ARTIGO ORIGINAL
FATORES ASSOCIADOS AO ESTRESSE, ANSIEDADE E DEPRESSÃO ENTRE PROFISSIONAIS DE ENFERMAGEM PÓS-PANDEMIA POR COVID-19
FACTORS ASSOCIATED WITH STRESS, ANXIETY AND DEPRESSION AMONG NURSING PROFESSIONALS POST-COVID-19 PANDEMIC
FACTORES ASOCIADOS AL ESTRÉS, LA ANSIEDAD Y LA DEPRESIÓN ENTRE PROFESIONALES DE ENFERMERÍA POST PANDEMIA DE COVID-19
https://doi.org/10.31011/reaid-2024-v.99-n.4-art.2251
1Edilene dos Santos Dias
2Gleicy Kelly Teles da Silva
3Reginaldo Passoni dos Santos
4Tarcísio Vitor Augusto Lordani
5Ariana Rodrigues da Silva Carvalho
1Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE), Cascavel, Brasil. Orcid: 0000-0001-7141-7194.
2Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE), Cascavel, Brasil. Orcid: 0000-0001-7988-7553.
3Hospital Universitário do Oeste do Paraná (HUOP), Cascavel, Brasil. Orcid: 0000-0002-7526-2510.
4Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE), Cascavel, Brasil. Orcid: 0000-0002-9997-6809.
5Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE), Cascavel, Brasil. Orcid: 0000-0002-2300-5096.
Autor correspondente
Ariana Rodrigues da Silva Carvalho
Rua Minas Gerais, 2161 – Centro, Cascavel – PR, 85812030. Contato: +55 (45) 99973-4213. E-mail: arscarvalho@gmail.com.
Submissão: 04-05-2024
Aprovado: 28-10-2024
RESUMO
Introdução: durante a pandemia, as fragilidades do sistema refletiram negativamente na saúde mental da equipe de saúde que atuou na linha de frente. Objetivo: identificar os fatores associados ao estresse, ansiedade e depressão entre profissionais de enfermagem, um ano após o início do enfrentamento à pandemia causada pela COVID-19. Métodos: estudo exploratório e transversal, realizado com profissionais de enfermagem de uma unidade específica para cuidados aos acometidos pela COVID-19. Foi utilizado questionário sociodemográfico e laboral, além de uma escala para avaliação da ansiedade, depressão e estresse já validada no Brasil. Resultados: dos 106 participantes, houve predomínio de mulheres (87,7%), técnicos de enfermagem (77,4%), com idade média de 36,7 anos. Entre os profissionais avaliados, 49,5% apresentaram ansiedade, 49,5% depressão e 35,84% estresse. Esses transtornos mentais comuns estiveram associados à categoria profissional, vínculo empregatício, sobrecarga de trabalho, satisfação e motivação no trabalho. Conclusão: Os fatores associados à ansiedade, estresse e depressão, entre profissionais de enfermagem que atuam no enfrentamento da COVID-19, um ano após o início da pandemia, estiveram atrelados à categoria profissional, idade, tipo de regime trabalhista, tempo de serviço na profissão, sobrecarga de trabalho, satisfação e motivação no trabalho.
Palavras-chave: Estresse; Ansiedade; Depressão; Profissional de Enfermagem.
ABSTRACT
Introduction: during the pandemic, the weaknesses of the system had a negative impact on the mental health of frontline healthcare workers. Objective: to identify factors associated with stress, anxiety, and depression among nursing professionals, one year after the start of the COVID-19 pandemic response. Methods: An exploratory and cross-sectional study conducted with nursing professionals from a specific unit caring for COVID-19 patients. A sociodemographic and work-related questionnaire was used, along with a scale for assessing anxiety, depression, and stress already validated in Brazil. Results: of the 106 participants, there was a predominance of women (87.7%), nursing technicians (77.4%), with an average age of 36.7 years. Among the professionals assessed, 49.5% showed anxiety, 49.5% depression, and 35.84% stress. These common mental disorders were associated with professional category, employment status, workload, job satisfaction, and motivation. Conclusion: factors associated with anxiety, stress, and depression among nursing professionals working in the COVID-19 response, one year after the pandemic's onset, were linked to professional category, age, type of employment regime, length of service in the profession, work overload, satisfaction and motivation at work.
Keywords: Stress; Anxiety; Depression; Nursing Professionals.
