ARTIGO ORIGINAL

 

PERFIL DA ASSISTÊNCIA AOS USUÁRIOS DE IMPLANTE COCLEAR NA REABILITAÇÃO AUDITIVA EM UM HOSPITAL UNIVERSITÁRIO NA REGIÃO NORTE DO BRASIL

 

PROFILE OF ASSISTANCE TO COCHLEAR IMPLANT USERS IN AUDITORY REHABILITATION AT A UNIVERSITY HOSPITAL IN THE NORTHERN REGION OF BRAZIL

 

PERFIL DE LA ASISTENCIA A USUARIOS DE IMPLANTE COCLEAR EN LA REHABILITACIÓN AUDITIVA EN UN HOSPITAL UNIVERSITARIO EN LA REGIÓN NORTE DE BRASIL

 

https://doi.org/10.31011/reaid-2024-v.99-n.4-art.2392

 

Kath Elizandra Bastos Silva1

Isabelle Christine Vieira da Silva Martins2

Christine Elizabeth Lobato Bemerguy3

Ana Lúcia Brito de Souza4

Bruna Claudia Meireles Khayat5

Gilmar Wanzeller Siqueira6

Denise da Silva Pinto7

 

1 Hospital Universitário Bettina Ferro de Souza, Belém/PA. ORCID: https://orcid.org/0000-0001-7403-8114

2 Universidade do Estado de Minas Gerais, Passos, MG; Brasil. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-6718-9202

3 Hospital Universitário Bettina Ferro de Souza, Belém/PA. ORCID: https://orcid.org/0000-0003-4170-6440

4Hospital Universitário Bettina Ferro de Souza, Belém/PA. ORCID: https://orcid.org/00090-0007-2104-7341

5Universidade Federal do Pará, Belém, PA, Brasil. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-3962-1483

6Universidade Federal do Pará, Belém, PA, Brasil. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-2042-9440

7Universidade Federal do Pará, Belém, PA, Brasil. ORCID: https://orcid.org/0000-0003-4940-8114

 

Autor correspondente

Kath Elizandra Bastos Silva

Rua Augusto Corrêa, 01 - Guamá, Belém - PA, Brasil. 66075-110. Telefone: +55 (91) 99186-0519. E-mail: bastoskath@gmail.com

 

Submissão: 27-09-2024

Aprovado: 29-10-2024

 

RESUMO

Introdução: O implante coclear possibilita melhorar os níveis de audição, aproximando-os dos de um ouvinte normal. No entanto, é fundamental o acompanhamento pós-implante para garantir o sucesso do tratamento. Objetivo: Investigar o perfil dos usuários de implante coclear em um Hospital Referência na região Norte, Brasil. Métodos: Trata-se de um estudo quantitativo, observacional e retrospectivo com informações dos implantes cocleares realizados entre janeiro de 2011 e dezembro 2021. Os dados foram armazenados em um banco nas planilhas do Microsoft Excel 2007®, e posteriormente interpretados e apresentados em forma de tabelas e gráficos. Resultados: Identificou-se que no período de 2011 a 2021, o maior número de procedimentos ocorreu no ano de 2015 (n=24), sendo a maior parte dos IC realizadas em adultos de meia-idade (n=46,9 anos; 14,9%) do sexo masculino (n=44; 50,5%), com 9 anos de estudo (n=13;14,9%), provenientes de Belém (39%). No primeiro ano após a realização do procedimento de implante coclear os usuários realizaram até 4 consultas com a equipe multiprofissional com uma frequência de 83,5%, sendo no segundo ano menos que 3 consultas (94,2%), no terceiro ano com menos de 2 consultas (90,4%) e a partir do quarto ano, 69,1% não realizaram consultas. Conclusão: A maioria dos implantados do programa é composta por adultos de meia-idade, do sexo masculino, com baixa escolaridade, que realizaram mais consultas com a equipe multidisciplinar no primeiro ano após o procedimento.

Palavras-Chave: Implante de Prótese Coclear, Sistema Único de Saúde, Assistência Ambulatorial.

