, ou ainda, como práticas intervencionistas desnecessárias(11), que traz dados similares quanto ao tema da violência obstétrica. Ela se origina a partir do momento que o profissional não respeita as vontades e decisões da mulher, além de não priorizar o processo fisiológico que é a gestação, parto e puerpério.

A principal característica da violência obstétrica é ser praticada por profissionais de saúde, manifestando-se por meio do tratamento desumanizado e do abuso da medicalização da assistência, patologizando processos reprodutivos naturais do organismo feminino(12). Isso reflete nos serviços prestados à mulher atualmente e os seus significados sobre a assistência e processo de cuidado de todo ciclo gravídico-puerperal, visto que muitas já compreenderam e esperam que esse processo de violência seja modificado, decorrente na assistência das instituições de saúde.

           Em relação as intervenções presentes nas práticas dos enfermeiros residentes, foi possível observar a presença da episiotomia na maioria dos relatos. Prática que ainda é muito comum nas maternidades apesar de já haverem evidências científicas provando a não necessidade de rotina. Por outro lado, em partos assistidos por enfermeiras obstétrica já é possível observar a diminuição ou a erradicação dessa intervenção para prestar assistência ao parto.

        A episiotomia é uma das causas mais frequentes de morbidade materna no puerpério, visto que expõe a mulher ao aumento de perda sanguínea (hemorragia), risco de infecção, disfunção sexual como a dispareunia, incontinência urinária, prolapso vaginal, entre outras alterações quando comparada a outros tipos de trauma perineal(13).

Um dos principais desafios relatados pelos enfermeiros residentes a respeito do enfrentamento à violência obstétrica está a falta de aceitabilidade à mudança por parte dos profissionais. A negação da necessidade da atualização profissional e o conservadorismo torna o caminho à mudança mais desafiador. Pois, apenas o ensino não compete de forma efetiva nas mudanças de prática desnecessária, isso vai além do conhecimento, mas se passa no ideário de cada profissional de saúde e sua visão de mundo, para assim garantir uma forma de assistência obstétrica.

Desse modo, um profissional pode obter um conhecimento positivo na sua formação ou ainda na educação permanente em saúde, mas ainda suceder práticas desnecessária, visto que não há o devido envolvimento e o respeito quanto a mulher e para a qualidade assistencial. Torna-se cada vez mais, que as mulheres e profissionais estejam atuantes para o enfrentamento de condutas desrespeitosas e desalinhadas com um parto positivo. Pois, mesmo reconhecer a violência obstétrica, não condiz em mudança, assim o alinhamento com o tema e com o cuidado das mulheres permite que os profissionais sejam compromissados com o seu dever e missão para um cuidado respeitoso e de qualidade.

Nesse sentido, um ponto importante é saber o reconhecimento da autonomia da mulher, com o campo de poder. Esse reconhecimento é crucial para mudança cotidianas no processo de trabalho e assistencial no âmbito do parto e nascimento.

       Em um estudo realizado com 20 enfermeiros obstétricos, foi possível observar que um dos entraves para a melhoria da assistência na obstetrícia foi a falta de interesse e atualização profissional, incluindo ausência de técnicas e práticas para o cuidado à mulher. O despreparo profissional torna a assistência obstétrica pautada em achismos e formação desatualizada, postergando a mudança no cenário obstétrico. Perante isso, se dá a indubitável necessidade de treinamento profissional, a partir de capacitações, oficinas e palestras para a melhoria no cuidado à mulher(14).

        Diante disso, é possível compreender a necessidade de Educação Permanente em Saúde (EPS) com o intuito de colocar em prática, os objetivos de transformação e ressignificação da prática obstétrica, como determina a Rede Alyne Pimentel. Ainda mencionam que a EPS promove a autonomia do enfermeiro em sua práxis, uma vez que essa formação repercute diretamente no aperfeiçoamento profissional e na qualidade da assistência prestada às usuárias do SUS(15).

           Realizar a educação com o objetivo de transportar o conhecimento prévio à mulher e sua família a respeito da violência obstétrica, a fim de educar sobre as fases do trabalho de parto, sobre as dores e os métodos não farmacológicos e as práticas não mais recomendadas na assistência ao parto e puerpério(16). Como ferramenta crucial para educação em saúde no pré-natal está o plano de parto, documento que tem o objetivo de garantir os diretos da mulher e expressar suas vontades e desejos no momento do parto, preservando seu protagonismo.

Por meio dos significados dos residentes, foi possível observar que atualmente a formação profissional ainda precisa de avanços, a maior parte dos enfermeiros residentes relatou e observou que as abordagens a respeito da violência obstétrica principalmente na graduação são insuficientes, poucos tiveram acesso ao tema ainda no meio acadêmico. Relacionado a especialização através da residência em enfermagem obstétrica, alguns relataram acesso através de debates informais nas instituições de prática, porém ainda assim é um conhecimento pouco difundido na especialização. Dentre os relatos, alguns afirmaram a busca desse conhecimento através de cursos de aprimoramento e congressos que abordaram o tema.