RESUMÉN
Introducción: Durante la pandemia, las debilidades del sistema tuvieron un impacto negativo en la salud mental de los trabajadores de la salud en primera línea. Objetivo: Identificar los factores asociados con el estrés, la ansiedad y la depresión entre los profesionales de enfermería, un año después del inicio de la respuesta a la pandemia de COVID-19. Métodos: Estudio exploratorio y transversal realizado con profesionales de enfermería de una unidad específica que atiende a pacientes con COVID-19. Se utilizó un cuestionario sociodemográfico y laboral, junto con una escala para evaluar la ansiedad, la depresión y el estrés ya validada en Brasil. Resultados: De los 106 participantes, predominaron las mujeres (87.7%), técnicos de enfermería (77.4%), con una edad promedio de 36.7 años. Entre los profesionales evaluados, el 49.5% mostró ansiedad, el 49.5% depresión y el 35.84% estrés. Estos trastornos mentales comunes estuvieron asociados con la categoría profesional, el estado laboral, la carga de trabajo, la satisfacción laboral y la motivación. Conclusión: Los factores asociados con la ansiedad, el estrés y la depresión entre los profesionales de enfermería que trabajan en la respuesta a la COVID-19, un año después del inicio de la pandemia, estuvieron vinculados a la categoría profesional, la edad, el tipo de régimen laboral, la antigüedad en la profesión, el trabajo Sobrecarga, satisfacción y motivación en el trabajo.
Palabras clave: Estrés; Ansiedad; Depresión; Profesionales de Enfermería
INTRODUÇÃO
Durante a pandemia causada pela COVID-19, profissionais de enfermagem e saúde como um todo ficaram expostos à grandes pressões, em ambientes fechados, com longas jornadas de trabalho, fadiga física e mental e medo de contaminação que, juntamente com questões, impactaram diretamente nos níveis de estresse, ansiedade, depressão(1-3).
Nos últimos anos, devido à COVID-19, o sistema de saúde brasileiro estive à beira do colapso(4-5) e, inevitavelmente, as fragilidades do sistema refletiram negativamente na saúde mental da equipe de saúde que atuou na linha de frente, com destaque aos profissionais de enfermagem, dado o protagonismo exercido pelos trabalhadores dessa categoria durante o período pandêmico(6-7).
Diante do contexto, o Conselho Federal de Enfermagem (COFEN) instituiu uma série de ações, com a intenção de minimizar a carga de transtornos mentais comuns, tais como estresse, ansiedade, depressão e esgotamento emocional, apresentados pela enfermagem durante o enfrentamento da COVID-19. Nesse sentido, faz mister destacar que tais ações só se efetivaram após o delineamento das principais necessidades de cuidado em saúde mental apresentada pela categoria(8).
Logo que se declarou a COVID-19 como pandemia inúmeros estudos foram desenvolvidos e publicados retratando seu impacto na qualidade de vida e na saúde mental dos profissionais que estavam atuando na linha de frente. A despeito disso, a medida em que a pandemia foi se estendendo ao longo do tempo, a literatura científica foi se tornando limitada e pouco se encontra quando se analisa o impacto da COVID-19 na saúde mental dos profissionais de enfermagem após sua instalação a longo prazo.
Medo do desconhecido, despreparo do sistema de saúde e, até mesmo, das equipes assistenciais, incertezas quanto à contaminação cruzada, extenuante carga laboral devido à inexistência de mão de obra suficiente, dentre outros, foram alguns dos aspectos que corroboraram com a ocorrência de episódios de estresse, ansiedade e depressão entre os profissionais de enfermagem no início da pandemia(1-3).
O conhecimento desses fatores contribuiu de modo ímpar no estabelecimento de medidas de cuidados àqueles que cuidam(7-8). No entanto, a questão que norteou o desenvolvimento do presente estudo foi: quais os fatores associados à presença de transtornos mentais comuns na equipe de enfermagem da linha de frente, no período pós-pandemia? Para responder tal questão, propôs-se o desenvolvimento do estudo em tela com o seguinte objetivo: identificar os fatores associados ao estresse, ansiedade e depressão entre profissionais de enfermagem, um ano após o início do enfrentamento à pandemia causada pela COVID-19.