 

ABSTRACT

Introduction: The cochlear implant improves hearing levels, bringing them closer to those of a normal listener. However, it is essential to have post-implant follow-up to ensure the success of the treatment. Objective: To investigate the profile of cochlear implant users in a Reference Hospital in the North region of Brazil. Method: This is a quantitative, observational and retrospective study with data from cochlear implants performed between January 2011 and December 2021. The data were stored in a database in Microsoft Excel 2007® spreadsheets, and later interpreted and presented in the form of a tables and graphs. Results: It was identified that in the period from 2011 to 2021, the largest number of procedures occurred in 2015 (n=24), with the majority of CIs being performed on middle-aged adults (n=46.9 years; 14 .9%) male (n=44; 50.5%), with 9 years of education (n=13; 14.9%), from Belém (39%). In the first year after undergoing the cochlear implant procedure, users had up to 4 consultations with the multidisciplinary team with a frequency of 83.5%, with less than 3 consultations in the second year (94.2%), in the third year with less of 2 consultations (90.4%) and from the fourth year onwards, 69.1% did not have consultations. Conclusion: The majority of the program's implant recipients are middle-aged adults, male, with low educational attainment, who attended more consultations with the multidisciplinary team in the first year after the procedure.

Key words: Cochlear Implantation, Unified Health System, Ambulatory Care.

 

RESUMEN

Introducción: El implante coclear permite mejorar los niveles de audición, acercándolos a los de un oyente normal. Sin embargo, es fundamental seguimiento post-implante para garantizar el éxito del tratamiento. Objetivo: Investigar el perfil de los usuarios de implante coclear en un Hospital de Referencia de la región Norte de Brasil. Métodos: Se trata de un estudio cuantitativo, observacional y retrospectivo con datos de implantes cocleares realizados entre enero de 2011 y diciembre de 2021. Los datos fueron almacenados en una base de datos en hojas de cálculo Microsoft Excel 2007®, para posteriormente interpretarse y presentarse en forma de tablas y gráficos. Resultados: Se identificó que en el período de 2011 a 2021, el mayor número de procedimientos ocurrió en el año 2015 (n=24), realizándose la mayoría de IC en adultos de mediana edad (n=46,9 años; 14,9%) masculino (n=44; 50,5%), con 9 años de escolaridad (n=13; 14,9%), de Belém (39%). En el primer año después de someterse al procedimiento de implante coclear, los usuarios realizaron hasta 4 consultas con el equipo multidisciplinario con una frecuencia del 83,5%, con menos de 3 consultas en el segundo año (94,2%), en el tercer año con menos de 2 consultas (90,4%) y a partir del cuarto año el 69,1% no tuvo consultas. Conclusión: La mayoría de los implantados del programa está compuesta por adultos de mediana edad, de sexo masculino, con baja escolaridad, que realizaron más consultas con el equipo multidisciplinario en el primer año después del procedimiento.

Palabras clave: Implantación Coclear, Sistema Único de Salud, Atención Ambulatoria.

 

INTRODUÇÃO

Segundo o Relatório Mundial sobre Audição, estima-se que, até 2050, cerca de 2,5 bilhões de pessoas, ou um quarto da população global, apresentarão algum grau de perda auditiva. Contudo, na ausência de medidas de prevenção e tratamento, haverá uma demanda estimada de pelo menos 700 milhões de pessoas que precisarão de acesso a cuidados auditivos e outros serviços de reabilitação (1).

De acordo com os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) (2), na região Norte há cerca de 737.313 deficientes auditivos, sendo 146.296 com perda severa da audição. No estado do Pará, os dados revelam a existência de 71.350 surdos com perda severa e outros 297.723 habitantes com alguma dificuldade auditiva, totalizando 369.073 deficientes auditivos.