       Dentre os desafios da residência para o combate da violência obstétrica, a totalidade dos enfermeiros entrevistados relataram a falta de autonomia como principal obstáculo para atuação profissional frente uma situação de violência, dificultando o posicionamento frente as situações vivenciadas nos campos de prática.

         A residência em enfermagem obstétrica oportuniza que a atuação dos enfermeiros se dê em diversos campos, desde a atenção primária com a assistência ao pré-natal, média complexidade no pré-natal de alto risco, e atenção terciária nos hospitais com o cuidado à mulher no parto, nascimento e puerpério e atenção ao recém-nascido, garantindo assim a integralidade da assistência e acompanhamento(16).

              Com isso, destaca-se a importância da enfermagem obstétrica para o combate da violência, desde medidas de educação em saúde no pré-natal, quanto na assistência ao parto, utilizando medidas não intervencionistas, respeitando o protagonismo da mulher e a fisiologia do parto, emponderando-a sobre atitudes e práticas não recomendadas, com o intuito de reduzir danos a mesma.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

          Por meio do estudo podemos compreender o significado dos enfermeiros residentes em relação a violência obstétrica, o reconhecimento das práticas não recomendadas no processo de formação e suas implicações para a saúde da mulher. O reconhecimento da enfermagem sobre as práticas e técnicas realizadas para com as mulheres no atual modelo obstétrico, que não possuem fundamentação científica, nem tampouco são recomendadas.

        Com isso, salientamos que as medidas citadas pelos entrevistados para o enfrentamento e combate da violência contra a mulher no campo do parto e nascimento vão desde uma boa assistência no pré-natal com medidas de educação à gestante, acompanhante, familiares e comunidade em geral, até a recepção nos hospitais e maternidades de escolha da mulher, tendo em vista sempre o cuidado holístico e humanizado, com a figura da mulher no protagonismo do seu próprio parto. Por conseguinte, os profissionais da saúde possuem papel indispensável em fazer parte desse processo como coadjuvantes e ajudadores, disponíveis a garantir o direito da mulher durante todo o período.

          Ademais, foi mencionado pelos residentes a importância da criação de uma Lei específica para proteger contra atos violentos na gestação, parto e puerpério, apesar de já existirem políticas públicas como a rede cegonha e recomendações de boas práticas, as leis de violência contra à mulher que a amparam legalmente, os infratores que praticam tal ato não sentem-se ameaçados, visto que a mulher tem medo e receio de realizar a denúncia pelo fato da classe predominante que realiza as práticas possuir maior segurança e proteção dos órgãos, tornando assim mais uma vez a mulher vulnerável sobre seu próprio corpo. Punir os profissionais que realizarem atos violentos à mulher, desde a violência verbal até a física assegurará a elas os seus direitos.

         Relacionado à prática profissional do residente, é de suma importância a promoção de maior autonomia dentro dos cenários, para que o mesmo seja um facilitador do cuidado humanizado, com o objetivo de empoderar mulheres e assumir seu papel como parte fundamental dentro da equipe. Para tanto observa-se a necessidade de uma reorganização no que diz respeito ao tempo mínimo de cada setor, para proporcionar um melhor acolhimento e aceitação por parte dos profissionais da equipe.

         Sobre as práticas, foi evidenciado que os residentes ainda observam nos seus campos de prática atos violentos, palavras ofensivas à mulher e retirada dos seus diretos como a proibição do acompanhante ou negação de atendimento nas maternidades, mostrando que essas atitudes ainda necessitam de mudança por meio das ações de combate à violência.

          Notou-se também que a enfermagem é fundamental para o combate à violência, visto que é a ciência pautada na humanização do cuidado, onde atualmente vem ganhando mais espaço por meio de movimentos e práticas humanizadas, o acolhimento, respeito à vontade da mulher e a educação em saúde são imprescindíveis para o combate e mudança do atual modelo. Além da assistência colaborativa com os demais profissionais de saúde, que juntos possuem o objetivo de prestar a melhor assistência ao binômio mãe-filho.

         Enfim, a pesquisa proporcionou explorar os significados dos residentes em enfermagem obstétrica sobre a violência obstétrica, além de destacar os desafios e a importância dela para a mudança do atual cenário, visto que o enfermeiro residente é o futuro enfermeiro obstétirco que atuará nas instituições com o objetivo de promover um cuidado integral e respeitoso à mulher.  Por isso, se dá a importância da formação do residente na ótica da violência obstétrica.

 

REFERÊNCIAS

 

 

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Rev Enferm Atual In Derme 2025;99(1): e025010                    

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