MÉTODOS
Trata-se de um estudo exploratório e transversal, seguindo as diretrizes Strengtening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology (STROBE). A pesquisa foi desenvolvida na unidade COVID-19 de um Hospital Universitário (HU) do sul do Brasil, referência para o tratamento da doença. Tal unidade possui 70 leitos de terapia intensiva, divididos em duas unidades: uma com 30 leitos e outra com 40, destinados exclusivamente a atender pacientes acometidos pela COVID-19. O HU tem capacidade de, aproximadamente, 250 leitos, com atendimentos voltados exclusivamente ao Sistema Único de Saúde (SUS).
Os dados foram coletados entre maio e julho de 2021. A população do estudo envolveu toda a equipe de enfermagem que estava trabalhando, no mínimo, há um mês na unidade em tela, sendo que o único critério de exclusão foi estar afastado do trabalho, independente do motivo, durante o período do estudo. Utilizou-se o software G-power para o cálculo de uma amostra probabilística com margem de erro de 10%, nível de 95% de confiança e proporção de 50% da população.
Foi elaborado um formulário eletrônico, contendo os instrumentos de coleta de dados, encaminhados via email e/ou aplicativo de mensagem aos participantes, abrangendo dados sociodemográficos e laborais, bem como uma escala de avaliação da ansiedade, depressão e estresse (Depression Anxiety Stress Scales - DASS-21)(9). O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido apresentava duas opções (sim/não), após resposta positiva, os participantes eram encaminhados à página do questionário, integralmente.
Para a caracterização sociodemográfica e laboral dos participantes foram solicitados os seguintes dados: sexo, idade, estado civil, escolaridade, profissão, carga horária de trabalho semanal, tempo de formação, tipo de contrato de trabalho, experiência em UTI e se possui outro vínculo empregatício. Também foi avaliado o nível de satisfação e motivação laboral por meio de escala numérica de zero a dez, em que “zero” representava “nada satisfeito/motivado”, e “dez”, “completamente satisfeito/motivado”.
A escala DASS-21(10) é composta por três subescalas (ansiedade, depressão e estresse), que consideram sensações e sentimentos vivenciados pelo respondente nos sete dias antecedentes à sua avaliação. Tal escala é autoaplicável, composta por 21 questões, sendo três grupos de sete perguntas cada, com respostas do tipo Likert de quatro pontos para cada subescala, variando de 0 = “não se aplicou de maneira alguma” a 3 = “aplicou-se muito ou na maioria do tempo”. O resultado é obtido pela soma dos escores dos sete itens para cada uma das três subescalas(9-10). As notas mais elevadas em cada escala correspondem a estados afetivos considerados “muito grave”. O escore total para cada subescala, bem como a classificação das três condições (ansiedade, depressão e estresse) como normal, leve, moderado, grave e muito grave, foram calculados seguindo as orientações dos autores do instrumento (9-11).
Os dados coletados foram convertidos para uma planilha no Microsoft® Excel 2010, onde foram compilados e, em seguida, processados e analisados pelo Statistical Package for the Social Sciencies (SPSS) versão 26.0. Os testes de Shapiro-Wilk e Teste de Levene foram utilizados para analisar a distribuição da amostra, no que diz respeito à normalidade e homoscedasticidade, respectivamente. Ocorreram análises descritivas para todas as variáveis, por meio de medidas de proporção percentual para as variáveis categóricas; e por medidas de tendência central e de dispersão para variáveis contínuas.
Os valores para as subescalas da DASS-21 foram apresentados de forma contínua (média±D.P., mediana, amplitude) e categórica (normal, leve, moderada, grave e extremamente grave). Adicionalmente, essas variáveis politômicas foram recodificadas para dicotômicas (Sim/Não).
Como forma de identificar os fatores associados à presença (ou não) de ansiedade, depressão e estresse foram aplicados testes estatísticos, de acordo com o comportamento da variável: contínua (teste t de Student/Mann Whitney) ou categórica (qui-quadrado). Considerou-se o nível de significância de 0,05. A confiabilidade da escala DASS-21, testada com dados da amostra do presente estudo, foi avaliada pela consistência interna dos seus itens, medida pelo Coeficiente de Alfa de Cronbach, sendo considerados com evidência de confiabilidade os valores acima de 0,70.