Contudo, existe a possibilidade de tratamento para a perda auditiva severa a profunda, ou para aqueles que não conseguem boa percepção auditiva com o uso de próteses auditivas convencionais, por meio de tecnologias auditivas, como o implante coclear (IC). O IC consiste em um dispositivo eletrônico implantado cirurgicamente, que capta os sons do ambiente por meio de um processador externo e os transforma em pulsos elétricos. Esses pulsos são transportados através de um eletrodo até o nervo auditivo. Ele não é ativado imediatamente após a cirurgia; requer um período de prática para que o cérebro possa compreender esse novo tipo de som, chamado de reabilitação auditiva (3).  O IC pode melhorar os níveis de audição para valores próximos aos de um ouvinte normal, o que contribui para o aumento da confiança em situações sociais (4).

Estima-se que, no mundo, cerca de 500 mil pessoas tenham recebido um IC até 2016, com a perspectiva de atingir um milhão até 2020 (5). No Brasil, foram realizados aproximadamente 8.400 IC’s. Embora haja crescimento, esse número ainda representa menos de 5% do total de pacientes que poderiam ser usuários dessa tecnologia (6). O IC é um procedimento custeado pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e, desde 1999, é considerado de alta complexidade e especificidade, demandando a existência de serviços altamente especializados, equipes multiprofissionais, além de instalações e equipamentos diferenciados (7).

Atualmente, o IC é regulamentado pela Portaria nº 2.776, de 18 de dezembro de 2014 (8), que estabelece as diretrizes para o credenciamento e habilitação dos estabelecimentos de saúde que prestam Atenção Especializada às Pessoas com Deficiência Auditiva, além dos critérios de indicação e contraindicação para o IC no SUS. O acesso ao serviço é garantido pela Política Nacional de Regulação, instituída pela Portaria GM/MS nº 1559/2008 (9), que é efetivada por meio de várias normativas, incluindo a Regulação do Acesso à Assistência, visando atender adequadamente as necessidades dos cidadãos através de consultas, leitos e outros serviços que se façam necessários.

Independentemente do momento de instalação da deficiência auditiva, para obter êxito no tratamento com IC, é necessário um treinamento auditivo formal e o engajamento em atividades orientadas fora do ambiente terapêutico. Além disso, para qualquer paciente, o abandono do treinamento auditivo, tanto no ambiente terapêutico quanto no familiar ou social, resulta na regressão dos resultados obtidos (10). É fundamental que exista um programa de IC habilitado, com acompanhamento de uma equipe multiprofissional (médico, psicólogo, assistente social e fonoaudiólogo) no pós-operatório, para que haja orientações adequadas, mapeamento apropriado e treinamento das habilidades auditivas, por meio de terapias fonoaudiológicas, propiciando uma boa aquisição da linguagem e, consequentemente, um bom convívio social e familiar, a fim de alcançar os benefícios oferecidos por essa tecnologia (11).

Diante do exposto, este estudo teve como objetivo investigar a assistência prestada aos usuários de implante coclear no período de janeiro de 2011 a dezembro de 2021 em um hospital universitário referência na região Norte do Brasil.

 

MÉTODOS

Trata-se de um estudo quantitativo, observacional e retrospectivo, realizado por meio da análise de dados coletados de prontuários de pacientes com IC atendidos no Centro de Referência em IC, no período de janeiro de 2011 a dezembro de 2021, além das informações dos bancos de dados do programa do Setor de Regulação e da Unidade de Monitoramento.

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Pará, sob o número CAAE: 61418922.9.0000.0017, com o parecer número 5.851.449. Para o estudo, foram considerados os dados de usuários de ambos os sexos com idade superior a 18 anos que foram avaliados no referido programa. Os prontuários de pacientes com idade inferior a 18 anos foram excluídos. Do total de 90 prontuários, 3 não foram encontrados, resultando em 87 prontuários para análise. A estatística descritiva utilizada foi média, desvio-padrão e frequência absoluta (frequência relativa).