O presente estudo é recorte de um projeto matricial intitulado “Qualidade de vida relacionada à saúde e suas vertentes: investigação do impacto positivo e negativo sobre a vida diária do ser humano” aprovado por Comitê de Ética em Pesquisa institucionalizado, sob parecer nº 2.588.565, CAAE 84505918.6.0000.0107, em 09 de abril de 2018, Emenda sob Parecer nº 4.025.567, de 13 de maio de 2020. Foram seguidas as normas da Resolução n° 510/2016 do Conselho Nacional de Saúde(12).
RESULTADOS
Dos 230 profissionais de enfermagem atuantes na Unidade de Terapia Intensiva (UTI), específica para cuidados relativos à COVID-19, 106 (46,8%) aderiram ao estudo, compondo a amostra da pesquisa. Do total de participantes, 93 (87,7%) eram do sexo feminino, com idade média de 36,4 anos, predominantemente casados/união consensual (58,6%). Dentre esses profissionais, 82 (77,4%) eram técnicos de enfermagem, trabalhavam em média 38,9 horas semanais, contratados por meio de Processo Seletivo Simplificado (PSS) (65,1%); 60,4% deles com experiência prévia em UTI e 64,2%, com mais de um vínculo trabalhista. Na avaliação dos níveis de satisfação e motivação para o trabalho desses profissionais, apresentaram uma média de 7,75±2,24 e 7,75±2,24, respectivamente, variando de um a dez (Tabela 1).
Tabela 1 - Caracterização sociodemográfica e laboral dos participantes do estudo (n=106). Cascavel, PR, Brasil, 2021
Variáveis |
n (%) |
Média±D.P. |
Mediana |
Intervalo |
Sexo |
|
|
|
|
Feminino |
93 (87,7) |
|
|
|
Masculino |
13 (12,3) |
|
|
|
Idade (anos) |
|
36,74±8,21 |
37,5 |
21 a 53 |
≤ 30 |
25 (23,6) |
|
|
|
31 a 40 |
38 (35,8) |
|
|
|
41 a 50 |
39 (36,8) |
|
|
|
> 50 |
4 (3,8) |
|
|
|
Estado civil |
|
|
|
|
Casado/união consensual |
62 (58,5) |
|
|
|
Solteiro |
33 (31,1) |
|
|
|
Divorciado |
10 (9,4) |
|
|
|
Viúvo |
1 (0,9) |
|
|
|
Profissão |
|
|
|
|
Auxiliar de Enfermagem |
2 (1,9) |
|
|
|
Técnico em Enfermagem |
82 (77,4) |
|
|
|
Enfermeiro |
22 (20,8) |
|
|
|
Local/Unidade trabalhava antes da UTI COVID (n=102) |
|
|
|
|
Enfermaria adulto |
35 (34,3) |
|
|
|
UTI adulto |
12 (11,8) |
|
|
|
UTI Neonatal/UCI |
4 (3,9) |
|
|
|
Emergência* |
16 (15,7) |
|
|
|
CC |
4 (3,9) |
|
|
|
Laboratório |
2 (2,0) |
|
|
|
Educação em Saúde |
1 (1,0) |
|
|
|
Hospital/Clínica/Posto de Saúde |
18 (17,6) |
|
|
|
Outros* |
10 (9,8) |
|
|
|
Contrato de trabalho |
|
|
|
|
PSS - Processo Seletivo Simplificado |
69 (65,1) |
|
|
|
Chamamento Público |
24 (22,6) |
|
|
|
Concurso Público |
13 (12,2) |
|
|
|
Tempo de formado (anos)/n=105 |
|
9,40±6,39 |
9 |
1 a 27 |
Tempo de serviço na instituição (anos)* |
|
2,5±4,4 |
0,7 |
0,1 a 19 |
Tempo de serviço na unidade COVID (meses) |
|
0,79±1,1 |
0,6 |
0,2 a 11 |
Experiência prévia em UTI |
|
|
|
|
Sim |
64 (60,4) |
|
|
|
Não |
42 (39,6) |
|
|
|
Experiência prévia com paciente COVID |
|
|
|
|
Sim |
60 (56,6) |
|
|
|
Não |
46 (43,4) |
|
|
|
Carga horária semanal no HU (n=100) |
|
38,93±7,84 |
36 |
12-80 |
≤30 |
2 (1,8) |
|
|
|
36 |
55 (51,9) |
|
|
|
40 |
30 (28,3) |
|
|
|
>40 |
12 (11,3) |
|
|
|
Mais de um vínculo empregatício (Sim) |
68 (64,2) |
|
|
|
Nível de Satisfação no trabalho |
|
7,75±2,24 |
8 |
1-10 |
Nível de Motivação no trabalho |
|
7,41±2,46 |
8 |
1-10 |
Fonte: Dados da pesquisa. D.P.= Desvio Padrão; UTI adulto=Unidade de terapia intensiva adulto; UTI Neonatal= Unidade de terapia intensiva neonatal; UCI=Unidade de cuidados intermediários; CC= centro cirúrgico; Emergência= pronto atendimento, pronto socorro, serviço de atendimento móvel às urgências, unidade de pronto atendimento; HU= Hospital Universitário; PSS= Processo Seletivo Simplificado; CH= Carga Horária; Outros= clínica de estética, academia, supermercado, desempregado. |
Avaliando-se os níveis de ansiedade, depressão e estresse entre os participantes, foi possível verificar que o estresse obteve a maior mediana (12,0), variando de zero a 40 quando comparados aos resultados de ansiedade (6,0; 0-40) e depressão (8,0; 0-36). Dentre os profissionais de enfermagem da unidade COVID-19, 52 (49,5%) deles apresentaram algum nível de ansiedade e/ou depressão; e 38 (35,8%) deles manifestaram algum nível de estresse. No Gráfico 1, estão apresentadas as frequências de ansiedade, depressão e estresse, de acordo com o nível de acometimento.
Gráfico 1 - Categorização dos níveis de ansiedade, depressão e estresse conforme avaliação do DASS-21. Cascavel, PR, Brasil, 2021
Já nas Tabelas 2 e 3, são apresentados os fatores associados ao estresse, ansiedade e depressão entre profissionais de enfermagem.
Tabela 2 - Comparação das variáveis qualitativas com a presença de ansiedade, depressão e estresse (DASS-21) dos participantes do estudo (n=106). Cascavel, PR, Brasil, 2021
Variáveis |
Ansiedade |
|
|
Depressão |
|
|
Estresse |
|
|
|
S |
N |
p* |
S |
N |
p* |
S |
N |
p* |
|
n (%) |
n (%) |
|
n (%) |
n (%) |
|
n (%) |
n (%) |
|
Profissão |
|
|
0,090 |
|
|
0,090 |
|
|
0,038 |
Auxiliar de Enfermagem |
2 (1,9) |
0 |
|
2 (1,9) |
0 |
|
2 (1,9) |
0 |
|
Técnico de enfermagem |
36 (34,0) |
46 (43,4) |
|
36 (34,0) |
46(43,4) |
|
25(23,6) |
57 (53,8) |
|
Enfermeiro |
14 (13,2) |
8 (7,5) |
|
14 (13,2) |
8 (7,5) |
|
11(10,4) |
11 (10,4) |
|
Contrato de trabalho |
|
|
0,048 |
|
|
0,138 |
|
|
0,101 |
PSS |
40 (37,7) |
29 (27,3) |
|
39 (36,8) |
30(28,3) |
|
29(27,3) |
40 (37,7) |
|
Chamamento público |
6 (5,7) |
18 (17,0) |
|
7 (6,6) |
17(16,0) |
|
4 (3,8) |
20 (18,9) |
|
Concurso público |
6 (5,7) |
7 (6,6) |
|
6 (5,7) |
7 (6,6) |
|
5 (4,7) |
8 (7,5) |
|
Em algum momento se sentiu sobrecarregado? (n=105) |
|
|
0,002 |
|
|
0,016 |
|
|
0,033 |
Sim |
51 (48,6) |
42 (40,0) |
|
50 (47,6) |
43(40,9) |
|
37(35,2) |
56 (53,3) |
|
Não |
1 (0,9) |
11 (10,5) |
|
2 (1,9) |
10 (9,5) |
|
1 (0,9) |
11 (10,5) |
|
Fonte: Dados da pesquisa.
S= Sim; N=Não; p= p-valor de acordo com teste qui-quadrado; UTI adulto=Unidade de terapia intensiva adulto; UTI Neonatal= Unidade de terapia intensiva neonatal; UCI=Unidade de cuidados intermediários; CC= centro cirúrgico; Emergência= pronto atendimento, pronto socorro, serviço de atendimento móvel às urgências, unidade de pronto atendimento; UBS= unidade básica de saúde; PSS= Processo Seletivo Simplificado; CH= Carga Horária; Outros*= clínica de estética, academia, supermercado, desempregado, unidade COVID em outras instituições.