Para descrever a assistência, foram considerados os procedimentos assistenciais, como as cirurgias de IC (quantitativo por ano), o número de consultas de retorno pós-IC com a equipe multiprofissional e a frequência do acompanhamento em adultos: no primeiro ano de uso, 4 (quatro) acompanhamentos; no segundo ano de uso, 3 (três) acompanhamentos; no terceiro ano de uso, 2 (dois) acompanhamentos; a partir do quarto ano, o acompanhamento é anual. Também foi considerado o número de sessões fonoaudiológicas para adultos, que ocorrem em séries de 6 (seis) sessões.

Segundo dados do Setor de Regulação e Avaliação em Saúde, da Unidade de Monitoramento Ambulatorial e do Banco de Dados do Programa de Implante, foram realizadas 171 cirurgias em crianças, adolescentes, adultos e idosos, com uma média de duas cirurgias por mês, no período de janeiro de 2011 a dezembro de 2021. Foram selecionados 90 prontuários físicos e/ou eletrônicos de pacientes adultos e idosos que realizaram o procedimento cirúrgico.

 

RESULTADOS

Quanto ao perfil dos pacientes atendidos, a média de idade foi de 46,9 anos, sendo 50,5% do gênero masculino e 49,4% do gênero feminino. A maioria se autodeclarou raça/cor parda (85%) e com o primeiro grau completo (14,9%) (Tabela 1).

 

Tabela 1 - Perfil dos pacientes adultos e idosos que realizaram o implante coclear no período entre 2011 e 2021 em um hospital de referência na região Norte, Brasil, Pará.

 

 

n (%)

Idade (média ± DP)

46,9 ± 14,9

Sexo

 

Masculino

44 (50,5)

Feminino

43 (49,4)

Total

87 (99,9)

Cor autodeclarada

 

Parda

74 (85)

Preta

5 (5,7)

Branca

3 (3,4)

Não declarada

5 (5,7)

Total

87 (99,8)

Escolaridade

 

grau completo

13 (14,9)

grau incompleto

8 (9,1)

grau completo

12 (13,7)

grau incompleto

5 (5,7)

Ensino superior

5 (5,7)

Sem informação

44 (50,5)

Total

 

 

             Na figura 1, observa-se que a maioria dos pacientes que realizaram o IC residem no município de Belém, sendo 39% e em municípios próximos da capital Ananindeua (9%) e Paragominas (4%).

 

Figura 1 - Frequência absoluta da procedência dos pacientes que realizaram o implante coclear no período entre 2011 e 2021, em um hospital de referência na região Norte, Brasil, Pará.

 

A maior frequência de realização das cirurgias de IC foi de vinte e quatro (n=24) procedimentos no ano 2015, sendo o menor registro realizado em 2014 com dois (n=2) procedimentos, como observado a figura 2.

 

Figura 2 - Frequência absoluta de cirurgias de implante coclear realizadas no período entre 2011 e 2021, em um hospital de referência na região Norte, Brasil, Pará.

 

De acordo com a figura 3, foram identificados no primeiro ano após a realização do procedimento de IC os usuários realizaram até 4 consultas com a equipe multiprofissional com uma frequência de 83,5%, sendo no segundo ano menos que 3 consultas com um percentual de 94,2%, no terceiro ano com menos de 2 consultas (90,4%) e a partir do 4 ano (69,1 %) não realizaram consultas.

 

Figura 3 - Frequência dos atendimentos com equipe multiprofissional após o implante coclear realizados entre 2011 e 2021, em um hospital de referência na região Norte, Brasil, Pará.

 

Barra com pontos círculos representa a frequência de pacientes que realizaram até quatro consultas com a equipe multiprofissional. Barra preta representa menos que quatro consultas. Barra com linhas representa menos que três consultas. Barra cinza escura representa maior ou igual a três consultas. Barra com quadrados representa menos duas consultas realizadas. Barra cinza clara é maior ou igual a duas consultas. Barra com linhas diagonais representa as que não realizaram consultas. Barra branca representa as que realizaram uma consulta.

 

DISCUSSÃO

O presente estudo identificou o perfil dos pacientes que realizaram IC no programa entre 2011 e 2021. A maioria dos pacientes é proveniente do município de Belém, composta por homens adultos, de cor parda e com até nove anos de escolaridade. O maior número de IC’s ocorreu em 2015, e a maior frequência de consultas com a equipe multidisciplinar pós-procedimento aconteceu no primeiro ano.

Os achados do estudo demonstram que, em relação ao sexo, houve uma distribuição semelhante entre os grupos, semelhante à encontrada por Barbosa et al. (12) e Pedrett e Moreira  (13). A média de idade foi de 46,9 anos, resultado que está em consonância com os achados das pesquisas realizadas por Simões (14), que identificou 39% que realizaram o IC em indivíduos acima de 18 anos.

A maioria dos participantes se autodeclarou parda, e esse dado pode estar relacionado ao fato de a população paraense se identificar predominantemente como parda, segundo fontes do IBGE (2).

Neste estudo, observou-se que não está havendo, pelo serviço, o registro das informações de escolaridade, pois 50,5% dos prontuários não continham dados sobre o grau de instrução dos usuários. Entre os registros disponíveis, a maior parcela frequentou o ensino fundamental completo. A escolaridade tem sido utilizada como um indicador para a avaliação da situação socioeconômica, sendo um elemento importante para a formulação de estratégias e ações que permitam a qualificação do serviço, aumentando assim a chance de sucesso no tratamento do paciente. Conforme Brasil et al. (15), percentuais baixos em relação a dados de reconhecimento do paciente, como naturalidade, procedência, raça, sexo e escolaridade, podem comprometer a integralidade da assistência devido à falta de identificação do indivíduo em seu contexto socioeconômico e cultural.

Este estudo demonstrou que a grande maioria dos pacientes que realizaram o IC é proveniente do município de Belém. Esse fato pode ser atribuído a diversos fatores, como a localização do serviço de referência na capital, a ausência de pactuações com outros estados e municípios do Norte, ou uma maior pactuação com o município de Belém. Além disso, as características geográficas da região Norte podem dificultar o deslocamento de usuários de outras localidades para este serviço. Portanto, é necessário realizar uma avaliação mais detalhada do processo de pactuação dos municípios com o IC.

De acordo com Moreira e Tamaki (16), a Programação Pactuada e Integrada é uma ferramenta de gestão coordenada pelos gestores locais e estaduais, de suma importância para garantir o acesso da população aos serviços de média e alta complexidade que não estão disponíveis em seus municípios de residência. Segundo a Portaria nº 4.279, de 30 de dezembro de 2010 (17), os serviços de saúde devem possuir uma rede integrada para construir melhor os vínculos entre as equipes e os níveis de gestão, o que assegura uma atenção à saúde efetiva e eficaz para a população. Para Arruda (18), residir em localidades distantes gera uma série de custos aos indivíduos, além de dificultar o acesso aos serviços públicos.

Do total de cirurgias de IC realizadas, a maioria ocorreu no ano de 2015, atingindo a meta preconizada pela portaria. No entanto, no ano anterior, foram registrados apenas dois procedimentos. Tal achado sugere algumas suposições, conforme observado na análise: falta de equipamentos, equipamentos danificados e recursos humanos insuficientes. Isso demonstra que o serviço não manteve um fluxo contínuo de procedimentos ofertados, o que pode comprometer a resolutividade do problema do paciente que necessita de IC. De acordo com Bevilacqua et al. (19), a qualidade dos serviços de saúde auditiva está pautada na infraestrutura (instalações físicas, número de profissionais e equipamentos) e no quantitativo de produtividade de procedimentos. Segundo Silva et al. (20), a Política Nacional de Atenção à Saúde Auditiva (PNASA) trouxe avanços para a saúde auditiva, pois estabeleceu que todos os estabelecimentos de saúde devem fornecer condições técnicas, estrutura física, equipamentos e recursos humanos adequados, além de apoio diagnóstico e terapêutico especializados para o ambiente hospitalar e ambulatorial.