Tabela 3 - Comparação de variáveis quantitativas com os níveis de ansiedade, depressão e estresse (DASS-21) dos participantes do estudo (n=106). Cascavel, PR, Brasil, 2021
Variáveis |
Ansiedade |
|
|
Depressão |
|
|
Estresse |
|
|
|
S |
N |
p* |
S |
N |
p* |
S |
N |
p* |
|
Média±D.P. |
Média±D.P. |
|
Média±D.P. |
Média±D.P. |
|
Média±D.P. |
Média±D.P. |
|
Idade |
36,3±8,8 |
37,1±7,7 |
0,229 |
36,2±8,9 |
37,2±7,6 |
0,150 |
36,4±9,4 |
36,9±7,5 |
0,05 |
Tempo de serviço na profissão (em anos) |
7,8±5,6 |
10,9±6,8 |
0,014 |
7,8±5,3 |
11,0±7,02 |
0,011 |
7,6±6,0 |
10,4±6,4 |
0,031 |
|
Mediana (Intervalo) |
Mediana (Intervalo) |
p** |
Mediana (Intervalo) |
Mediana (Intervalo) |
p** |
Mediana (Intervalo) |
Mediana (Intervalo) |
p** |
CH semanal (em horas) |
36 (36-40) |
36 (36-48) |
0,445 |
36 (36-40) |
36 (36-48) |
0,049 |
39 (36-40) |
36 (36-48) |
0,125 |
Satisfação no trabalho |
7,0 (1-10) |
9,0 (2-10) |
<0,001 |
7 (1-10) |
8 (2-10) |
<0,001 |
7,0 (1-10) |
9,0 (2-10) |
<0,001 |
Motivação no trabalho |
7,0 (1-10) |
9,0 (3-10) |
7 (1-10) |
9 (3-10) |
<0,001 |
6,0 (1-10) |
9,0 (3-10) |
<0,001 |
Fonte: Dados da pesquisa.
S= Sim; N=Não; p*= p-valor de acordo com teste t Student; p**= p-valor de acordo com teste Mann-Whitney; D.P.= Desvio Padrão; CH= Carga Horária; HU=Hospital Universitário; UTI= Unidade de Terapia Intensiva
DISCUSSÃO
Estudos apontam que a pandemia teve impacto negativo sobre a qualidade assistencial de enfermagem, sendo que dentre os fatores relacionados citam-se escassez de recursos humanos qualificados, falta de materiais, sobrecarga de atividade e o sofrimento psicoemocional dos profissionais de enfermagem, além de risco para a segurança do paciente(13-14). Em pesquisa com 32 profissionais de enfermagem sobre a satisfação e motivação no trabalho, ficou evidente que esses fatores se relacionam com o bem-estar físico e mental, além de refletir no desempenho das atividades laborais(15).
Neste contexto, destaca-se que os resultados deste estudo indicaram maior escore para a subescala estresse (mediana 12,0), seguida pela depressão (mediana 8,0) e por último, ansiedade (mediana 6,0). Os dados apresentam semelhanças aos resultados de um estudo realizado no início da pandemia(16), realizado no mesmo hospital, denotando que, mesmo após um ano de enfrentamento à COVID-19, os profissionais ainda apresentam considerável grau dos transtornos mentais comuns avaliados.
Em outra investigação, também desenvolvida no início da pandemia pela COVID-19, verificou-se que dentre os 3.249 profissionais de enfermagem avaliados 64,4% não apresentavam nenhum sinal ou foram identificados com sintomas mínimos de depressão(17). Nesse diapasão, pesquisadores da região Nordeste avaliaram 490 profissionais de enfermagem durante o início da pandemia e verificaram que 39,6% apresentavam sintomas de ansiedade moderadamente severa ou severa, já para depressão 38% deles apresentavam sintomas moderadamente severo ou severo(18).