A respeito do seguimento assistencial pós-procedimento de IC, verificou-se que não houve um acompanhamento regular dos pacientes pela equipe multiprofissional, o que pode comprometer a eficácia do procedimento, que requer avaliação periódica. De acordo com os parâmetros estabelecidos na Portaria GM/MS nº 2.776/2014 (8), o acompanhamento de IC deve ser realizado da seguinte forma: no primeiro ano, devem ser feitos 4 acompanhamentos; no segundo ano, 3; no terceiro ano, 2; e, a partir do quarto ano, pelo menos uma vez ao ano. Nossos dados corroboram com Aguiar et al. (21), que relatam um perfil de ações sem articulação e não contínuo de assistência às pessoas com deficiência no âmbito público.

Um dos principais objetivos do acompanhamento de usuários portadores de prótese auditiva é a reabilitação. A ausência de avaliações periódicas, conforme estabelecido nas diretrizes terapêuticas, pode acarretar prejuízos ao sucesso do tratamento, como má adaptação do aparelho, dificuldades nas habilidades de linguagem, no convívio social e familiar, além da falta de reavaliações de possíveis complicações que possam ocorrer. De acordo com Costa (22), o acompanhamento periódico após a implantação do dispositivo é fundamental para a avaliação, validação do uso efetivo da amplificação sonora e monitoramento da perda auditiva, contribuindo, consequentemente, para a melhoria da qualidade de vida e socialização do indivíduo. Segundo Aguiar et al. (21), é essencial garantir uma rede de assistência à saúde alinhada ao princípio da integralidade. Isso implica que as ações e serviços devem ser interconectados, com um financiamento apropriado e o compromisso de profissionais e gestores em atender às singularidades das pessoas com deficiência.

 

CONCLUSÕES

Observou-se neste estudo que, entre 2011 e 2021, a maioria dos pacientes que realizaram o IC era proveniente do município de Belém, consistindo em homens adultos de meia-idade, de cor parda e com até nove anos de escolaridade. Em relação à realização do procedimento, o maior número de cirurgias ocorreu no ano de 2015, e a maior frequência de consultas com a equipe multidisciplinar foi registrada no primeiro ano pós-procedimento. Nossos achados podem contribuir para o fomento de políticas públicas voltadas para uma maior adesão ao IC, especialmente no pós-procedimento, considerando a importância e a repercussão positiva do acompanhamento efetivo.

 

REFERÊNCIAS

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 Fomento e Agradecimento: A pesquisa não recebeu financiamento.

Critérios de autoria (contribuições dos autores)

Kath Elizandra Bastos Silva

Escrita, revisão e submissão do projeto ao comitê de ética em pesquisa, via plataforma Brasil. Planejamento da pesquisa e na coleta de dados a campo; Redação e revisão do texto final do artigo.

Isabelle Christine Vieira da Silva Martins

Organização dos dados; Análise dos estudos e criação de tabelas e figuras; Revisão crítica do texto.

Christine Elizabeth Lobato Bemerguy

Revisão do texto e ajustes metodológicos; Revisão crítica do texto; Correção gramatical.

Ana Lúcia Brito de Souza

Revisão do texto e ajustes metodológicos; Revisão crítica do texto; Correção gramatical.

Bruna Claudia Meireles Khayat

Revisão do projeto de pesquisa; Revisão do texto e adição de partes significativas; Revisão crítica.

Gilmar Wanzeller Siqueira

Revisão do texto e ajustes metodológicos; Revisão crítica do texto; Correção gramatical.

Denise da Silva Pinto

Planejamento da pesquisa e na coleta de dados a campo; Redação e revisão do texto final do artigo. Revisão do texto e ajustes metodológicos; Revisão crítica do texto; Correção gramatical.

Declaração de conflito de interesses

“Nada a declarar”.

Editor Científico: Francisco Mayron Morais Soares. Orcid: https://orcid.org/0000-0001-7316-2519

Rev Enferm Atual In Derme 2024;99(4): e024411                   

 Atribuição CCBY