Mesmo após um ano de combate à COVID-19 e, com base nos dados do presente estudo, considera-se preocupante o número de profissionais de enfermagem que apresentaram níveis grave ou muito grave nas subescalas ansiedade, depressão e estresse da DASS-21. Sabendo disso, inferem que haja a necessidade de acompanhamento criterioso, contínuo e a longo prazo aos profissionais da linha de frente.
O sentimento de sobrecarga de trabalho apresentou-se relacionado aos níveis de ansiedade (p=0,002), depressão (p=0,016) e estresse (p=0,033), podendo estar relacionada às drásticas mudanças nas condições de trabalho, gerando fatores estressores. Com advento da pandemia diversas situações já consideradas críticas anteriormente foram agravadas, podendo citar a piora nas condições de trabalho, cansaço, fadiga, desgaste, aumento das atividades laborais, acréscimo de cobranças e pressões dos gestores(19).
Na comparação dos dados sociodemográficos e laboral com a escala DASS-21 dos profissionais da UTI COVID-19 (Tabela3), as variáveis consideradas com maior significância, foram idade propensa ao estresse (p=0,05), tempo de serviço com tendência à depressão (p=0,009) e ao estresse (p-0,031). Corroborando aos resultados, pesquisa semelhante, realizada no mesmo serviço, no início da pandemia, quando a equipe de trabalho e os leitos disponíveis eram menores, considerou a idade (p=0,002) e tempo de serviço (p<0,001)(16) como fatores predisponentes à depressão.
Apesar do número de auxiliares de enfermagem tem sido pequeno na amostra estudada (n=2), foi possível observar resultado com significância estatística na categoria profissional, no que tange ao nível de estresse (p=0,038), ou seja, foi identificado uma maior disposição ao estresse entre os profissionais, talvez pelo tipo de formação que o curso lhes oferece, esperando que eles não atendam a casos mais graves, como os de uma unidade especializada em cuidados intensivos, como é o caso das unidades COVID-19.
O tipo de contrato de trabalho dos participantes, também indicou significância estatística para desenvolvimento de ansiedade, o que pode ser explicado pelo fato de que 65,1% deles relatam ter vínculo empregatício por meio de PSS, com prazo determinado para um ano de contrato, o qual pode gerar insegurança e medo pelo desemprego, que podem ser geradores de ansiedade. Em estudo reflexivo sobre as repercussões da pandemia da COVID-19 na saúde mental dos trabalhadores de enfermagem, foi revelado que as condições de trabalho, geram risco para o sofrimento psíquico e adoecimento físico e mental(1).
Os resultados do presente estudo demonstram a necessidade medidas de preventivas, promoção da saúde e bem-estar no ambiente laboral dos profissionais de enfermagem, com implantação de redes de escuta e apoio emocional, bem como o acompanhamento daqueles que já se encontram adoecidos com algum transtorno mental. Diante das demandas emergentes de saúde mental o Ministério da Saúde (MS) em parceria com a Fundação Osvaldo Cruz (FIOCRUZ), elaborou uma cartilha com recomendações para cuidado psíquico, além de estratégias que envolvem: local de descanso calmo e relaxante, meditação, exercícios de respiração e suporte profissional, quando tais estratégias já não contribuírem para melhora do estado emocional(20).
O presente estudo apresenta limitações no que tange a coleta de dados por meio eletrônico, o acesso presencial às essas unidades ser limitado, frente ao potencial risco de contaminação. Devido ao risco de contágio, optou-se pela coleta eletrônica dos dados, sendo este o caminho necessário para o momento. Outrossim, a identificação de poucos estudos publicados, especificamente sobre a temática ora apresentada também se apresentou como um fator que limitante no que diz respeito às análises comparativas.
CONCLUSÕES
Este estudo constatou que fatores referentes à categoria profissional, idade, tipo de regime trabalhista, tempo de serviço na profissão, sobrecarga de trabalho, satisfação e motivação no trabalho estão associados à ansiedade, estresse e depressão, entre profissionais de enfermagem que atuam no enfrentamento da COVID-19, um ano após o início da pandemia.
REFERÊNCIAS
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Fomento e Agradecimento: A pesquisa não recebeu financiamento.
Contribuições dos autores
Todos os autores contribuíram substancialmente para a concepção e planejamento; coleta, análise e interpretação dos dados; elaboração do rascunho ou na revisão crítica do conteúdo; e participaram da aprovação da versão final do manuscrito.
Rev Enferm Atual In Derme 2024;99(4): e024412